A sucessora

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A sucessora

Virgílio, chefe da segurança, se esbaldava com um churro, esparramando açúcar pelo canto da boca, enquanto ria com fartura, comentando o tremendo mal-estar ou saia-justa em que o hóspede da casa punha os políticos desde aquele dia. Veneravam Yuri pelo seu caráter de atitude. Venâncio, o segundo de uma equipe de vinte outros que diuturnamente guardavam a casa, também ria às lágrimas, enquanto os demais disfarçavam com seriedade. Era um negrão bonito de quase dois metros, superalinhado na grife e quando sério, intimidava gente de qualquer tamanho, mas tinha sorriso de moleque e Virgílio, era bem menor - imitava o senador Eustáquio como ninguém. A descontração teve fim quando avistaram lá longe, na esquina onde termina o muro, um séquito de motocicletas enfileiradas em dupla, sem pressa, invadindo a rua. Logo após a quinta dupla de motos, avistaram o bico de uma limusine branca enorme, também sem pressa. Postaram-se eretos, em guarda, em alerta máximo, com uma mão na pistola enrustida e outra no Nextell. 

- Quem seria o maluco? 

Quando as motos se aproximaram dos portões, estacionaram em círculo no meio da rua, abrindo passagem para a o carro branco, que se centralizou entre elas. Do carro saiu uma dupla de seguranças, enquanto pela porta de trás descia um sujeito baixote de barbas grisalhas. Parecia conhecido, importante. Mais de perto, Virgílio pôde constatar, pasmo, que era o presidente da República: o próprio. 

- Que diabo esse cara veio fazer aqui, meu Deus do Céu?  

- Sei lá.  

O presidente de nome comprido, Fernando Inácio Neves Cardoso Collor era um cara bem humorado. Aproximando-se de Venâncio, quebrou o protocolo: 

- E aí, grandão, posso falar com seus patrões? 

Venâncio gaguejou alguma coisa afirmativamente, enquanto clicava no aparelho de voz: 

- Patroa, temos uma visita. 

- Quem é, dessa vez, Virgílio? Fomos dormir muito tarde, (sempre confundia os nomes) diga que não teremos entrevistas hoje antes das cinco. 

- Mas, patroa, é o presidente da república. Veio pessoalmente falar com a senhora e o homem futurista. Podem entrar? 

Thalia deu permissão apenas para o presidente e seus acompanhantes principais. A segurança presidencial poderia ficar lá fora, com eles, duplicando a segurança do encontro - para felicidade de Venâncio, todo empertigado, distribuindo ordens aos federais. O presidente, que acompanhara os últimos acontecimentos com tranquilidade, disse que não se oporia a eleição de um novo presidente. Parecia até aliviado de um pesado fardo. Nessa reunião altamente confidencial com Yuri e Thalia, revelou que estava entusiasmadíssimo com a possibilidade da sociedade enfim exercer o governo por si só, sem a necessidade de políticos, delegados nem comandantes. Não só entregaria a faixa presidencial para o novo governante, como também confidenciou ter assinado o manifesto popular.  

- Mas é segredo. Se perguntarem em público eu desminto. 

Então era só aquilo: viera apenas desejar-lhes boa sorte, e que estaria à disposição para assinar a ordem de conclusão do plebiscito no momento certo, para desagrado de muitos.

AS SETE PRAGASOnde histórias criam vida. Descubra agora