Fique preso em mim

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— Você não tem nada pra me dizer?

— O que quer eu diga? Que eu sinto muito? Porque eu não sinto. Na verdade, tudo isso é culpa sua. Se não fosse por você...eu teria matado eles e agora você não estaria revivendo tudo isso.

—Agora você quer que eu peça desculpa pra você ?! Ah me perdoe, Christopher, por ter impedido que você matasse eles! - ela grita e se levanta da cama.

—Afinal, por que você escondeu isso de mim? Como conseguiu falsificar aquele exame?- ela pergunta, intrigada

—Eu não podia deixar eles livres. Eu tentei achar eles por anos, mas...não consegui, obviamente. Eu nunca contaria isso pra você e se não fosse por esse seu tio, você nunca iria saber! Já que eu tinha falhado em um objetivo, eu tinha que pelo menos tirar proveito disso. Eu me infiltrei na polícia pra conseguir forjar a morte deles e te fazer sofrer outra vez. - sinto um amargo na boca quando digo isso.

Ela me olha, atenta.

—Era você...Ahgr! Chega, não vou ficar remoendo o passado. - ela parece falar isso pra si mesma. Quando percebe, volta sua atenção para mim.- Só que agora, as coisas mudaram, eu sei que eles estão vivos e você vai me ajudar a encontrá-los

Não acredito que ela quer fazer isso

—Eu? Por que eu faria isso? Mesmo se eu fizesse, seria pra terminar o meu serviço.

Ela aperta o meu tornozelo machucado e eu dou um gemido de dor

—Aiiii.... - eu encaro ela com raiva

—Esse é o seu plano?! Me manter preso aqui pra ceder as tuas vontades ? Você já foi mais esperta, Madeleine

—Pode ter certeza que eu continuo sendo, Christopher. Você vai me ajudar e isso não um pedido. - ela fala, com convicção na voz

—Você continua sendo uma idiota! Por que você acha que eles estão sumidos? Se eles quisessem que você os encontrasse, já teriam voltado. Eles viram uma chance de viver longe de você e olha só...estão muito satisfeitos com isso.

Eu tento reviver nossa relação. Apesar do tempo, não podia ser que ela mudasse da água para o vinho, eu precisava reativa-la

—Ah, meu querido, valeu a tentativa. Mas essas suas manipulações não funcionam mais comigo, só que isso você já sabe né? Ah, mas deixa eu te lembrar...você não tem mais nenhuma ligação comigo.

—Isso é o que você pensa.

—Isso é a sua realidade agora e como um bom menino, você tem que aceitar.

—Garota...- eu a ameaço

—Acho melhor descansar, garoto. - ela toca meu tornozelo, com um sorriso malicioso. Me causando dor.

—Aí! Caralho! - eu digo

Ela abre a porta para sair, mas eu não posso deixá-la ir

—Espera! - minha voz sai com um pouco de desespero, mas logo limpo a garganta, tentando parecer superior

Ela me olha, ainda segurando a porta

— O que ?

Eu respiro fundo

—Como você me achou naquela ponte?

Como um prolongamento da minha tortura, ela fecha a porta, sem hesitar.
Eu afundo a cabeça no travesseiro, encarando o teto...

O que mais me agoniava, era o fato de estar sob o controle dela. Não era pra ser assim. Eu não passei anos da minha vida fazendo o que fiz pra parar naquela cama, pra aceitar exigências daquela garota.

A garota que me surpreendia a cada vez que me encontrava com ela.
Eu sentia dentro de mim algo se acender.
Era ela novamente.

Fecho os olhos e seu rosto se projeta em mim
Não era esses os planos que eu tinha pra aquela garotinha naquele túmulo. Mas eu nunca imaginaria que ela se tornaria o que se tornou.

Eu não podia deixar que ela soubesse que não matei aqueles dois. Ninguém deveria saber que não consegui matá-los, que eu fui um inútil, que eu não consegui matar dois imbecis. Eu queria que ela sofresse, mais de uma vez, então fiz ela perder eles duas vezes. Naquela noite em Bosque livre e anos depois, quando deixei aquela pista falsa.

Pego o retrato dela que estava no criado mudo. Ela estava abraçada com seu pai, com sorriso tímido, mas doce.
Não sei que tipo de mulher ela era agora
E isso me deixava ansioso

Não sabia o que esperar dela

...

Madeleine

As ruas estavam muito movimentadas naquela madrugada.
Estou na janela do meu apartamento, observando a noite cobrindo o céu
Seguro uma xícara de chá quente, lembro de ouvir meu pai falar que isso acalmava os pensamentos
Que me faria dormir melhor

Mas eu estava abrigando Christopher no meu quarto. Dentro da minha casa.
Em que pensamento mais louco eu poderia imaginar isso?
Podia realmente parecer loucura
Mas era a minha maior chance de encontrar a minha mãe

Ele era um ótimo rastreador e com as informações que eu consegui, a gente ia encontrar ela...
A fala de Christopher me invade, consigo escutar aquela mente perturbada dizendo que eles não querem ser encontrados.

E se eu conseguir achar eles e...eu descobri que nunca deveria ter feito isso, que eu não devia ter ido atrás deles?

NÃO
não posso deixar ele me manipular

Eu nunca mais vou permitir isso

Eu vou achá-los e se depois disso eu descobrir algo que não gostaria, eu vou voltar pra minha vida. Vou seguir o meu rumo com a consciência limpa, de que eu realmente deixei meu passado pra trás...
Como posso fazer isso se eu trouxe o meu passado pra perto de mim?

Eu encaro a porta do meu quarto. Atrás dela estava ele. Não posso ignorar o que aconteceu, mas não posso deixar isso me atrapalhar.
Eu precisava focar no meu objetivo

Eu sabia que não ia ser fácil. Ele não é fácil. Mas eu também não sou.
Ele vai ceder, eu sei que vai

Ele está diferente. Sua aparência, seu modo de agir. Ele parece fraco, desestabilizado e vou usar isso ao meu favor. Eu duvido muito que ele esteja arrependido, a única coisa que ele quer é que essa dor passe, mas ela nunca vai passar se não reconhecer os próprios erros.

O chá aquece meu corpo, mas o sono não vem. Seria uma longa noite.

Christopher (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora