Capítulo 7

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Enfiei o que restou do cadarço da minha chuteira para dentro dela tendo a garantia de que não iria tropeçar nos fios de pano.

O início da noite estava dando espaço para um céu estrelado e também para o vento frio que balançou meus cabelos presos em um rabo de cavalo firme, respirei fundo pensando na possibilidade de não querer mesmo sair de casa, ninguém pode me obrigar a fazer algo que eu não quero.

Mas ao mesmo tempo eu não poderia deixar todo mundo acreditar que eu sou uma perdedora, até porque eu vou voltar para a equipe antes do início das regionais ou eles não vão passar da primeira fase, eu sou realmente muito boa no que eu faço. Quando eu digo que posso nadar 400 metros ou conseguir uma vantagem significativa em uma bateria de revezamento eu posso fazer.

Eu consigo ser melhor, consigo sempre melhorar, eu consigo ser extremamente necessária naquela equipe mesmo que agora as pessoas, a treinadora, não tenham total consciência disso.

Eu faço a diferença.

Eu sou a diferença.

Com esse pensamento, com o único apoio que eu preciso, eu mesma, deixei o meu apartamento e desci as escadas confiante de que não devo me esconder após uma derrota. Eu sou uma campeã, se a equipe de natação da universidade não consegue enxergar isso talvez devam me ver com o outro por outra equipe. 

— Até que enfim — Por alguns minutos já havia me esquecido de que teria como companhia o meu vizinho que não me recordo do nome.

É estranho ouvir a pessoa transar o tempo todo e sequer saber qual o seu nome.

— Eu não entro em carro com estranhos, acho melhor pegar um Uber.

— Isso não faz sentido.

Refleti e apertei os lábios para não rir pela minha gafe.

— Pensando melhor não mesmo, mas eu sei que motoristas de aplicativos tem nomes e habilitação.

Ele encostado no carro vermelho que não consigo identificar o modelo mexeu nos cabelos crespos bem definidos diferente da última vez que me lembro de notá-los, sua mão atravessou por cima dos cachos soltos e parou sobre sua nuca.

— Você sabe o meu nome e nem todo mundo que diz ter habilitação de fato tem habilitação.

Eu sei é?

— Espera, você não sabe o meu nome?

— Você se mudou e a gente não foi apresentado, é normal que eu não saiba o seu nome.

— Eu moro aqui há três meses, a gente pega o mesmo elevador, estuda na mesma faculdade, tem amigos em comum e você não sabe o meu nome?

Fiz uma careta confusa.

— Eu não tinha consciência de nenhuma dessas informações até você dizer agora, pra mim você se mudou na semana passada e canta no chuveiro de forma escandalosa.

Além de tremer as paredes do prédio como um férrico, treme as montanhas.

Não me pergunte como eu sei disso, Lali ama livros de fantasia e ama me mandar fotos das páginas que ela sente qualquer mínimo sentimento.

Devo deixar claro que ela é muito sentimental.

— Eu estou terrivelmente ofendido.

Ele lê muitos romances, deve ser daí que vem todo esse drama.

— Dizem que você é gringo deve ser algo como Alex ou Jordan, talvez você se chame Ezra — Eu não queria ser indelicada, mas confesso ter sido pega de surpresa.

Por mais que eu force a minha memória não consigo me lembrar do nome, eu preciso procurar um especialista, primeiro o alfabeto e agora isso.

— Ramon — O encarei sem entender enquanto o via dar a volta em seu carro — Seu vizinho se chama Ramon Lopes e agradece pela sinceridade.

— Não foi nada — Eu disse com um sorriso falso no rosto enquanto ele se esticou para abrir a porta do passageiro por dentro.

— É melhor colocar o cinto — Me orientou e enquanto eu fazia isso pude ver um pequeno sorriso no canto de seus lábios quando ele acelerou o veículo.

Nos minutos seguintes eu acreditei que iria morrer, a pergunta não parou de correr por minha mente por um segundo sequer é: como alguém pode dirigir em alta velocidade em um lugar onde o trânsito está sempre parado?

A resposta? Ramon Lopes é louco.

Quando o carro parou eu desci rápido sentindo minhas pernas tremerem levemente, o bar estava lotado e no campo logo atrás já era possível ver pessoas conversando.

— Ah, e Julie — Ramon chamou a minha atenção antes que eu me distanciasse muito.

— O que?

Perguntei me virando a tempo de ver um sorriso no seu rosto, apoiado na porta do seu carro, Ramon me olhava com atenção.

— Ouviu uivos ontem a noite?

Meu rosto ardeu em vergonha e minhas mãos soaram, tentei agir normalmente negando com a cabeça.

— Não ouvi nada ontem a noite.

Ele abaixou a cabeça rindo consigo mesmo.

Virei um pouco o rosto para o lado tentando não o encarar com atenção, mas senti quando seus olhos voltaram ao meu rosto.

— Deve ter sido apenas uma impressão minha.

— Muito provável — falei — Tem bastante animal na redondeza, parece que cada vez mais parto.

Foi a última coisa que falei antes de voltar a fazer o meu caminho, apertei minhas mãos sobre meu rosto na intenção de esfriar um pouco a minha pele quente em um ato de nervosismo. Será que ele percebeu que fui eu?

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