Lua Cheia I

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Cheguei para trabalhar na segunda-feira cantarolando e muito de bem com a vida, Proença já tinha até debochado mais cedo falando que estar apaixonada mudava as pessoas porque eu nunca fui alguém que cantarolava na segunda de manhã, mas bem o que eu podia fazer se estava feliz?

Tobias, é claro, viu que eu estava de bom humor e já me passou uma lista de tarefas a fazer, a senhora Choi queria redecorar todo o jardim agora no outono e ele precisaria da minha ajuda. Mas primeiro, é claro, fui até o galinheiro realizar minha tarefa diária de coletar os ovos e conversar com as galinhas. Maristela estava especialmente apática hoje e eu me preparei para ter uma sessão de terapia com ela, quando ouvi a voz do Liam me chamando, o que era estranho porque achei que ele já estivesse na faculdade. Coloquei os ovos no cestinho e fui ao encontro dele, deixando a sessão terapêutica da pobre Maristela para trás.

— Não sabia que você estava em casa — falei ao me aproximar dele.

— Ah, hoje eu não tenho aula de manhã, a professora cancelou — ele deu um sorrisinho.

— Então é melhor você não ficar dando sopa por aqui ou é capaz do Tobias te colocar no serviço — brinquei.

— Na verdade, eu preciso que você suba comigo, tenho que te mostrar uma coisa.

Havia algo de estranho no tom de Liam hoje, foi a primeira coisa que percebi assim que falei com ele. Seu olhar também estava esquisito, era quase como se tivesse acontecido algo, mas da última vez que nos falamos ontem à noite, ele estava normal. Fiquei com a pulga atrás da orelha, então larguei os ovos na cozinha e decidi acompanha-lo até seu quarto. Assim que chegamos lá, ele fechou a porta atrás de nós e sentou na cadeira em frente ao computador, me indicando a cadeira vazia ao seu lado.

— O que aconteceu? — perguntei confusa — Por que todo esse mistério?

— É um assunto difícil... — ele suspirou — Você se lembra quando eu disse que tentaria descobrir o paradeiro do seu pai?

Assim que ouvi aquelas palavras, fiquei tensa de imediato e segurei a respiração. A verdade é que quando falamos sobre isso, não achei que o Liam ia mesmo procurar pelo meu pai, ou que mesmo que procurasse, não iria encontra-lo. No entanto, ali estava ele me explicando que ficou um bom tempo procurando e embora a única pista que tivéssemos fosse o nome dele, ele o havia encontrado. No entanto, pela expressão que trazia no rosto, eu senti que não iria descobrir uma coisa boa.

— Ele está morto, né? — falei — Pode me dizer, eu já imaginava isso.

Liam balançou a cabeça de forma negativa.

— Seu pai está vivo — afirmou.

Arregalei os olhos e senti meu coração disparar no peito, como assim meu pai estava vivo depois de ter sumido por tanto tempo? Porém logo fiquei nervosa de novo, se ele estava vivo e aquela não era a notícia que tinha deixado Liam com aquela expressão cinzenta no rosto, então o que será que eu estava prestes a descobrir?

Ele começou a me contar como procurando pelo sobrenome do meu pai, Ehrenberg, não foi tão difícil de encontrar, já que não é um sobrenome comum aqui no Brasil. Eu carregava esse sobrenome comigo, Luana Ribeiro Ehrenberg, e sempre tinha sido uma grande confusão fazer as pessoas entenderem como isso se escrevia. Agora, pela primeira vez, parecia que o sobrenome de origem alemã da família do meu pai estava tendo algum benefício, pelo menos foi através dele que Liam filtrou todos os perfis que encontrou em uma rede social até finalmente encontrar um que lhe chamou a atenção. Pertencia a um senhor que morava em Praia do Amanhecer, uma cidade litorânea em Santa Catarina.

— Herbert Ehrenberg — ele disse — Esse nome te é conhecido?

Fiquei pensando por alguns segundos, até que meu cérebro puxou uma memória muito antiga, de quando eu ainda era criança e meu pai não tinha sido derrotado pelo vício em bebidas. Estávamos deitados na rede e ele me contava sobre sua família, um dos raros momentos em que falou sobre eles comigo. Seu pai, um homem chamado Herbert, tinha vindo da Alemanha ao Brasil junto da esposa, Magda. Os dois se estabeleceram em Santa Catarina e abriram uma loja de materiais de construção. Lá tiveram três filhos, sendo meu pai o caçula. Desde pequeno, meu pai sempre gostou de pescar e queria levar uma vida simples, mas seus pais não tinham os mesmos planos para ele e queriam que ele assumisse os negócios da família. Eu não sei bem ao certo se foi só esse o motivo da briga, mas um dia meu pai fez as malas e partiu para o Amazonas, para viver a vida de pescador que tanto queria ter. A briga foi feia o suficiente para que ele cortasse relações para sempre com a família, portanto eu nunca conheci meus avós paternos.

As quatro fases da LuanaOnde histórias criam vida. Descubra agora