Salve-se, Coração!

Capítulo 15: Elas

Alexia Máximo.

Se passaram dois meses desde que larguei tudo pra assumir uma vida da qual eu não reconhecia nada.
Nesse meio tempo, mais uma garota foi testemunha de um crime da quadrilha da minha prima e se torno uma grande amiga minha e da Kyra.
Nós estávamos sob os cuidados de uma senhora chamada Dona Ermê, junto com um dos seus netos, José, que me lembrava algumas coisas o Beto na aparência, mas em personalidade eram completos opostos. Eles tinham Velásquez no nome, mas pensei que seria muita coincidência eles serem parentes do meu "ex"-namorado.

Apesar de eu ter liberado ele pra viver a vida antes de largar tudo e me proteger, pensar que ele poderia estar feliz e bem cuidado com outra mulher que não fosse eu me cortava por dentro. Imaginei as coisas que ele poderia estar fazendo comigo, os planos que poderíamos estar fazendo, talvez, dividindo um lindo apartamento no Rio de Janeiro e descobrindo os prazeres de ser um casal na sua melhor fase.
Olhando as estrelas no céu, senti um toque quente nas minhas costas, me fazendo virar de imediato e encontrar Luna Furtado — a que chegou depois, uma grande amiga minha — com um olhar solidário. Na maioria do tempo, eu esquecia que estava nessa situação. Mas, tinham dias — no caso, essa noite — que eu simplesmente não conseguir ignorar tudo o que havia acontecido, o que estava por acontecer e o que tinha chance de ocorrer.
A morena sorriu.

— Tá namorando essa lua, Alexia? — Pergunto ela num tom brincalhão.

Sorri e ergui o olhar pra aquela imensa bola prateada entre as estrelas.

— Pra compensar o fato de não estar com o meu namorado — respondi, respirando fundo e soltando o ar com peso — nunca amei ninguém com tanta intensidade antes, nunca tinha dado sorte no amor com ninguém... Isso é demais pra mim.

Luna também olhou para a lua, me acompanhando nesse momento pensativo e um pouco doloroso.
Apesar de Kyra ser uma amigona, a mexicaninha tinha as melhores palavras pra uma pessoa com o coração partido.

— Sabe, uma coisa que eu sempre digo é que se é pra ser, vai ser. O jeito que você fala é como se fossem almas gêmeas, né? Tudo era tão recente e se tornou tão intenso tão rápido, tão bonito. Praticamente uma novela — ela adorava novelas, a referência me fez rir brevemente —, se o autor escreveu essa trama direito, pode ter certeza que vocês vão ser felizes pra sempre.

— A gente ainda vai ter muita coisa pra viver, com certeza, ele vai esperar por mim — falei, com o olhos marejando, mostrando a emoção iminente e provavelmente a crise que eu teria.

Teria. Luna percebeu minha emoção crescendo e fez questão de mudar o assunto, nos fazendo conversar amenidades até que Dona Ermê e Zezinho no chamassem pra jantar.

Constância R. Di Marino.

Cheguei no meu apartamento já era noite, porque além de passear no Ibirapuera com o Beto, ainda tive que fazer algumas reuniões a respeito da filial da Cantina, apesar de não ter conseguido prestar atenção em 1% das palavras da equipe, porque todos os meus pensamentos me levavam à Roberto Velásquez, mesmo que eu não quisesse. Todas as palavras dele sobre o mal que eu havia feito a ele, as esperanças, como ele tinha passado todos esses anos e como Alexia havia sido o melhor pra ele... Não haviam batido bem em mim, na verdade, parecia mais um caminhão me arrebentando inteira.
O que tínhamos parecia muito palpável, muito predestinado. Pode parecer egoísta, mas pensei que só eu pudesse ser o amor da vida dele daquele jeito. Beto Velásquez completamente cego por uma mulher que sumiu há meses parecia um cenário totalmente novo pra mim, e até improvável.
O fato de passar tempo com ele e tentar fazê-lo esquecer de todos os problemas acabou me trazendo mais problemas.

Andei em direção a enorme janela da minha cobertura, que ia do chão ao teto e dava uma visão espetacular de São Paulo, lembrando do dia que Beto me levou ao topo de um prédio pra conhecer a cidade inteira.
Lembro da sensação de frio na barriga, de se sentir a dona do mundo, o arrepio ao ver a imensidão do lugar e aquela selva de pedra infinita. Sorri nostálgica.
Eu realmente desvalorizei toda e qualquer redenção dele, me submetendo a um casamento fadado ao fracasso. Não poderia me odiar menos.
Passei as mãos pelos cabelos e respirei fundo, várias ideias se passando na minha cabeça.

Aceitar a derrota, me afastar.
Aceitar a derrota e me contentar com a amizade dele.
Não aceitar, mas evitar problemas.
Não aceitar e ter uma última tentativa.

Talvez, a última ideia fosse a mais inconsequente, porém, era melhor sofrer com o arrependimento do que apodrecer na dúvida.
Assim como Beto esteve perdidamente apaixonado por mim um dia, agora eu me encontrava no mesmo estado obsessivo e faria de tudo — dentro das legalidades, óbvio — pra tentar tê-lo.
As chances da tal de Alexia voltar viva eram minúsculas, a polícia sequer tinha vestígio de sua estadia. Aliás, essa história era muito confusa.
Enfim! Precisava criar um plano.

Mantive meus olhos nas luzes da cidade, aquilo foi uma forma de reacender as minhas ideias, afinal, não poderia ser mais óbvio.
Iríamos reviver tudo novamente, com o meu toque especial. Dificilmente Beto recusaria.
Respirei fundo, com o tanto de sugestões que acabei me dando e sentei no sofá, pegando o celular.
Antes de tudo, ele deveria ficar estável desses seus vícios de trabalho e ansiedades. Tive uma ideia, iria convidar ele pra uma sessão de ioga no parque. Não era o tratamento mais eficaz, mas algumas semanas atrás o Henrique me implorou pra tirar Velásquez da empresa e eu faria isso.

Beto, tá afim de sair amanhã?

De novo, Tancinha?
Eu trabalho, esqueceu? Rsrs

Eu sei, seu bobo. Kkkk
Mas, o Henrique aprovou que você escapasse.
Ioga amanhã no parque, que tal?

Tancinha, eu mal sei ficar de uma perna só.

Você vai gostar, depois tem uma surpresa.

Olha lá, hein.
Que horas?

Dez horas da manhã, eu te busco.
Roupas leves, mas leva uma bonitinha na roupa pra surpresa depois.
Boa noite, Beto. 💖

Boa noite, Tanci. Mais uma vez, obrigado por cuidar de mim sem eu merecer.

Mal sabia Beto que eu achava que ele merecia isso e muito mais.