Capítulo Trinta e Cinco

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RAFAEL MONTEIRO

Um segundo grito vaza pela porta. E Elena estremece de novo.

E eu continuo sentado longe dela, sem saber o que fazer. Ou me aproximar. Renan e Nabim estão lidando bem com a situação.

Ainda estou com a mochila dela. Ainda seguro a mochila dela como se fosse a porra de um bote salva vidas. É a única coisa que mantém minha cabeça pensando.

Renan fala baixo com Elena, após ver algo no seu celular. E fala com Nabim, que começa a vir na minha direção.

— Vamos levar Elena para casa. — concordo, ele estica a mão querendo pegar, tiro a mochila da sua direção e me levanto.

Eu vou levar a mochila.

Mando uma mensagem para Clara, avisando que estou indo embora. Clara, Lúcia e Mateus tinham voltado para a aula, a coordenação não queria mais atenção ou alunos passeando pelos corredores tentando ouvir sobre o acontecido. Os Andrade chegando acompanhados de dois advogados já foi uma cena e tanto.

E sujar ainda mais a imagem do colégio era a última coisa que Carlos queria.

Elena caminha apoiada em Renan, que tem um braço passado na sua cintura, a mochila no outro. Nabim caminha ao meu lado, quieto.

O clima é tão denso que fica difícil respirar, tudo parece maior e longo. A escada se tornou uma escadaria com 300 degraus, os corredores que levam à saída estão intermináveis e a agonia de não saber o que fazer também.

A única coisa que faço é segurar a mochila.

Finalmente passamos pelas catracas. E é um leve alívio me toma. O carro de Elena não está longe, caminhamos quietos. Não tem brincadeiras, nem mesmo o som da rua, afasta o silêncio incômodo. 

O trajeto até a sua casa é silencioso. Nabim dirige, e a única coisa que penso é em como Elena é apegada ao seu carro e que se estivéssemos numa situação normal seria ela atrás do volante, ouvindo música alta e xingando os outros motoristas. Mas, as peças estão fora do lugar.

Todas elas.

*

Na cozinha da casa de Elena, assisto Nabim preparar um pão caseiro fino, tradicional do seu país. Ele sova a massa com força, suponho que veja Fernando. Renan levou Elena para o quarto e eu fiquei para trás, de novo, sem tomar uma atitude. 

Covarde, com medo de não saber lidar com ela.

Com medo de piorar a situação e deixá-la mais triste.

Cansado de ficar envolto do silêncio incômodo pergunto a Nabim:

— O que você acha que vai acontecer? 

Ele deixa a massa descansando num pote grande de vidro e cobre com um pano de prato. 

— Não sei, o Álvares de Azevedo não liga muito para bullying ou assédio. — apesar de dar de ombros, sua raiva é nítida. 

Nabim foi um dos alunos que sentiu na pele o descaso da diretoria. E não só deles, de todos os outros alunos, eu inclusive.

— Eu sinto muito. — sem entender, espera minhas próximas palavras. — pelo primeiro ano, por ter sido como o Carlos e os outros.

— Isso já passou, Rafael. Não adianta ficar me prendendo ao passado. Eu também não fiz nada, fiquei parado assistindo a tudo que fizeram comigo. Se não fosse por Renan e Elena, poderia ter ficado por muito mais tempo na inércia. 

A física entre nós [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora