PALAVRAS ESQUECIDAS

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Abri os olhos devagar, o suficiente para me acostumar com a luz.

Suspirei fundo, com um pouco de incômodo no estômago e nas coxas. Não me lembrava do que havia acontecido e nem mesmo o motivo de meu corpo estar enfaixado.

- Sou Sir Zol. - Por favor, vista-se e me acompanhe. Eu não me lembrava do homem que falava comigo e nem mesmo de onde eu estava.

Momentos da minha vida anteriores àquele momento haviam sido excluídos por completo, como um apagão na madrugada.

Alguns minutos depois, ele me entregou um vestido vermelho e ficou parado me observando enquanto eu me levantava confusa.

Toquei a seda e apreciei a cor com meus pensamentos nulos e silenciosos na cabeça sonolenta e preguiçosa.

Andei até as cortinas às minhas costas, parecia um lugar reservado. Troquei-me depois de perceber estar à vontade.

Tentei procurar incansavelmente por entre minhas memórias alguma coisa que me fizesse lembrar, pelo menos, qual era o meu nome.
Quem era o homem sentado na cama, onde eu estava e até mesmo quem eu era.
Nem uma lembrança veio à minha mente.

Quando terminei de arrumar o vestido carmim em minha cintura, puxei meu cabelo que estava preso em um coque alto.

Analisei as mechas cumpridas e negras, brilhando com a pouca luz que passava por entre os pequenos furos do tecido áspero da tenda bem arquitetada.

Sai de trás das cortinas, finalmente.

O homem que me esperava antes, sentado na cama, havia sumido dali.

Percorri a tenda com meus olhos atentos e o encontrei sentado na mesa, um pouco distante e com um prato nas mãos.

- Coma. Ele ordenou e meu estômago revirou. Mas me sentei e tentei engolir um pouco da comida.
- Lave o rosto. Me ordenou mais uma vez e eu o fiz, ainda sem me lembrar do homem ou de mim mesma.

Ao secar meu rosto e esticar as costas, observei meu reflexo em uma pedra clara acima da bacia com água.

Meus olhos eram diferentes. Minha pele clara, meu cabelo negro e eu me identificava com cada diferença, mesmo não as compreendendo.

"Acho que a maioria das coisas do mundo não tem uma explicação, elas apenas acontecem ou se formam."

Assim que me virei para o homem arrumando a mesa e limpando as migalhas, ele me fez segui-lo.

Ao olhar para a grama verde, a luz e cada pessoa que andava rotineiramente, eu me deparava com fleches de memórias embaçadas e confusas, que eu não conseguia resgatá-las mesmo se quisesse.

- Venha. O homem me levou a uma tenda no centro da aldeia e disse para eu me sentar e o esperar.

O lugar era enorme e incrivelmente limpo e bem arrumado.
Eu me cansei de esperar depois de um tempo, eu estava entediada.

Levantei e saí. Andei um pouco por entre as pessoas, mesmo tonta e com dificuldades para me lembrar de tudo, eu me mantive com a melhor expressão que pude.

Caminhei por um bom tempo até chegar a uma árvore, uma macieira verde e farta de frutos.

- Oi, está acompanhada? Um estalo percorreu meu corpo e eu literalmente pulei de susto.

O moço era loiro, com os olhos curiosos e em um tom de violeta. Me pareceu ser educado e bem-humorado.

- Me desculpe, não quis lhe assustar, vou me sentar aqui, se não se importa. Ele se sentou alguns poucos metros de distância e com dificuldade pela perna machucada.
Silêncio pairou.

Pelo Sangue da Besta (Saga Leviatã)Onde histórias criam vida. Descubra agora