Aurora Sangrenta

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Ciente das enormes possibilidades de fracasso político no inferno, situação potencialmente pior se Sartranas fosse extinto, Hitler precisaria dedicar-se ferozmente nos ataques à Terra, naquilo que ele supunha entender como ninguém: a arte da intriga e da guerra! Primeiro acionou um míssil com bandeira coreana direcionado contra os Estados Unidos e depois, muitíssimo bem disfarçado de chinês, afundou um navio comercial russo que passava por aquelas bandas e assim sucessivamente, até pôr todo o planeta em pé-de-guerra uns contra os outros.

Entrou em cena com as tecnologias extraterrestres malígnas, mais os assombrosos recursos de que agora dispunha, que seriam suficientes para empreender sua vingança contra a humanidade, bem ao estilo cinematográfico. Pena não ser mais humano! Que pena não estar autorizado a descer triunfante para assumir os tronos do planeta, urinar sobre as ruínas da Casa Branca e defecar entre os ouros do Vaticano! Bem, então ao trabalho! E começou então um festival de raios laser assustador nos céus dos hemisférios. Foi como se um diretor falido emendasse várias películas num mesmo filme: "Independence Day", "Contatos Imediatos" e "Armageddon" misturados com "A Profecia"; "Guerra nas Estrelas" e "2012" com o clássico "Jurassic Park". Houve expressiva quantidade de criaturas bizarras que se juntou ao exército de Hitler, vindas das partes mais obscuras das trevas.

E que medonha aurora boreal aconteceu por aqueles dias em que também o Sol parecia de alguma maneira revoltado com a humanidade! Um terrível saldo de mortes para todos os lados, com prejuízos explícitos para os terráqueos que sequer entendiam o que estava acontecendo, ao longo de muitos dias, depois semanas. De uma mesma janela de cobertura, por onde antes se poderia apreciar o vento, o púrpura esverdeado do poente, o horizonte das longas avenidas marginais entre postes e coqueiros... Agora brotava cogumelos de fumaça negra, uma gigantesca couve-flor em cada quarteirão em brasas. Súbita metamorfose em que a normalidade cedia ao mais absurdo dos absurdos momentos. Inúteis os bombeiros para acudir cidades inteiras entre brasas, como que fundadas sobre crateras de vulcão. Inúteis ambulâncias para socorrer aquela chuva de gente caída de altas janelas entre pedaços de pessoas caídas do céu, e de aviões e de urubus alvejados. Gente, até urubus mortos!

Eletricidade, água, medicamentos, luz, transporte, tudo de repente virado num zero, como que presenciando o renascer da idade média em poucos dias! Alguns supunham invasão alienígena, outros acreditavam que era mesmo o apocalipse do calendário maia, os mais céticos achavam que era a mais devastadora das tempestades solares enlouquecendo o universo. Enquanto isso, lá fora entre os demais planetas, as batalhas se davam ao acaso, sem regras nem território, entre os satanistas e os defensores celestiais. No fundo dos oceanos onde havia mar, sobre a poeira de luas, em desertos planetários, planetas gelados, enfim eis a maior tragédia da história do universo, diziam que até as bactérias antárticas e camarões krio pegaram-se no tapa! Aliás, uma dessas batalhas, rápida, porém perigosa, teve início sobre o continente antártico, com desfecho no Pólo Norte, portanto, sobre a estratosfera terrestre houve um curioso espetáculo ao público idiota: uma pavorosa chuva de pernas, cabeças, mãos, dedos, às vezes corpos inteiros e sucatas abatidas despencavam sobre as praças de cidades litorâneas, sem que alguém entendesse as razões.

Como sempre, governadores e prefeitos e até alguns vereadores do Interior, cada qual em seu jornal tirava proveito da situação como podiam. Diziam para a população "se tranquilizar, porque a situação já está sob controle e os responsáveis serão devidamente punidos" (!). E diziam isso com solenidade, sem rubor na careca, como quem fosse colocar Sartranas e Tellenus em celas separadas na manhã seguinte, depois trocar o sol por uma boa lâmpada e pronto, acabou!

AS SETE PRAGASOnde histórias criam vida. Descubra agora