Não vou deixar você cair

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** Alerta Gatilho: se você está passando por um momento difícil, que envolva transtornos como depressão e outros que possam a vim a estimular pensamentos suicidas, procure ajuda. Ligue para 180 ou entre em contato com alguém que seja o seu Porto Seguro.
Este capítulo contém trechos de gatilho.

Faz algumas horas desde que estou aqui.

O vento meio gelado bate no meu peito descoberto. Sinto meus pêlos se enriçarem com o tempo ameno da brisa do mar, esse que continua a produzir um barulho tranquilo pelo ambiente. O mar está calmo e sereno. Uma combinação interessante com a garrafa de whiskey que estou segurando, ela já está na metade e parece que vou precisar de muitas delas daqui pra frente.

Eu fecho os olhos e não vejo nada. Tudo apagado, como aquele quarto vazio que meus pais me prendiam quando eu roubava comida da dispensa. Tinha tanta comida...mas não pra gente, só para eles. Foi ali que eu descobri que não importava o quão forte os laços entre as pessoas podiam existir, elas sempre iriam te destruir de alguma maneira.

Eu lembrava de como meu pai me acorrentava na cama pra não fugir, pra me castigar por tentar ser uma criança normal. Mas aquela família nunca foi normal. Eles gritavam o tempo todo, diziam que éramos criança do diabo.

Eu dou um sorriso debochado. Afinal, eles até tinham um pouco de razão. Olha só o que eu me tornei.

Os choros, os gritos, as angústias, tudo isso era muito pior quando eu escutava. Parecia que doía menos quando acontecia comigo. Mas quando eu escutava os meus irmãos...era como facadas no peito. A imponência sempre foi cruel, te paralisa, te inferioriza, te faz ser menos do que é capaz.

O Josh era tão pequeno...
Será que ele iria gostar de mim, mesmo sabendo de tudo eu fui capaz de fazer?

Eu caio no choro

Foi tudo por ele, mas pra que? Se ele se foi, que sentido isso tudo fez? Nenhum!
Eu precisava dele comigo, precisava sentir o abraço dele denovo, eu queria que alguém amasse ele como eu amava. Queria que ele pudesse ter uma bicicleta, uma cama só pra ele, um café da manhã cheio de waffles e muita cobertura de chocolate. Eu só queria que alguém pudesse balançar ele no balanço.

Mas ele nunca vai ter nada disso.
Eles tiraram tudo que eu tinha. E me destruíram ao ponto de destruir outras pessoas.

São só lembranças crueis, apagadas com um vazio imenso que se criou dentro de mim. Eu respiro fundo e viro a garrafa na minha boca até sentir aquele amargor se consumir dentro de mim.

— Vou lembrar de retirar todo tipo de bebida desse lugar. - Heitor aparece de repente na varanda e retira a garrafa da minha mão com rispidez.

Eu tento pegar de volta com pouco esforço, mas já não tenho forças pra isso

— Que merda, vai se fuder. - eu bufo, já meio tonto

Ele joga a garrafa pra longe o suficiente, a ponto de escutar levemente ela quebrando no chão

— Eu não vou limpar isso. - digo

Ele me olha chateado

— Qual o seu problema, Christopher ?

Eu solto uma risada alta

— Cara, é melhor você sentar porque tenho uma lista enorme.

— Você tá bebado pra caralho. - ele tenta me puxar da cadeira, mas eu resisto

— O que é?! Eu não quero sair daqui, seu merda! - eu tento me desvencilhar dele, mas ele consegue me prender contra a parede

— Chega! Você precisa de um banho, comer alguma coisa e descansar. Você tá um lixo! - ele olha nos meus olhos, com genuína preocupação.

Christopher (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora