Quarto Crescente VI

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A minha primeira semana trabalhando oficialmente não foi tão interessante quanto eu achei que seria, quer dizer, o ponto alto dela foi um dos porcos ter escapado do chiqueiro e Tobias e eu correndo igual dois malucos atrás dele, antes que invadisse a horta da senhora Choi. Fora isso, não tinha nada de muito interessante para fazer, era meio que sempre a mesma coisa, pelo menos não era difícil. Monica e eu ficamos mais próximas também e eu ensinei a ela algumas coisas que eu sabia sobre cavalos, e ela me ensinou outras. Para uma garotinha de doze anos, ela era legal, ou era eu que tinha descoberto que me dou bem com crianças depois de passar anos longe delas. Liam e eu quase não nos falamos e quando falamos, era para discutir sobre alguma coisa idiota, então eu até preferia que ficássemos distantes assim, evitava que eu tivesse que ouvir ele falar sobre como a tal Lia era incrível e blábláblá.

No sábado, ajudei a Proença com as coisas da fazenda, depois que eu comecei a trabalhar, ficou um monte de trabalho acumulado. Ainda tinha outros sete jovens por lá: Maicon, Beatriz, Stephanie, Bruno, Giovanna, Pietro e Gabi, sendo os dois últimos os únicos menores de idade que a Proença mantinha lá com identidades falsas para escapar de ter problemas na polícia. Assim como eu, Maicon e Beatriz estavam trabalhando fora, ele em uma oficina mecânica, ela como garçonete. Giovanna era cadeirante, tinha perdido o movimento das pernas em um acidente de carro com o ex-namorado drogado dela. Isso deixava a Proença com apenas quatro pessoas para ajudá-la na fazenda e ela ainda tinha insistido para os mais novos terminarem a escola por ensino à distância, ou seja... sobrava trabalho todo dia. Então no sábado cuidamos da horta, dos animais, da limpeza dos trailers, de toda a roupa suja... No fim do dia, eu quase não aguentava de dor nas pernas, tinha trabalhado o dobro do que fazia na fazenda dos ricaços, mas não podia negar ajuda àquela mulher, não quando ela tinha salvado a minha vida.

Quando anoiteceu, nos reunimos para assistir alguma coisa na televisão, já eram os tempos em que final de semana significava fazer festa até de manhã cedo, bebendo e falando sobre qualquer coisa que não fazia o menor sentido. O time atual de moradores da fazenda era mais recatado, todo mundo que era maluco saiu, ficou só eu do time das antigas. Então, ao invés da curtição, a gente ficava agora amontoados na sala da Proença vendo filmes na televisão, e ela preferia assim. Hoje tínhamos escolhido uma comédia romântica, não era lá meu tipo de filme favorito, mas foi votação unânime, então me conformei.

Tinha começado a chover muito do lado de fora, o vento estava soprando com força nas janelas e ficamos até com medo que fosse faltar luz já que a mesma não parava de piscar. Estávamos todos encolhidos no sofá quando a campainha tocou e a Proença levantou confusa para ver quem era. Não estávamos esperando ninguém – aliás, a gente quase nunca recebia visitas, ainda mais no meio de uma tempestade – então os meninos começaram a provocar dizendo que era o cenário típico de um filme de terror e que sabe-se lá quem estivesse tocando a campainha, tinha vindo acabar com as nossas vidas. Dei um tapa na cabeça de cada um deles e mandei pararem com isso, só de pensar em alguém vindo me matar me vinha a imagem do Benjamin com um facão me esperando no portão da fazenda, Deus me livre...

— Luana, vem aqui — Proença estava parada na frente do computador, olhando a câmera de vigilância que tinha instalado no portão — Não é aquele garoto que você conhece?

Gelei, juro que gelei até a alma, até o dedinho do meu pé. Não podia ser ele, de jeito nenhum, Benjamin não podia ter me achado aqui... foi quando me dei conta de que a Proença não conhece ele, então não teria como identifica-lo... levantei aliviada e caminhei até ela, bem em tempo de ver algo quase tão esquisito quanto o Benjamin na tela daquele computador.

— Liam? — aproximei o rosto para ver melhor e lá estava ele, ensopado dos pés à cabeça e tremendo.

— Eu vou buscá-lo com o carro — Proença saiu correndo e pegou a chave do carro para chegar mais rápido ao portão, pois era uma caminhada de uns cinco minutos até lá.

As quatro fases da LuanaOnde histórias criam vida. Descubra agora