Capítulo 16 - O postulante

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Fortaleza - BRA, sábado, 14 de junho de 2014


Sobrevoando a grande Fortaleza em seu quadro tecnológico, o Vigilante podia contrastar a paz reinante ali no alto com o pandemônio de hipocrisia e luxúria instaurado lá em baixo.

Nem a chuva amenizava o calor das emoções negativas e criminosas que transpirava no coração dos poderosos dominantes da quinta maior metrópole do país.

Poder e controle, eis a única linguagem que falavam e compreendiam bem, e a única coisa que temiam perder. Para eles, poder era controle e controle, poder. Um não existia sem o outro.

E ninguém queria perder o poder, muito menos o controle, mesmo que o alicerce fosse fundamentado sobre vidas humanas, como era o caso.

A imprensa, que atuava contra o descaso do poder público, estava corrompida, subornada por verbas milionárias, silenciando a verdade, favorecendo a mentira, contribuindo diretamente para o aumento da criminalidade. Poucos jornalistas se mantinham fiéis aos princípios estabelecidos pela justiça.

Esse era o quadro com o qual os justiceiros mascarados tinham que lidar. E mesmo usando métodos politicamente incorretos, não conseguiam dar um basta nas atrocidades geradas pela ganância ou pela abstinência do dinheiro fácil.

Como se já não bastasse todo o conglomerado pelejando, na medida que podiam pelejar, contra os Vigilantes, uma sombra ameaçadora pairava sobre eles. Uma pequena frase, que mais parecia uma seta banhada em veneno mortífero, reverberava entre os inimigos como um sinal de esperança de que as atividades dos Vigilantes tinham chegado ao fim, e que tudo voltaria a ser como antes.

Claro que tal mensagem poderia ter inúmeras interpretações, mas para deixar a bandidagem em êxtase, aguardando silenciosamente o desfecho desse planejamento, só algo incrivelmente dramático conseguiria tal efeito.

Mas o que seria?

O Vigilante buscava a resposta.

Ao longe, em cima de um edifício, um jovem magricelo acenava. O Vigilante reconheceu a fisionomia do postulante a justiceiro Alex Fontana, o Kid Veado, e dele se aproximou.

- E aí, K.V - disse o Vigilante.

- Viu o que aconteceu no cemitério? - Kid Veado indagou.

- Raiden se precipitou.

- E não só se precipitou como também fracassou no que intentava fazer. - Kid Veado informou. - Masami conseguiu escapar, e a informação que eu tenho é de que ele vai invadir o quartel general do nosso traficante favorito ainda hoje! Isso pode acabar atrapalhando o seus planos, Air-Black.

- Tem certeza?

- De que pode atrapalhar seus planos? - Kid Veado inquiriu com ironia. - Certeza Absoluta.

- Sobre o ataque ao quartel general.

- A informação veio direto da fonte - Kid Veado respondeu. - Não precisa desconfiar de mim. O Alemão não foi o único que morreu pelas mãos de Raiden.

- E a minha informação? - O Vigilante indagou.

- Meu informante garante que sabe de onde essa informação partiu. Mas não quis me falar por telefone, diz que tem medo de ser gravado ou coisa assim, e que prefere falar pessoalmente.

- Onde?

- Calma, gatinho, ele esperto. Quer me encontrar em um local público.

- Tipo o que, um parque ou uma praia?

- Tipo, um estádio de futebol, em um jogo de Copa do Mundo, marcado pra hoje, às 16:00hs, Uruguai e Costa Rica.

- Parece um encontro - disse o Vigilante.

- É um encontro.

- Um encontro casual - o Vigilante pressupôs, sua voz revelando o que a máscara metálica não conseguia revelar, que estava profundamente desinteressado -, nada mais que isso.

- É aí que você se engana, meu querido amigo misterioso - Kid Veado o contestou antes que o quadro tecnológico o levasse para longe. - Ele é um cabo do exército, faz parte da minha comunidade LGBT no Facebook, e foi ele mesmo quem fez um comentário que era idêntico a frase que você mencionou a mim, justamente no momento em que todos debatiam a legalidade dos justiceiros perante a constituição brasileira.

- Coincidência.

- E você acha que eu não teria percebido? - Kid Veado retrucou irritado. - Posso ser postulante, mas não sou amador. Ele sabe, Air-Black, eu sei disso. Qual é, cara, confia em mim. Esse cara é viciado em sexo, vai querer me levar para um motel antes do fim do primeiro tempo. E é aí que você vai entrar em cena.

- Se ele não tiver nada, juro que entrego você à polícia, como fiz com os outros postulantes.

- Ao invés de ficar aí me ameaçando, por que não tira esse traje e me acompanha?

- Não vai rolar.

- Foi o que imaginei.

A ORIGEM DA GUERRA - O MUNDO PERDIDO DOS FILHOS DE ADAM - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora