Christopher (Concluído)

Emboscada

Christopher

—Ai...ahgr. Mais que porra...?

Um caminho de sangue se forma pelo meu rosto. As gotas caem no teto do carro. Estava pendurado pelo cinto, demorou muito a tentar eu compreender o que tinha acontecido. Imediatamente eu procurei por Madeleine ao meu lado, mas eu não a vi. Um grande buraco no pára-brisa denunciava o que eu imaginava. Ela tinha sacado do carro enquanto capotávamos

Com muita dificuldade eu me soltei do cinto. Um zumbido infernal soava nos meus ouvidos, eu caí por cima dos estilhaços de vidro e me arrastei até o buraco do pára-brisa. A noite fria e úmida daquela floresta me lembrava de Bosque Livre.
Não importava pra onde nós fôssemos, sempre retornávamos a isso

Limpo o sangue do meu rosto. Cadê você, Madeleine?

Eu avisto a estrada vazia e vou até ela. O tempo caminhava devagar, aquele aperto no peito, aquela falta de ar, não passaria até que eu sentisse a sua respiração novamente

Mas algo dentro de mim continuava estranho. As árvores se entrelaçavam numa dança incessante. O zumbido ficava cada vez maior e eu não conseguia me manter em pé. Quando finalmente a estrada, avistei um animal caído na estrada

Lentamente, enquanto em aproximava, podia notar do que se tratava e aquilo me encheu de pavor.
Um lobo cinzento.

...

—Você sabe como são os lobos?- eu perguntei a Josh, que brincava no balanço

—Não.- ele responde, distraído

—Eles são animais ferozes, mas que sempre andam juntos entre si. Se um deles precisa de ajuda...o outro ajuda, o outro sempre vai estar lá por ele.

—Então nós somos lobos?- ele pergunta, agora interessado no que eu dizia

—Nós somos sua matilha e você é a nossa. Sempre cuidaremos você.- eu olho para Christian, que acenou para Josh

—E se um lobo viver sozinho?

—Um lobo só é solitário porque ele tentou ajudar os seus. - eu o respondi, tristonho

—Viver sozinho deve ser triste.

—É...mas a gente não. Nós sempre teremos uns aos outros. Pra sempre. - eu digo, sorrindo

...

Caralho

Eu devia estar muito chapado, não podia ser um lobo. Ali não era lugar de lobos, eu não podia ter atropelado um lobo. Aquilo só podia ser muita ironia do destino.

Eu fiquei tão imerso nas minhas próprias lembranças que não pude notar a presença de outra pessoa por ali.Uma luz é apontada para o meu rosto e eu levanto a mão em frente a luz

—O que é isso?- perguntei, sem enxergar nada

O homem abaixa a lanterna que morava em meu rosto e eu consigo ver ele com clareza

—Dizem que vaso ruim não quebra. Acho que é verdade, mas vamos ver até onde você consegue sobreviver.- diz o homem, em tom de ameaça

Eu reconhecia ele, sim. De muito longe. Em alguma festa de aniversário, talvez? Não me recordava, mas sabia quem ele era pelo simples fato de ser idêntico ao Alex.

Ah, Alex
Você merecia um destino melhor
Mas todo mundo tinha que morrer e você estava entre eles

—Você deve ser o Fernando. - eu falo, meio zonzo

Ele sorri, com deboche

—Por que? Por que os meus filhos?! - ele grita, já perdendo o controle que tinha antes
Sacando uma arma em minha o direção

Instintivamente eu levanto os braços, mas estou muito confuso pra entender aquilo

—Eu...não sei, so tinha que matar

As lágrimas no rosto dele começaram a fluir. Sua mão tremia, tanto pela idade quanto pelo desespero, eu entendia aquela dor. Entendia porque ele queria me matar.

—Você não devia ter feito isso. - eu escuto aquelas palavras como as últimas da minha vida.

O disparo iluminou a estrada escura e o mundo girou até que o céu estrelado era a minha única visão

...

—Chris? Chris, acorda! ACORDA! Não, não morre, acorda! Por favor...- Heitor balançava o corpo inerte de Christopher. Ele o apertava, na ilusão de que conseguisse acorda-ló

Pra ele não podia acabar daquele jeito. Ele não podia perdê-lo quando finalmente conseguiu alcançá-lo

—A dor é grande, não é ? Mas eu vou fazer um favor pra você, vou fazer isso parar. - Fernando se aproxima de Heitor, que está com o corpo de Christopher nos braços.

Heitor o encara com fúria nos olhos.

—Ninguém machuca um dos meus. Guarda essas palavras.

Fernando ri e dá de ombros

—Acho que agora essas palavras não importam mais. Porém, se quiser, eu deixo você por último. Vamos começar...pela minha sobrinha, acho que ela vai adorar que eu acabe com a vidinha de merda dela. - ele ameaça entrar na mata atrás de Madeleine

—Por que?! Você só queria se vingar dele! Não precisa machucar ela.- Heitor tenta ganhar tempo.

Ele devia ter quebrado alguma coisa, pois se sentia uma dor absurda no seu peito. Tinha acordado preso no carro, sem Christopher e Madeleine.
Adam e Bella estavam desacordados quando ele escutou o disparo e saiu o mais depressa que podia.

Ele não estava em condições de lutar
Mas tinha que lutar
O que mais doía era deixar Christopher sozinho

—Ela cobriu esse assassino. Não sei por que, mas ela é cúmplice de tudo. Como que só ela sobreviveu? Me diz? Por que ela era conivente com todas aquelas mortes! Você, aqueles outros dois, todos vocês tem que morrer. Alguém tem que pagar pela dor que eu senti.

—Não. Não vai haver mais mortes. - diz ela, com toda convicção

Madeleine aparece entre as árvores, mancando. Ela encara o tio, que agora aponta a arma contra ela.

—Por que quis isso ? Nós éramos sua família.

—Vocês continuam sendo. Eu nunca quis isso, eles morreram pela mesma razão que você está tendo agora. Vingança. Ninguém nunca vai reparar a falta que eles fazem, nem a minha morte ou do...- ela finalmente nota Christopher caído, junto a Heitor

Ela engole em seco

—Ele ainda tá respirando?! - ela ameaça ir até ele, mas Fernando atira acima do seu ombro e o zumbido do disparo deixa Madeleine surda.

Ela cai no chão, desorientada. O céu acima dela, as árvores ao redor, a recordava daquela noite em que quase morreu. Ela virou o rosto e viu Christopher na sua direção. Heitor gritava em sua direção, mas ela não conseguia escuta-lo.

No final das contas. Não existia um final menos trágico do que esse.
Foi apenas um adiamento do que estava destinado a acontecer , ela pensou

Uma luz forte clareou toda a estrada. Dois faróis.
Talvez não fosse um final.