Familia?

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tic...
tac...

relógio idiota
Cala a boca!

Maddie? Você precisa trocar os curativos. - Heitor estende a mão pra mim, mas eu o ignoro. Só consigo fitar o relógio acima da cabeceira onde Christopher está desacordado

Ele suspira

—Madelaine, por favor...

Seu tom de voz é ameno, preocupado. Com os olhos vermelhos de choro, ele tentava se recompor para me ajudar. Mas eu estava em estado de choque, eu sentia toda a minha loucura retornar, todos os meus medos, minhas angústias...eu precisava dos meus remédios

—Eu não quero que ela me toque. - eu digo a ela, me referindo a ela...aquela que se diz minha mãe

Ele limpa uma lágrima que cai sobre sua bochecha e sorri tristonho

—Eu vou cuidar de você. Vem. - ele segura minha mãos e me levanta da cadeira, cuidadosamente

Eu sinto a dor no ombro enrijecer, mas quando eu deposito o meu olhar se afastando de Christopher, dói ainda mais.

Ao retornar para aquele quarto onde acordei, eu observo Heitor manusear os curativos. Ele tentava de todas as formas me confortar, mas eu não conseguia. Era muita coisa de uma vez só. Eu estava cansada. Exausta. De tanta dor.

—Você acha que...eu não mereço ser feliz?- eu perguntei, com voz de choro

Ele desenrolada a faixa que está enrolada no meu braço, parcialmente suja de sangue.
E enxuga uma lágrima minha

—Você vai ser muito feliz, Maddie. Eu sei que você passou por muita coisa e eu não vou mentir pra você...talvez você ainda carregue muitas dores ao longo do tempo, mas não deixe que isso te impeça de ser feliz.- ainda com a mão depositada no meu rosto, ele encosta sua testa na minha e eu consigo sentir tudo que ele sentia

Seu olhar não era apenas de piedade. Era de compreensão, ele entendia a minha dor. Eu penso em quanta dor ele teve que passar pra sentir tanto por mim, quantas coisas ele teve que viver...ninguém conhece a dor do outro, ninguém entende o que essa pessoa viveu. Nunca se deve julgar a dor alheia. Não é só você que sofre. Eu entendi isso através dele.

—Obrigada...- eu toco sua mão, que está no meu rosto e ele sorri, discretamente

—Agora deixa eu terminar isso...depois você vai dormir um pouco. O Adam vai cuidar do Chris e eu vou ficar com a Bella.

—Como ela tá?

—Um pouco abalada com tudo isso. Ela só era uma patricinha até a gente entrar na vida dela. Então tudo isso é bem novo pra ela. - ele sorri e consegue tirar uma risadinha minha. Era tão absurdo que se tornava engraçado.

Ele envolveu meu braço num novo curativo e me deu um remédio pra dormir, eu não queria dormir, pois sabia que teria Christopher nos meus sonhos. Mas ele insistiu e eu precisava dormir, me sentia exausta.

Quando me deixou sozinha naquele quarto solitário, eu senti o peso que existia ali. Era impossível dormir sem efeito do remédio, minha cabeça fervilhava e eu tentava inutilmente me desvencilhar dele, eu tava com medo de que ele voltasse pra minha cabeça.

Um feixe de luz passou pela porta e ela se abriu lentamente.

—Eu tô tentando dormir, se você não deixar, não vou conseguir...- eu penso estar falando com Heitor, mas quando o quarto se ilumina eu me surpreendo ao ver aquele homem depois de tanto tempo.

—Desculpe atrapalhar o seu sono. Mas acho que precisamos conversar.

Eu me sento na beirada da cama com uma feição de desprezo

—Você é quase como um fantasma pra mim. E eu não falo com fantasmas, pelo menos não até agora.- eu falo, com desdém

Ele tinha mudado completamente, parecia mais velho, sua barba estava grande, seu também devia estar grande, mas estava preso. A única coisa que se mantinha igual, eram seus olhos, continuavam intensos.

—Pra nos poupar tempo, podemos encurtar essa conversa. - ele pega uma cadeira e senta na minha frente, de forma direta. — Eu recebi vocês aqui, muito mais pela sua mãe, porque por mim, aquele filho da puta tava morto, só que você...- ele para com a intensidade que estava falando e me olha, pensativo.
—Você não mudou nada. Continua sendo aquela garota intensa e linda por quem eu me apaixonei...mas com um detalhe, continua sendo maluca! Você não quer que esse desgracado morra?!

—Não! Não quero! - minha voz sai com raiva, sai como uma avalanche de sentimentos que habitavam em mim. Eu nunca falei abertamente isso. Nem sei se era mesmo isso que eu queria, eu só disse que eu senti na hora

—Eu não me importo com o que você acha! Foda-se você, foda-se a Lúcia, foda-se vocês dois! Eu sou maluca sim, mas pelo menos eu sou leal. Eu sou sincera! Eu não sei que merda tá acontecendo, mas eu sei que eu não quero você aqui! Sai !- eu empurrei ele, que quase caí da cadeira

— Você não pode se livrar de mim, nem da sua mãe. Nós somos a única família que te restou...era isso que eu queria contar, mas sua mãe não teve coragem...- antes que ele terminasse de falar eu escuto um barulho vindo de longe

Eu arregalei os olhos, assustada
Era um choro de bebê

Christopher (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora