Capítulo 27

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Provavelmente passei o restante da noite em claro, pensando na possibilidade de ter gemido em alto e claro som para incomodar meu vizinho que tem uma rede e não um seila o que poderia causar tudo aquilo.

O andar estava tão silencioso que do primeiro ao sétimo andar poderia ser possível ouvir meus pensamentos, isso claro se houvesse um sétimo andar.

Mas o que importa é que a minha cabeça mais que qualquer coisa estava muito barulhenta.

Saí para correr assim que o dia clareou, o som do apartamento ao lado já estava alto, tão alto quanto o tom de voz do garoto que parecia estar no chuveiro.

Quando sai do meu banho pude ouvir o garoto gritar com alguém pela janela, por impulso me ajoelhei em minha cama também olhando para baixo para ver o que estava acontecendo, o som estava tão alto que eu nunca ouviria o carro do pão se não fosse por Ramon gritando para ele esperar.

Juntei sobre meu balcão todos os ingredientes precisos para o meu suco verde diário e até cantei um pouco a música que tocava no apartamento ao lado, acho que dias em que o Breno joga fica sempre mais tranquilo, principalmente quando o horário dos jogos combinam com o meu horário livre.

Sendo assim poderei ficar em casa durante toda a manhã evitando me envergonhar ainda mais.

Porque, meu Deus, que vergonha.

Liguei o liquidificador enquanto tirava um copo gelado do freezer, procurei um canudo entre as gavetas do meu armário, porém parecia impossível encontrar um mesmo tendo total consciência de que havia guardado todos eles.

Voltei reabrindo todas após fechar a última, não é possível que meus canudos tenham saído do lugar que eu deixei, o lugar? Qualquer uma dessas gavetas.

Na terceira rodada, quando abri a segunda gaveta pela terceira vez, estavam todos eles ali, jogados na mesma divisória de onde eu coloquei, como se estivessem ficado o tempo todo ali.

Desliguei o aparelho elétrico e despejei o líquido sobre o grande copo, após tampar e colocar o canudo tomei um longo gole sentindo meu corpo se revigorar.

Coloquei o copo sobre minha estante de troféus antes de pegar a bola que ficou aqui no dia em que nos reunimos para fazer cartazes, coloquei a bola no chão e para treinar coloquei dois chinelos um ao lado do outro só que distantes.

Aquelas eram as traves do gol, a rede era a parede.

Apoiei minhas mãos entre minhas coxas e joelhos, respirei fundo visualizando um gol à minha frente.

Fechei os olhos imaginando os movimentos que uma goleira poderia fazer, mais especificamente, Letícia, a até então goleira do meu time do coração.

Observei o seu rosto com clareza, ela me mandou aquele olhar "eu sei o que você vai fazer". Ela sempre sabe. A encarei de volta, eu também sabia.

Com tranquilidade que carrega o artilheiro do Flamengo eu fiz um único movimento, batendo o meu pé na bola e por um segundo sorri, no segundo quis chorar.

Meu mundo girou e eu quase caí de desespero quando a bola atravessou aquela fina parede, me senti em um mundo totalmente louco, eu devo estar louca! 

Chutar na parede mais fina dessa cidade, foi burrice, uma burrice que eu já era consciente e apenas me lembrei quando já havia feito.

Andei até o grande buraco em passos duvidosos.

Talvez por ironia do destino meu rosto tenha chegado até lá no mesmo momento que meu vizinho.

— Belo dia pra futebol? Não é?— Tentei soar irônica e não desesperada.

— Tem noção do que fez?— Ele pareceu zangado.

— Nós dois já estávamos conscientes que isso poderia acontecer a qualquer momento.

— Para de se justificar por esse buraco, que coisa infantil — Ele disse sumindo dali. 

Quase falei um "alô" para chamar de volta a sua atenção enquanto tentava bolar uma desculpa.

Entretanto não tive tempo para isso já que ele bateu na minha porta em seguida.

Por que eu faço tudo errado? Só queria ficar quietinha e assistir o jogo que vai começar daqui a pouco. 

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