Do inferno ao paraíso pt.1

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As pernas magras já estavam cansadas de tanto correr sem rumo e o medo fazia todo seu corpo tremer. O resultado era o suor frio que descia por sua testa mesmo naquela noite congelante de inverno.

O comércio estava fechado àquela hora da madrugada, exceto por uma pequena conveniência que ficava aberta 24 horas. O garoto conhecia a dona da venda, por vezes fora lá comprar bebida para seu pai quando este solicitava. Por um momento ele pensou em entrar e pedir abrigo, mas ela o conhecia e conhecia sua família, provavelmente o encheria de perguntas e depois o forçaria a voltar para casa. Preferiu virar em um dos becos para tentar se proteger do vento forte e gelado, ele estava descalço e de pijamas, o que não ajudava muito, sua boca já estava ficando azulada e os dentes batiam fortemente um no outro. Ele se sentou em um canto ao lado da caçamba de lixo, abraçando fortemente as duas pernas coladas ao peito em uma tentativa frustrada de se aquecer.

Já estava amanhecendo quando a mulher responsável pela venda foi levar o lixo para fora e se deparou com a criatura tremula e encolhida que mais parecia um gatinho abandonado, mas era uma criança, e quando constatou isso ela imediatamente se agachou e tocou um dos braços dando uma chacoalhada não muito gentil no garoto, não sabia se fazia isso para acorda-lo ou se para saber se o mesmo estava vivo. A pele do menino estava extremamente gelada e ele demorou alguns segundos antes de levantar a cabeça para encara-la

_Oh! Você..

Ela parou de falar. O garoto estava com um semblante mórbido. A pele pálida, os olhos fundos, a boca extremamente roxa. Só havia uma explicação, ele passara a noite ali. A mulher o pegou nos braços e o carregou para dentro da conveniência, ela morava logo ao fundo da venda e o acomodou em uma cama o cobrindo com inúmeros lençóis antes que o mesmo tivesse um desmaio por hipotermia.

A respiração do garoto estava lenta e não demorou muito para cair no sono, enquanto isso ela preparou uma sopa quente e quando retornou sua fisionomia já parecia bem melhor. Ela o olhou com pena e preferiu ser mais gentil ao acorda-lo. O garoto se sentou na beirada da cama e comeu tudo em silencio, ainda se sentia fraco e seus pensamentos pareciam trabalhar lentamente, de qualquer modo queria evitar o início de um dialogo, por isso não abrira a boca nem mesmo para agradece-la. Infelizmente, a mulher queria conversar. Queria explicações.

_Você passou a noite lá fora?

Silencio.

_Por que está sem sapatos e de pijamas?

Silencio.

_Se não responder terei que ligar para seu pai vir busca-lo.

O garoto a encarou com olhos tão tristes e desesperados que até ela, uma mulher bruta e implacável, se sentiu comovida.

_Pode pelo menos me dizer o que aconteceu?

_Eu... _o menor falou tão baixo que ela teve que se aproximar pra ouvi-lo. _fugi.

_Fugiu de casa? Por que faria isso?

Ele deu de ombros outra vez o que irritou um pouco a mulher. Ela não era do tipo altruísta, já tinha ajudado mais do que faria em outras situações, mas o garoto era menor de idade e ela não queria problemas com a vizinhança, ou pior, com a polícia. Ela conhecia a família Uchiha desde quando eles se mudaram para o bairro há mais de dez anos, mas não era como se tivessem intimidade.

A mais velha suspirou fundo e colocou sem cuidado a mão na testa do garoto. Ele estava com febre. Sem pensar mais ela se levantou para sair do quarto lançando um último olhar para o menor antes de dizer: "Sinto muito, não posso cuidar de você. Descanse mais um pouco e ligarei para virem busca-lo." A mulher fechou a porta e seguiu para sala de estar, tinha o número da família uchiha na lista telefônica e ela logo tratou de discar. Não demorou muito para Fugaku aparecer na frente da lojinha e leva-lo embora.

As cicatrizes dos nossos encontrosOnde histórias criam vida. Descubra agora