Sob a Superfície Calma

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O sorriso dela chegou aos seus olhos e ele sorriu quase como um reflexo. As vezes os músculos da face doíam, porque a muito tempo ele não fazia isso, só quando estava perto dela, vendo ela sorrir ou o sobrinho sorrir ou rir, ele sorria, de forma desajeitada devido à falta de prática, mas sorria. Aquela era a demonstração que o coração dele estava transbordando de carinho. Sim, isso mesmo? Quem diria que um dia ele sentiria tanto por aquelas duas pessoas.

Os ruídos infantis envolviam o homem, ali, nas sobras, escondidos pelas folhas do arbusto do parque, feliz por ver aquele momento de paz entre tia e sobrinho. Que brincavam no parque sob o olhar vigilante dos seguranças e do homem nas sombras.

Era tudo que ele poderia ter deles, mas se sentia tão preenchido por isso. As vezes até fechava os olhos para guardar dentro de si o som da voz de Yusuf: "Tia! Tia! Olha o que eu sei fazer?". Ela o aplaudindo e rindo de alguma travessura feita pelo menino. Eram os sons da sua família, da sua doce família guardado dentro de si para os momentos de solidão.

Não que ele não estivesse acostumado com a solidão. Mas depois de ter a sua família, agora a escuridão parecia ser mais pesada do que nunca, então aqueles momentos, assistindo-os se divertirem traziam paz para ele. Agradeceu mentalmente ao seu fiel amigo, Cenger, que conseguiu convencê-la a ir ao parque com o Yusuf, assim eles se aproximariam mais, pois nada como uma tarde no parque para aplacar o rancor infantil, sendo assim ela esquece essa história de mandá-lo para a escola e ainda por cima, ele consegue ver sua família.

Estava cansado de ver através das grades da mansão, tão distante, quase inalcançável.

O mais perto que havia se aproximado dela foi no enterro. Mesmo recém-operado, ainda se recuperando de quase ter morrido, ele fez um verdadeiro inferno para poder estar lá. A dor era menor do que aquele desejo quase doentio de ver como ela estaria. E mesmo com toda a raiva, a lágrima que desceu pelo rosto dela, fez com que o homem sentisse um alívio ao ter certeza, que no fundo ela o amava e lamentava a sua morte. Era doentio, Yaman tem consciência disso, mas não ia conseguir viver uma vida sem saber o que ela sente. Também viu a culpa, mas sabia que ela carregaria aquele sentimento, ela é uma boa pessoa, sentiria remorso, mesmo o odiando.

Abriu os olhos novamente, e ficou vigiando, a distância, atento, guardando tudo que poderia guardar deles para si. Até que o menino pediu para ir ao banheiro. Ao ouvir aquilo, Yaman se apressou e se adiantou indo primeiro, se escondendo em uma das cabines. Pode ouvir o menino dizendo:

- Eu posso ir só, tia. Eu já não sou mais um bebê. – O homem sorriu orgulhoso do seu garoto.

Esperou o menino entrar, usar o banheiro, para então sair discretamente de onde estava. Sabia que era arriscado o que estava fazendo, mas o desejo de ver o sobrinho era imensamente maior do que o bom senso, sua recompensa foi ver o sorriso do menino assim que o viu pelo espelho, falando todo animado:

- Tio! – Yaman rapidamente levou o dedo até os próprios lábios fazendo sinal de silêncio, enquanto se abaixava, o menino correu até ele falando baixinho e cuidadoso. – tio.

- Como vai, meu pequeno Pasha?

- Sentindo muita saudade, por que o Senhor foi embora?

- Eu tive que ir. Mas sempre vou estar por perto cuidando de vocês. Tudo bem? – O menino balançou a cabeça afirmativamente. – Promete que não vai contar para ninguém que me viu aqui?

- Prometo. – O menino fala de forma sincera. – Mas por que ninguém pode saber? Nem minha tia pode saber?

- Não. Ninguém pode saber. É um segredo Kırımlı. Porque assim ninguém vai fazer mal para vocês e vocês não vão ficar tristes. Certo? – Ele oferece o dedo mindinho para o menino que logo envolve com o dedo mindinho dele.

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