Extra - Café à meia-noite

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Os dedos inquietos tamborilavam a madeira escura, o eco se espalhando pela sala conforme a sintonia consternada se tornava cada vez mais estridente. Dezenas de pastas suspensas encontravam-se espalhadas sobre o mogno escuro, e acima destas estavam folhas de papéis dispostas desordenadamente rompendo com qualquer organização prévia que ali havia.

No canto da mesa, uma cópia do The Japan Times estampando a notícia em primeira página "Homem Mata Família e Comete Suicídio". O polegar deslizou pela foto no centro do arquivo aberto, as imagens representando cenas brutais demais para que qualquer pessoa pudesse assisti-las por tanto tempo. Mas ele não era qualquer pessoa. A destra foi depositada sobre a pilha de fotografias, e com um deslizar lateral, estas foram alinhadas em uma sequência intencionada.

A cadeira rangeu quando os cotovelos se apoiaram sobre a mesa, o queixo delineado se apoiando nas mãos cruzadas enquanto os olhos de ônix escaneavam detalhadamente cada informação discreta no cenário caótico. A mulher nua estava deitada sobre a poça de sangue, sua barriga lacerada e a criança arrancada de seu ventre lançada ao lado do corpo inerte. O olhar vítreo captado como uma impressão, um relato que nunca poderá ser contado.

O suspiro pesaroso era carregado de culpabilidade, uma lamentação particular recitada dentro das quatro paredes da sala privada, conhecida apenas pelo seu autor e os fantasmas que insistem em persegui-lo por sua existência efêmera. E dentre todas as lamúrias acumuladas, aquela seria apenas mais uma. Um caso de violência familiar que acabou tomando proporções desmedidas. Não havia nada que pudesse ser feito agora.

Mesmo com onze anos de profissão, o fardo não se tornava mais leve, pelo contrário, era cada vez mais insustentável. Em meio há um suspiro esmorecido, deixou-se afundar na poltrona confortável, a cabeça roçando contra o couro sintético com um ruído desagradável. Quem ele queria enganar? Em sua cabeça os sons de choro ressoavam repetidamente, e o sangue em suas mãos se tornava cada vez mais escuro. Está ficando difícil e o relógio está correndo incessantemente.

Cerrou os olhos ao sentir a cabeça latejar, seus nociceptores respondendo aos estímulos do estresse reunido durante o dia. Talvez eu precise de férias. Inspirou fundo afastando toda e qualquer distração ocasional. Fitou o relógio na parede que marcava 23h em ponto, as horas pareciam engoli-lo a cada novo dia, e ele estava se esgotando, pouco a pouco, se deixando soterrar no meio daquele maldito escritório.

Com um movimento para trás ele se pôs de pé, as mãos agilmente juntando as fotos e depositando dentro da pasta aberta. Ele agrupou os arquivos em uma pilha no canto da mesa, os relatórios preenchidos ao longo do dia de trabalho sendo agrupados em outra pilha no centro, prontos para serem entregues na primeira hora de expediente amanhã.

Seus olhos varreram o espaço de trabalho uma última vez como garantia de que a organização usual estava ali. Satisfeito com o resultado, ele agarrou o copo vazio de café sobre o porta copo e o lançou na lixeira ao lado da mesa, com a outra mão alcançou o celular próximo ao computador, guardando no bolso. Caminhou em direção à porta, pressionando o interruptor ao sair.

A porta bloqueou a visão para a sala agora escura, a placa com letras douradas contendo a frase "Delegado Jeon" se destacava na madeira. A delegacia de polícia estava silenciosa, restavam apenas alguns poucos funcionários noturnos, sendo metade deles em patrulha. Jungkook cumprimentou o recepcionista e seguiu para saída, sendo atingido pela temperatura externa, que o lembrou prontamente o quão quente o verão no Japão poderia ser.

Deslocou-se pelo estacionamento quase vazio, a iluminação baixa dos poucos postes distribuídos no local era a única orientação que podia ter no meio da noite. Enfiou a mão no bolso da calça encontrando a chave do veículo e destravando assim que o avistou. Se jogou no banco do motorista enquanto afrouxava a gravata, a porta sendo fechada com força involuntária, fazendo o som ecoar pelo estacionamento até então silencioso.

Parfum de Sang - JJK + PJMOnde histórias criam vida. Descubra agora