Capítulo 4 - O Treinamento (Animus)

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"- Vamos logo, Teçá! Não vai querer se atrasar de novo. - ouço alguém atrás de mim dizer"

Acordo sonolento e rolo para fora de minha rede, caindo de joelhos na grama úmida.

Olho pra cima para ver quem foi que me acordou, não me surpreendendo quando vejo ninguém menos do que Ubirajara, meu melhor amigo, me fitando com um olhar de reprovação.

- Aaaah... - reclamo - Mas já está na hora?

- É por isso que você sempre chega atrasado! Você fica o dia todo dormindo e nem percebe que perdeu hora!

- E o que tem isso? Dormir faz bem. - Me defendo, embora eu saiba que ele está certo. De fato, ultimamente tenho dormido demais, e consequentemente, faltado em várias atividades da tribo. - De qualquer forma, o que temos agora?

-  Armas. De qualquer maneira, vamos logo, ao menos que você queira ver Raoni bravo. - ele diz e sai correndo em disparada na direção da floresta, que é onde temos treinos diários de manejamento de armas, para nos defendermos dos homens brancos que querem nos escravizar. Começo a correr também, pois definitivamente não quero ver Raoni (o guerreiro e professor de armas) bravo.

Chegamos em cima da hora, provavelmente alguns minutos atrasados, pois os outros já estavam pegando seus arcos e aljavas.

Nos apressamos para fazer o mesmo.

Após todos estarem com o arco em punho, e a aljava nas costas, Raoni dá as instruções: devemos nos separar e atirar dezoito flechas em alvos vermelhos, que estão distribuídos aleatoriamente por toda a floresta.

Depois, devemos voltar para o ponto de partida para pegar um machado, e voltar pra floresta novamente e atirar o machado nos alvos azuis.

Como se isso não bastasse, armadilhas super bem escondidas estão espalhadas pela floresta toda, afim de nos atrapalhar. Além disso, os alvos azuis também estão cercados por armadilhas. Assim sendo, teremos que ser criativos e habilidosos para obter o machado de volta.

Todos nós só teremos uma chance, ou seja, se cairmos em alguma armadilha, teremos que voltar para o ponto de partida e esperar pelos outros.

O que completar a missão primeiro, ganha.

Assim que Raoni nos dá permissão para começar, todos saem correndo o mais rápido que podem. Sei que isso é burrice, aprendi isso da pior maneira possível: correr vai diminuir a atenção de onde se pisa, se pisar um centímetro sem o devido cuidado, a chance de cair em alguma armadilha é grande. Ciente disso, vou andando até o começo da floresta. Chegando lá, olho em volta: só vejo árvores e mais árvores. É muito provável que tenha armadilhas logo no começo, mas mesmo assim não enxergo nada que possa denunciar a localização delas, e muito menos da localização de algum alvo vermelho. Vou andando com cautela até ficar relativamente longe de onde meus colegas passaram. Fecho meus olhos e me concentro. Me concentro em tudo: desde os pequenos ruídos da floresta, até o solo úmido. Quando os abro, posso ver, ouvir e sentir tudo com mais nitidez. Olho para o chão a minha volta. Consigo enxergar pegadas mais para frente. Sigo-as. Tenho quase certeza de que elas são de Raoni, e que me levarão até um alvo ou armadilha. Não demora muito e encontro meu primeiro alvo vermelho! Isso significa que as pegadas são mesmo de Raoni! Agora o trabalho vai ficar mais fácil.

Tiro uma flecha de minha aljava e a posiciono em meu arco. Puxo a corda e atiro. A flecha acertou bem no meio do alvo. Isso foi fácil. Embora eu durma muito, eu tenho uma certa facilidade em manejar armas... Nunca entendi o porque. Eu me sinto seguro com elas, e é isso o que importa.

Olho ao meu redor em busca da continuação das pegadas, o que não foi difícil ver. Continuei a segui-las, achando rapidamente os alvos. Acertei todos sem a menor dificuldade. Quando as flechas acabaram, comecei meu caminho de volta. Mais ou menos na metade do caminho, encontro meu amigo Ubirajara pendurado de ponta cabeça em uma das armadilhas.

- Teçá! - Diz ele surpreso - Não caiu em nenhuma armadilha ainda? Bom, já que você está aqui, poderia me ajudar a descer?

- Hahahaha. Já caiu em uma? Claro amigo. - Pego uma flecha que havia caído de sua aljava e olho para cima a procura da árvore em que a armadilha foi posta. Quando acho, vou com cautela até ela e subo. Chego até a corda e a corto com a ponta da flecha. Escuto Ubirajara cair com um baque surdo no chão.

- Ei! Podia ter me avisado quando você iria cortar! - Grita ele.

- Não há de quê. - Retruco enquanto desço da árvore.

- Eu nunca entendi como você funciona. Você é um preguiçoso que tem mais faltas do que tudo, e ainda assim é o melhor da turma!

- Eu não s... - Começo a protestar, mas me dou conta de que é verdade, ganho de todos nas lutas, e sempre acerto onde quase todos falharam. - É.. Talvez Tupã me queira como guerreiro...

- Provavelmente. Bom, obrigado por me ajudar, e boa sorte. - Ele diz e vai embora.

Espero até ele sumir de vista, e volto a andar para buscar meu machado. Não demoro mais que cinco minutos pra finalmente chegar na clareira, onde as pessoas que já perderam aguardam o jogo acabar. Olho para elas: havia umas 20.... Isso significa que resta apenas mais ou menos um terço em algum lugar da floresta. O jogo já estava no fim. Escolho um machado e volto para a floresta. Faço a mesma coisa de antes: fecho os olhos e me concentro, sigo as pegadas de Raoni, e acho um alvo azul. Fico em uma distância de mais ou menos 10 metros, e arremesso o machado. Ele acerta um pouco mais à direita do que eu esperava, mas mesmo assim (se fosse um homem branco) o machado caiu em um ponto vital. Começo a andar para buscar meu machado, até que me lembro do que Raoni falou:

"- Fiquem atentos! Armadilhas estão cercando os alvos azuis, vocês terão que ser criativos pra pegar o machado de volta sem ativar nenhuma".

Olho a minha volta procurando algo que possa me ajudar, mas não vejo nada além de árvores. Me concentro novamente. Agora que tudo estava mais nítido, pude ver que todas as árvores que me cercavam tinham cipós! Olhei para a árvore em que o alvo estava apoiado, na esperança de que haveria cipós grandes o bastante para que eu pudesse agarrá-los se eu pulasse alto. É claro que não tem. Todos os cipós que tinham estavam cortados do alvo para cima. "Muito alto para pular." Ah! Mas é claro! Entendi o que Raoni queria: Era um teste de habilidade, teríamos "que dar uma de Tarzan" e pular de cipó em cipó até chegar na árvore do alvo. "Inteligente". Escalo uma árvore e me seguro em um cipó. Começo a balançar até que minha velocidade esteja boa o bastante para pular para o próximo. Solto do cipó em que estava balançando e torço para que tenha calculado certo. E não é que deu mesmo? Seguro o outro cipó com força, e faço o mesmo. Ótimo, agora o próximo seria o que definiria a minha vitória. Respiro fundo e solto as minhas mãos. Consigo agarrar, mas esqueci de colocar minhas pernas no tronco da árvore para parar de balançar, e impedir que eu bata de de cara no tronco. E é exatamente isso que acontece. Minha visão fica turva e fico sem ar. Quase solto o cipó, mas minha vontade de vencer é maior do que minha dor. Solto uma mão do cipó e pego o machado. Coloco-o na bainha e volto da mesma forma que fui.

Desço da árvore e paro para pegar ar, o que faz minha visão ficar mais turva ainda. Passo a mão no meu nariz e a olho: Sangue. Mas ao menos meu nariz não quebrou. Limpo ele com um pedaço da minha roupa, e começo a minha caminhada de volta para a clareira. Quando chego lá, Raoni me recebe:

- Olha só! Parece que Teçá ganhou. Parabéns! - Ele me diz e dá tapinhas nas costas- Estou surpreso que você conseguiu recuperar seu machado. Só podia ser meu filho! Agora sente-se e espere os outros chegarem. - Ah, esqueci de contar: Raoni é o meu pai.

Esperamos mais ou menos meia hora, até que todos chegam. Quer dizer, quase todos. Faltava 1.

- Esperaremos mais 5 minutos - Anuncia meu pai - Se ele não aparecer, vocês estarão liberados, e eu me encarregarei de procurá-lo.

Quatro minutos se passam, e nem sinal dele. "O que será que aconteceu?" Penso desconfiando "Já está quase escurecendo, ele já deveria ter voltado".
Um minuto depois, meu pai diz:

- Certo, já se passaram 5 minutos, podem ir para suas casas. Vou procurar Oopa. - Assim que nos levantamos, escutamos o barulho de um tiro vindo da floresta. Olho para Raoni, mas nem preciso perguntar para saber o que significa: Os homens brancos estão aqui.

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