Um dia no campo

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Depois de mais de duas horas na estrada, ambos finalmente chegaram em Chōsei. O pequeno município, considerado uma vila, não tinha mais de 15.000 habitantes, e era um lugar bem tranquilo de se viver. Shoto nem se lembrava quando foi a última vez que havia ido para lá, mas estava feliz em poder voltar para ver seu avô e sua mãe de novo. Além do mais, precisava passar um tempo com sua família para depois da rotina estressante que estava levando.
Seu avô morava em uma fazenda na região. Não havia muita variedade de animais, tendo apenas vacas e galinhas. Mas o destaque da fazenda era suas plantações de morango. A melhor coisa de lá, claro, depois de poder ver sua família, era comer morango de graça.
— Que bom que vieram! — Shoto avistou seu avô e sua mãe se aproximando. O jovem sorriu em poder vê-los depois de tanto tempo longe. — Como foi a viagem?
— Foi tranquila. — Shoto respondeu.
— Não pegamos muito trânsito. Ainda bem! — Inasa completou.
— Vocês devem estar com fome. Pro almoço temos arroz com curry e camarão frito. Sua mãe que me ajudou a fazer! — Rey sorriu pelo pai a parabenizando.
Shoto se sentia feliz em saber que a mãe já conseguia realizar as atividades do dia a dia. O progresso em sua melhora era aliviante.
O almoço estava divino. Shoto sentia falta de uma boa comida, já que ele mesmo não cozinhava tão bem quanto seu avô e sua mãe. Depois de comerem, Inasa se voluntariou para ajudar na limpeza da cozinha. Enquanto isso, Shoto e sua mãe caminhavam pelas belas plantações, a fim de colocar a conversa em dia. Sentiam falta desse momento entre mãe e filho.
— Eu fiquei muito feliz quando soube que vinha! Mas espero que isso não tenha atrapalhado sua rotina.
— Não atrapalhou. Eu não tinha obrigações nesse final de semana, e o Inasa se dispôs para me trazer.
— Ele é um bom rapaz. Que bom que se reaproximaram. Ele parece gostar muito de você pra dirigir por duas horas até aqui. — Ela riu pela gentileza de Inasa. Shoto corou com a alegação da mãe, mas não contestou. — Mas eu fico feliz que esteja se enturmando de novo. Não é bom ficar se isolando.
— Só não queria que as pessoas me estranhassem. — Ele falou, se referindo aos seus poderes.
— Não acho que o Inasa estranharia você. — Shoto sorriu, concordando com a mãe. — Tem acontecido algo com você? Tipo sonhos, ou algo assim?
— É… sonhos, algo assim. — Ele não quis se aprofundar muito.
— Eu tenho sonhado muito com você ultimamente. — Ela parecia preocupada. — Tenho a sensação de que algo ruim queira te corromper. — Shoto a olhou, confuso.
— Algo ruim? — Ele perguntou.
— Eu também não sei. Só te peço que tome cuidado, e que você se cerque de pessoas boas, e que se preocupem com você. Não fique sozinho!
— Eu não vou estar sozinho, não se preocupe. — Ele segurou na mão de sua mãe, assegurando de que estaria a salvo do que quer que seja.
Ela assentiu, confiando na palavra de seu filho. Eles continuaram a caminhada enquanto conversavam. Ao voltarem para perto da casa, Shoto avistou Inasa perto de uma das vacas com um balde. Ele parecia querer tirar leite dela, mas a vaca corria dele. O bicolor riu daquela cena, dizendo para a mãe que iria ajudar o amigo. Ele foi até Inasa, o vendo frustrado com o balde na mão.
— Tudo bem aí? — Shoto se segurava para não rir na frente dele.
— Acho que os animais não gostam de mim. — Ele riu, sem graça.
— É melhor ordenhar ela enquanto ela tá comendo. Assim ela não corre de você. — Shoto pegou um punhado de feno para dar de comer à vaca.
Ela voltou correndo ao ver todo aquele feno. Assim como Shoto havia dito, ela estava quieta, concentrada apenas em comer. Ele então colocou o balde debaixo da vaca para que Inasa pudesse ordenhá-la.
— É só puxar? — Ele se referia às tetas da vaca. Shoto confirmou, e então ele começou. Estava todo feliz em tirar leite da vaca pela primeira vez. — Que legal! — Ele disse ao finalmente conseguir.
— Você parece estar se divertindo no fim das contas. — Shoto sorriu ao vê-lo feliz.
— Eu disse que gostava de fazenda. Gosto de lugares tranquilos e com animais.
— Ela também gostou de você! — Shoto se referia à vaca, que até agora estava bem quietinha comendo.
— Não tive a mesma sorte com as galinhas. — Ele riu se lembrando das galinhas correndo atrás dele. — Eu disse que os animais não gostam de mim. Sou um homem da cidade tentando ser do campo.
— Você aprende a conquistar eles. É só subornar eles com comida.
Ambos riram da fala de Shoto. Eles olharam um para o outro enquanto cessaram as risadas. Eles agora sorriam, desviando os olhares novamente. Depois de alguns segundos de silêncio, Inasa o encarou novamente.
— Sabe Shoto… — Ele chamou a atenção do outro. — Foi bom você ter vindo pra cá. Você parece mais feliz, mais descontraído.
— Ah é? — Ele perguntou, não notando sua própria mudança de comportamento.
— Sim. Antes você parecia preocupado com alguma coisa a todo momento. — E de fato ele estava. — Conciliar trabalho com faculdade não é fácil, né?
— Não é mesmo. — Concordou, apesar de não ser esse o problema. — Mas eu tô feliz de ter vindo. Obrigado por ter me convencido. E obrigado pela carona também.
— Que isso! Eu faço qualquer coisa por você. — Inasa falou sem pensar, ficando sem jeito logo depois. Shoto sorriu, lisonjeado e envergonhado. — Acho que já tá bom de leite, não é? — Ele falou logo depois para quebrar o clima.
— Tá sim. — Shoto respondeu vendo mais da metade do balde cheio.
— Acho que peguei até um pouco mais do que seu avô pediu.
— Por falar nele, onde ele tá? — Ele perguntou sobre o avô.
— Ele foi no galinheiro pegar alguns ovos. Ele disse que vai fazer bolo de morango pra gente.
Shoto sorriu com a notícia. Adorava um bolo caseiro, ainda mais sendo feito por seu avô. Depois de pegar os ovos e o leite, era hora de colher os morangos. Os quatro pegaram algumas cestas e foram colher as frutas. Shoto mais os comia do que colocava na cesta, fazendo sua cesta ser a mais vazia. Inasa parecia maravilhado no meio daquela plantação, e estava muito animado em poder pegar os morangos direto da terra. Ambos se animaram quando o avô de Shoto falou que eles poderiam levar alguns quando fossem embora.
Depois de ajudarem a preparar o bolo, eles se sentaram à mesa para comer enquanto bebiam um pouco de chá. Nem viram o tempo passar, e logo o relógio já marcava mais de sete horas da noite. A estrada estaria escura a esse horário, e a viagem de volta seria longa. Por isso, tiveram que dormir por lá mesmo.
Já no dia seguinte, no domingo após o almoço, os dois colocavam as cestas com morangos no carro para levarem. A viagem de volta foi tranquila. Eles conversaram sobre o que mais gostaram na fazenda, onde Inasa contava sobre sua experiência frustrada com as galinhas. Eles riram, e comeram metade dos morangos na viagem.
Ao chegarem em Kuroimachi, já eram mais de quatro horas da tarde. Inasa parou em frente à casa de Shoto antes de voltar para a sua.
— Prontinho! São e salvo na sua casa. O que achou da viagem?
— Eu gostei. Mais uma vez, obrigado por ter me levado. Fazia tempo que eu não visitava a minha mãe. Eu precisava disso.
— Eu fico feliz em ajudar. — Ele fala, colocando sua mão no ombro de Shoto. — Você comeu quase todos os morangos da sua cesta. — Inasa ri ao ver que restaram poucos morangos na cesta do outro. — Pode pegar alguns da minha.
— Não precisa. Você não comeu quase nenhum.
— Eu comi muitos ontem. E você ama morangos, então tudo bem. — Ele insistiu.
Inasa colocou alguns dos morangos da sua cesta na de Shoto. Ambas as cestas estavam no colo um do outro, por isso estavam bem perto. Shoto desviou seu olhar para Inasa, o vendo contar os morangos para dividirem entre eles. Ele sorriu, vendo que Inasa parecia concentrado só pra contar as frutas.
— Não precisa tirar tanto da sua cesta. — Shoto falou, o encarando.
— Tá tudo bem, Shoto. — Inasa falou, o encarando de volta.
Os dois olhavam fundo nos olhos um do outro. A distância entre ambos era mínima, dando pra sentir a respiração um do outro bem próxima. Shoto abaixou seu olhar para a boca do outro. E se deixando levar pelo coração, ele se aproximou de Inasa, unindo seus lábios nos dele. Não demorou para seu lado racional retomar o controle, e logo ele se afastou, envergonhado pelo que fez, e com medo da reação que o outro teria.
— M-me desculpe! Eu… eu nem sei porque fiz isso…
Shoto então sentiu a mão dele em seu rosto. Inasa sorriu, e se aproximou dele, retomando o beijo. Dessa vez um beijo mais profundo, porém calmo. Shoto apenas fechou os olhos, e se deixou levar. Ele levou sua mão até a nuca de Inasa, o beijando de volta. Estavam tão dispersos da realidade que quase deixaram os morangos caírem da cesta. Eles interromperam o beijo para impedir que as frutas se esparramassem no chão do carro. Eles se olharam novamente, sorrindo.
— Te vejo amanhã? — Shoto retirou o cinto de segurança.
— Claro. Até amanhã! — Inasa respondeu com um sorriso de orelha a orelha.
Shoto saiu do carro, fechando a porta e acenando para ele. Ao entrar em sua casa, ele olha para a cesta de morangos em sua mão, sorrindo.

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