Notas: Oiii pessoal! Link da playlist da fic, porque todo mundo vai sofrer comigo, sim: https://open.spotify.com/playlist/6RN8a9aEZ67AEzffxKUsv3?si=tmyjoxXxSGiKH5Y9ZBnLfQ&dl_branch=1&nd=1
PARTE I - TORNA A CASA
"Che mi è rimasto un foglio in mano e mezza sigaretta
Corriamo via da chi c'ha troppa sete di vendetta
Da questa Terra ferma perché ormai la sento stretta
Ieri ero quiete perché oggi sarò la tempesta". (Torna a casa, Maneskin)São Paulo, 12 de janeiro de 1993.
A casa de Rodrigo Furtado fica dentro de um condomínio fechado. Estar de volta a São Paulo faz Liliana se lembrar da infância, embora um condomínio pareça um mundo à parte. Ela está dentro da capital, mas as ruas estão vazias e há árvores espalhadas pela vizinhança. As casas são variações de fachadas brancas com janelas de vidro, e Liliana pensa que aquele se parece muito com o lugar onde sua avó mora. Todas as mansões de ricos se parecem.
Rodrigo tem um jardim bem cuidado. Liliana estaciona próximo à calçada, seca as mãos na calça jeans e sai do carro. Ela se pergunta se ele cuida pessoalmente das plantas, ou se paga alguém para que deixe a fachada tão bonita. O caminho de pedras lisas que leva à porta é rodeado de arbustos, e há azaleias vermelhas em toda sua extensão. Para Liliana, é um alívio desviar a atenção. Ela sente o coração palpitar, e o peito parece estar coberto por algo que impede sua expansão.
Ela tem duas opções: apertar a campainha ou voltar para o carro. A segunda nunca lhe pareceu tão tentadora, mas Liliana já tinha dirigido sete horas para chegar ali, e não queria chegar em casa e contar para o marido que tinha desistido. Passaram noites em claro falando sobre as lacunas na história dela, juntando peças que nunca se encaixaram. Ela queria saber a verdade.
Rodrigo abre a porta alguns segundos depois de Liliana tocar a campainha. É uma versão idosa da memória que ela tinha dele na televisão, os cabelos grisalhos e as rugas ao redor dos olhos indicando que a idade tinha chegado. Liliana estende a mão.
- Liliana - apresenta-se, embora ele saiba exatamente quem ela é.
Ela assiste Rodrigo hesitar. Talvez ele também queira sair correndo. Aperta sua mão depois de alguns instantes, o maxilar cerrado denunciado sua tensão. Ela se sente um pouco mais confortável por saber que não é a única pessoa nervosa.
Rodrigo acena para que Liliana entre, e ela o segue para dentro da casa. O corredor é longo, e desemboca em inúmeras portas. Eles caminham até o final dele, que leva a cozinha. Liliana pensa se deveria dizer algo, se tinha soado sem educação não perguntar como ele estava. Quando Rodrigo se senta em uma cadeira de frente para um balcão, ela o imita.
- Café?
Liliana assente, e ele lhe entrega um copo americano com três dedos do líquido. Caminha até um dos armários e volta para o balcão com uma garrafa de whisky, e enche uma xícara com o líquido. A xícara é branca e cheia de pequenos corações cor de rosa, e Liliana se pergunta como ele pode ter disposição para beber àquela hora da manhã. Tenta não expressar nenhuma reação, mas Rodrigo a encara como se esperasse seu julgamento. Ela percebe que a testa está enrugada, e sente as bochechas esquentarem. Bebe um pouco do café para evitar dizer alguma besteira.
Além das novelas, Rodrigo Furtado tinha feito seu nome por estar sempre estampando revistas de fofoca. Liliana se lembrava de ter visto manchetes com seu nome com bastante frequência, mas também tem certeza de que nunca parou para ler nenhuma delas. Ver o nome de Rodrigo a repelia, o que fez com que ela só lhe conhecesse através de títulos. Ele tem problemas com bebida, e passa seu tempo se dividindo entre a sobriedade e o vício. Uma hora está bem, aparece em novelas e recebe elogios por seus trabalhos. Na outra, se atrasa para as gravações e é flagrado com uma garrafa na mão, e os jornalistas lamentam o rumo que sua vida levou.
- O que você quer saber? - pergunta ele.
Rodrigo é mais alto do que Liliana imaginava, e parece bem menos simpático que na televisão. Ele também está mais velho do que ela se recordava, e Liliana percebe que já não o vê trabalhando há muitos anos. Ela se lembra de ter imaginado esse momento tantas vezes, e quer absorver cada detalhe. Pensou em trazer um caderno de anotações, mas quando acordou naquela manhã achou que poderia parecer esquisita demais. Um pouco de arrependimento cresce em seu peito, e ela tem certeza de que Rodrigo teria papel e caneta, mas imagina que é melhor não perguntar nada além do necessário.
- Quero que me conte tudo sobre aquela época - diz ela, e assim que o faz, percebe que soa como uma tola. Está tão ansiosa, quer tanto entender, que tropeça em seus próprios pensamentos.
Rodrigo estreita os olhos, e ergue a xícara. Não parece estar de bom humor.
- Isso é muita coisa.
- Eu tenho tempo - responde Liliana.
- Mas eu não quero - retruca Rodrigo. - Não seja tão evasiva.
Ele está bebendo whisky como se fosse suco de morango. Dá um gole longo, longo o suficiente para que Liliana note o silêncio entre os dois. Ela cruza os braços, e depois os coloca ao lado do corpo. Não sabe muito bem o que fazer com eles.
- Me desculpa. Eu só... Não sei muito sobre Marlena. - Ela evitou dizer aquele nome tantas vezes. Quando criança, não entendia como uma pessoa que jamais conhecera poderia afetar tanto a maneira como vivia. - Não sei nada sobre ela.
- Eu tinha certeza de que ele a difamaria para você.
- Ele já disse algumas coisas. - Liliana balança a cabeça. - Coisas não muito simpáticas.
- E você acredita? - pergunta Rodrigo.
- Não sei.
Ele se levanta e vai até a pia. Vira a xícara de cabeça para baixo, e despeja todo o whisky no ralo. A respiração de Rodrigo está ofegante, e ele se apoia na pia para tentar se controlar. Liliana acha que ele vai chorar. Antes de voltar para o balcão, passa um pouco de água no rosto.
- Tudo bem. - Rodrigo senta-se de frente para Liliana. - Vou te contar tudo que me lembro.
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Te sinto longe de mim
RomantizmMarlena sempre soube que a dualidade era parte de si. Ela vivia em dois mundos: de dia, era a filha perfeita, seguia a risca os comandos dos pais e o que esperavam dela. Nas noites de quinta-feira, porém, Marlena se aproveitava da confiança excessiv...