Início de 2018. Eu jogava vôlei, aquele de roda, com pessoas entre 16 e 20 anos do meu bairro, eram umas 19 horas mas derrepente o céu foi se escurecendo aos poucos e raios cintilavam no horizonte, veio uma camada de vento morna e após fria, apenas fria a seguir, estávamos distraidos e rindo as vezes suavemente um dos outros tentando jogar enfrentando o vento, pura diversão os nossos erros e a impossibilidade de continuar jogando, mas riamos, inocentemente e aquilo era um momento de felicidade, que foi destruído no próximo instante quando recebemos uma forte rajada de vento; a bola explodiu, era paraguai provavelmente, mas eu não devia me preocupar com marcas esportivas nesse momento, a roda se desfez e todos os 10 jovens e eu nos separamos; eu vi 3 ou 4 deles se escondendo e buscando abrigo eu fui levado um pouco mais para perto da rua da minha casa e pensei que poderia chegar correndo lá, pelos cantos, me abrigando; idéia errada.
Eu vi distante um tornado varrer alguns dos jovens para os céus e pensei: "Meu Deus, será que ficarão bem?!" quando você vê pessoas sentindo dor ou sofrendo, empaticamente você deseja que a dor delas cesse, mas quando você também está em risco, você logo espanta esses pensamentos e mede as ações para evitar a própria dor, e foi o que instintivamente eu fiz, eu já estava atento, caído na posição de cachorrinho e levantei e corri desvairadamente de um modo cambaleante pelas ruas, o medo era terrível, mas as ruas eram grandes, veio outro pequeno tornado pela esquerda da rua e me joguei para direita caindo numa rua com uma leve subida, ele passou e voltei a correr, eu estava numa rua reta eu chegaria em uma subida, depois seria uma descida e eu estaria em casa, abrigado, com os que amo, mas meu plano foi dissipado pelo próximo tornado que apareceu e me levou aos céus me passando por galhos finos, pura sorte, mas depois me levou mais alto e eu via parte do meu bairro, "é o meu fim", pensei. Foi tenebroso e atônito voltei a atenção para meu próprio corpo, poderiam ser os últimos segundos com ele, e percebi algo, meus ouvidos sangravam, e os tapei com as mãos, exercendo a força necessário para estancar o sangue, por minha sorte, galhos amorteceram minha queda e caí próximo de uma casa conhecida, da Dona Ruty, senhora agora viúva do Sr. Efraim, por quem meu irmão Dih tem muito carinho, pois ela cuidava dele na época que minha mãe trabalhava, na minha época ela só era vendedora e cuidava de duas pequenas hortas na chácara cedida que morávamos, cedida desde meus avós, que não conheci. A porta estava balançando com o vento estourada, alguém já havia adrentado aquela casa no início do morro do meu bairro. Eu entrei apavorado e não notei um avião de uso comercial pousado alí perto.
Entrei e gritei por ajuda, Alguém respondeu meio recesseoso para eu descer as escadas, era a dona Ruty lá embaixo e ela me reconheceu e sorriu:
- Neitam! Que bom que está bem. - Ela estava com um pessoal todo arrumado com mochilas e etc. E um jovem negro no meio, que logo eu reconheci, mas não vou contar para vocês, eu admirava o seu trabalho, não muito talvez a sua pessoa que possuía crimes no passado e etc. Eu respondi a Dona Ruty:
- Eu... Estou... sangrando! E ralado...
Ela se levantou e molhou um pano na pia do sótão e me entregou:
- Tome aperte as orelhas com isso, acho que aparentemente a esquerda já estancou, aperte apenas a direita! E se deite conosco... Esse pessoal não fala português eles estava passando em um avião particular e tiveram que pousar de modo forçado acho, o menino dos dreads arrombou a porta gritando algo q não entendi um "save us" mas eu os abriguei e agora aqui com você me sinto mais segura... - E ela continuou: - Vamos, deitesse no chão para maior segurança, só aquele menino levado das tatuagens alí insisti em sentar na cadeira.
E deitei no chão ao lado do jovem que ela mencionou, e o reconheci logo, olhei pra cima ele sentado encarando a parede com olhar vazio.
Eu o abordei, forçando um inglês:
- I love your job and songs Bro! you're much beauty here.
Ele me encarou e respondeu algo que não entendi mas acho que significava algo como um "valeu", pelo tom, e ele completou a sua fala com algo que terminava em: "beauty is my dagger dick, Man."
Eu ri e ele me olhou torto, depois inclinou o lábio para a esquerda que era a minha direita pois eu estava deitado no outro sentido, ele fez isso num quase sorriso e continuo com os braços cruzados, encarando a parede e era o único sentado em uma cadeira, e eu continuava com a mão direita pressionando o ouvido com o pano molhado.
Derrepente ouve-se um som de algo se rachando no andar de cima, e todos se assustam, Ruty grita que tudo bem, a parede de cima é fraca mas aqui estamos seguros... Eu percebo que todos ficam confusos e o medo de ficar encurralado no porão era horrível, eu meio que tento traduzir para o inglês e grito também, eles se acalmam, mas o local treme e o rapaz cai da cadeira no chão, com um gemido leve, mas cai num baque forte, e ele sussura algo baixinho como: "i won't cry..." e eu achei isso humano e eu o ajudei a se deitar, e ele ficou ao meu lado e o perguntei:
- you wanna that i hold your hand?
Ele respondeu: "hold my hand buddy".
E eu: "i'm in a mess of blood, wait a second.
eu levantei e me dirigi até a pia, e ele me olhou espantado por eu ter coragem de levantar após ele ter caído, eu lavei o pano, usei a mão esquerda para tapar o ouvido direito, e voltei a deitar no chão ao lado dele, e com a mão direita apertei sua mão.
Ficamos assim nos próximos instantes e eu senti que cada dia ele poderia se tornar uma pessoa melhor, eu também, todos vocês que estão lendo também...
Quando acordei desse sonho escrevi um poema que termina com o verso:
"Então me dê a mão
Xxxtentacion"*¹*¹: Meu próximo projeto, só de poesia (Café Seinen)
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O Rapaz em 6 Carros e O Urso Pardo
RandomO Rapaz é um personagem fictício que escreve a própria história, o autor deve estar dormindo. Não será falado nada a mais aqui, que possa estragar a experiência de se afogar em uma consciência. Estou pedindo, caso você goste do que ler, uma contrib...