Capítulo 5.5

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Lá fora ainda chovia. Algo o acordou.

Ainda era terça-feira, mais para junho do que para maio. Dormia bem pela primeira vez em semanas pois estava exausto. Não sobrava muito espaço para pesadelos.

Não era de ter sono leve, ainda mais naquele dia. Algo estava errado.

Ouvia passos, alguém que não estava sozinho, mas não era um padrão que reconhecesse. Diferente dos passos leves, quase felinos, das meninas, esses eram de sapatos pesados, masculinos. Nunca vira um homem, sem que fosse ele, pisar no terceiro andar. Mama geralmente lidava com clientes logo nas escadarias do hotel – "para já os chutar até a sarjeta se necessário".

Além do mais, era proibido. Sob ameaça de expulsão. Não acho que precise explicar o motivo.

Sentou na cama, piscando no escuro, sem saber se realmente ouvia ou sonhava. Respirava lentamente para poder dar atenção aos passos. Eles foram ficando mais e mais altos, até que pareceram diminuir em quantidade, passaram por sua porta e sumiram mais a frente. Estupidamente, decidiu levantar e olhar pelo buraco da fechadura.

Péssima ideia, todo mundo sabe que não se sai dos cobertores quando tem um monstro do outro lado da porta.

Ele andou na ponta dos pés, trocando o peso lentamente entre as pernas, se aproximou do freixo onde ficava a tranca e tentou espiar a escuridão. Quando a porta foi escancarada com força contra seu rosto, sentiu o supercílio abrir.

Pela segunda vez naquela mesma semana, viu uma luz forte brilhar por trás dos olhos e o mundo escureceu. Caindo para trás, apoiou uma mão no chão e a outra sobre o corte, tentando quase inconscientemente apaziguar a queda. O corte molhou sua mão antes mesmo de cair, era o segundo da noite.

O quarto estava iluminado apenas pela luz fraca do poste de rua, mas ele viu com clareza quando adentraram o cubículo. Dessa vez não faziam barulho algum ao andar.

Dois brutamontes que não conseguiu reconhecer imediatamente entraram com tudo no quarto. Antes mesmo que pudesse reagir, puseram um saco sobre sua cabeça e seguraram-no com força.

Ethan chutou, xingou e até tentou cuspir, o que obviamente não funcionou muito bem. Alguém grunhiu na escuridão, não foi ele. Ele sentiu que tinha acertado um dos chutes descalços e comemorou.

— É isso aí! Toma essa seu – Pausou para cuspir o saco da boca – BOS— uma pancada na têmpora o tirou do jogo.

Quando recobrou a consciência já era tarde demais para qualquer reação, estava sendo levado, amarrado, para fora do quarto. A sensação de acordar sendo carregado, sem conseguir mexer um membro qualquer, ainda por cima encapuzado, isso finalmente jogou um balde de realidade sobre Ethan. Ia falar, mas sentiu um peso gelado se alojar na boca do estômago. Conhecia bem esse peso.

Estavam-no levando para fora do Ninho, soube disso pois via as pequenas luzes acima das portas dançando no tecido preto do saco. A pancada o tinha tirado do ar o suficiente para que conseguissem prender suas mãos com abraçadeiras de plástico e colocá-lo nos ombros para ser levado. Teria gritado, mas não queria pôr as meninas em risco. Fosse quem fosse, não parecia querer nada com elas...

O alvo sou eu.

Tentou se livrar, mas assim que seu corpo se mexeu sentiu de novo aquele peso pressionando seu pescoço por sobre o pano. Era uma arma, não restavam duvidas.

— Então essa que é a sensação de ter uma arma apontada para você.

— Mais outro desses shows e a gente te deixa aqui mesmo, palhaço.

Sangue de Moleque - KorvoOnde histórias criam vida. Descubra agora