Clube dos tradicionais

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Naquele dia, os intercambistas estavam distribuídos da seguinte forma: uma porção ocupava os assentos do saguão para aguardar o próximo ônibus e outra, muito menor, espalhava-se pelo ambiente como criaturas inquietas. Os rapazes que conhecia estavam, obviamente, atentando contra a boa paciência e paz de espírito dos demais na segunda porção.

Tanto tempo sem conversar com Sicheng fez com que ela sentisse como se uma parte de si estivesse fora de alcance. Ainda não havia encontrado uma brecha para falar sobre aquele assunto com o rapaz, ou, na verdade, só estava adiando por medo de que ele descobrisse o que ocultava há dias. Nunca foi muito boa em esconder segredos do melhor amigo e, considerando que o que tinha a dizer não seria bem recebido por ele, Tzuyu tinha certeza de que sua amizade estava prestes a entrar em colapso. 

Contudo, o que realmente a pertubava no momento era a proximidade entre a mulher por quem estava inexoravelmente apaixonada e Lalisa Manoban. Se alguém a perguntasse o que achava de uma cena de ciúmes dessa, Tzuyu diria que é uma tremenda bobagem se incomodar com uma relação que não lhe diz respeito, mas como sua cabeça estava intoxicada por emoções, concordar com o próprio posicionamento foi um pouco mais difícil que imaginara.

Quer dizer, era mesmo necessário toda aquela aproximação? Julgou impossível não bufar quando Lalisa tinha o braço em volta dos ombros de Sana e destinava toda sua atenção para a japonesa enquanto a recepcionista atendia ao pedido da tailandesa. As duas tinham se dado bem desde os primeiros dias, principalmente quando Sicheng carregava Mina e BamBam em seus passeios malucos, deixando Lalisa na companhia de Sana. Sabia que a sensação de perigo poderia ser um fruto envenenado de seu ciúme, mas preferia se manter alerta a relaxar na possibilidade da Manoban se mostrar uma verdadeira ameaça.

Manteve os braços cruzados enquanto torcia para que a funcionária resolvesse logo o que foi solicitado, bufando uma dúzia de vezes mais.

- Jesus, se continuar olhando desse jeito vai matar a mulher. - ali perto, Nayeon, que está estirada no sofá, reclama com um olhar de reprovação para a taiwanesa.

Se havia incomodado a coreana, então a expressão que carregava no rosto deveria mesmo ser perceptível. Desde que começara a se envolver com Sana, sua honestidade se convertera numa transparência absurda. Para não falar na impulsividade desconhecida, havia esse pequeno detalhe também. Questionava-se vez ou outra se tais mudanças a faziam uma pessoa melhor, como a boa educação de casa a instruíra a fazer, e concluiu que sim, possivelmente sim. Foram suas atitudes divergentes da personalidade reservada e cautelosa que a levaram até ali, e não poderia estar mais satisfeita.

Bufou outra vez quando Im Nayeon se levantou para atrapalhar seu campo de visão. Precisou de algum esforço para não dar um passo para o lado a fim de restaurar sua vista anterior sabendo que, se assim o fizesse, a coreana iniciaria uma brincadeira nada divertida, seguindo-a como uma sombra. As infantilidades não eram tão bem recebidas quando outra pessoa que ocupava o lugar de Sana. 

- Você está na minha frente. - diz o óbvio, a tentativa mais pacífica que encontrou para que Nayeon se movesse, o que não aconteceu, é claro.

- Sim, e você está se mordendo de ciúmes. - rebate - Elas estão fazendo nada demais, Tzuyu, deixe a insegurança de lado.

- Ficaria de bom humor se alguém segurasse Jeongyeon daquela maneira? - questiona,  na defensiva, ainda que procurasse em seu íntimo um argumento forte o suficiente para interromper o ciclo vicioso que alimentava o sentimento.

- Oh, não, a cabeça dela já estaria numa bandeja.

Tzuyu franze o cenho, confusa com a resposta. Nayeon, por sua vez, pareceu se importar muito pouco com a quebra de coerência em seu discurso.

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