Viagem cósmica

21 0 0
                                    

Thalia, aturdida com a notícia, pediu licença para o Deus Criador e retornou para o leito de sua bioventrina, como um bebê ao berço. Dali partiu num facho súbito de luz, sem rumo, pelo universo afora para onde não existe o tempo. O espírito de Thalia levava então dentro de si uma solidão jamais experimentada por outro ser, onde mil anos e um minuto são a mesma coisa. Ela navegou por milhares de constelações e conheceu parte das maravilhas da eternidade: imensos meteoritos compostos por quilômetros de puro diamante, planetas maiores que a Terra apenas com vida vegetal, planetas imensos compostos apenas por água, planetas compostos por matéria desconhecida na Terra, planetas extremamente semelhantes à Terra com outra civilização humana repetindo os mesmos erros.

Ainda sem saber como seu espírito conseguia se localizar e se deslocar no imenso universo, ela continuou vagando pelo infinito até extremos, até galáxias distantes. Viajou com a maior velocidade do universo, que é a velocidade do espírito, até onde a imaginação mais criativa jamais conseguiria conceber. Conheceu civilizações com extremo avanço tecnológico, algo como a Terra dez milhões de anos depois, conheceu espíritos que viveram na Terra cem mil anos depois do tempo em que ela ali esteve, inclusive o próprio Jesus Cristo, filho de Deus, agora numa missão infinitamente distante, resolvendo problemas de uma outra civilização. Conheceu os sons inacreditáveis do planeta Captum, que absorve para sua atmosfera todos os sons possíveis do universo, sob frequências próprias e distintas entre si. Sentiu a presença de Deus consigo o tempo todo.

Conheceu os Malcas. O universo jamais foi exclusivo da biosfera humana, pois há outras sociedades inteligentes, tantas cuja descrição exigiria um tempo enorme ou uma obra escrita difícil até de carregar entre os braços. Os Malcas são considerados a forma mais invejável de existência: são transparentes, esbeltos, feitos com algo parecido com silicone transparente, humanóides perfeitos, sem os inúteis dedos dos pés, medem entre 3 e 3,5 metros de altura, têm força suficiente para separar uma luta entre elefantes adultos grandes, pois são imunes a impactos: e atirar num malca é como atirar numa gelatina, perder seu tempo! Quando um malca lhe atingir os olhos, os seus em linha reta absoluta com os olhos dele, é melhor que você não seja um cara do mal. Os malcas têm ódio milenar, por muitos milênios, de Sartranas e de seus cúmplices, por uma razão que ninguém ainda sabe.

A estrutura óssea de um indivíduo malca é composta por carbono-titâneo-gelo, ou seja, um esqueleto quase invisível dentro de um corpo translúcido. Eles se comunicam aos bilhões no mais absoluto silêncio: por um tipo de telepatia em terceiro estágio. São muito interessantes: é possível ver surgir do oceano alguns milhões de malcas disfarçados entre as águas, em poucos segundos. Numa circunstância de perigo mergulham no vácuo do universo e ficam invisíveis, depois voltam, incrivelmente bem dispostos como se nada tivesse acontecido. Provavelmente têm o dom de atravessar outras dimensões além daquelas conhecidas. Gelatinosos, podem dividir-se em milhares de pedaços de si próprios, igualmente capazes, em pouco mais de uma hora. O espetáculo da gestação, no ventre de uma mulher malca, comove toda a existência de quem quer que seja, pois elas são quase totalmente transparentes: a mãe acompanha visualmente todos os minutos da evolução do feto. Então a criança nasce cercada por um afeto descomunal. E recebe toda essa energia positiva durante seu desenvolver físico. Os cabelos dos malcas brilham, fio por fio, conforme uma situação emocional: às vezes azuis, mas quando vermelhos é melhor sair da frente. O quanto são belos, e perigosos, até Sartranas reconhecia consigo um certo medo dos malcas.

Todos sabem que os malcas são uma forma superior à humana, semelhantes entre si e corajosos como Deuses. Eles conseguem fazer com que cada movimento de outro malca seja acompanhado pela graça de um espectro mágico que confunde o íntimo até do mais sinistro entre os inimigos do bem, pela simples beleza. E são simplesmente felizes, claro. Ouvir cantar uma mulher malca é algo superior a todas as drogas juntas; manter contato com os malcas, conhecê-los é um privilégio raro, pois eles não têm um planeta fixo, uma casa fixa: são nômades, verdadeiros ciganos cósmicos oriundos do Planeta Malcaya. Se conhecesse os Malcas, a civilização humana certamente sentiria inveja ao se saber desfavorecida, como um patinho feio da existência, inferiores como asnos. Os malcas dançam e adoram arte. Adoram projetar sua arte sobre os planetas, como tatuagens gigantescas, e transmitir o sentido da paz onde é possível serem compreendidos. Um malca é um espírito transmutante: algo entre o ser físico e o espírito, com uma malícia que só eles sabem, defendem as civilizações que merecem, mas ainda não disseram se os terráqueos estariam nesta lista.

AS SETE PRAGASOnde histórias criam vida. Descubra agora