1 Moeda de troca

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Judy

Eu sabia que era uma péssima ideia, eu sabia, mas como sempre, resolvi arriscar.

Como o previsto, não consegui chegar a Tucker, uma cidadezinha onde eu conseguiria abastecer o carro e talvez até tomar um bom banho. Ao invés disso, parei no meio do nada, um deserto escaldante parecendo um pedaço do inferno. Sem alternativa, deixei a lata velha para trás e passei a arrastar minha mala, enfrentando os quase 50°C daquela pista esquecida por Deus.

Depois de uma hora caminhando, avistei uma casa, parecia simples, de madeira crua mais ao longe havia um grande galpão, mas me atentei somente a casa, talvez ali morasse uma velhinha bondosa fazendo bolo de milho e me oferecesse um pedaço enquanto esperávamos por um taxi ou algo do tipo.

Seria pedir demais, Deus? Talvez, mas não custava sonhar.

Saí do asfalto descendo pela areia compacta com plantas secas e arbustos espinhosos pelo caminho. A descida foi complicada, em certo momento, o solo ficou fofo engolindo meus tênis quase até a metade, parecia que eu seria sugada pela areia quente.

Olhando mais de perto, não era uma velhinha que morava na casa. Aliás, a casa era quase um chalé e tinha até uma pequena varanda na frente.

Me deparei com um homem sentado nos degraus, de calça jeans desbotada e rasgada nos joelhos, descalço, com o cabelo revolto e sem camisa. A pele queimada de sol estava brilhando com o suor escorrendo pelo pescoço. Ele descascava uma laranja com uma faca e nem se incomodou em prestar atenção em mim.

Coisa que aprendi rápido naquela região, ninguém era muito amigável com "turistas".

⸻ Com licença... É, eu fiquei sem gasolina... Será que...

Ele ergueu a cabeça para me olhar e quase não consegui respirar. O rosto dele era uma pintura, e olha que já andei por esse país todo, nunca vi alguém como ele... as sobrancelhas grossas davam um ar de mistério para os olhos castanho-claros com cílios tão volumosos que pareciam um contorno de maquiagem, duas covinhas se formavam em suas bochechas enquanto ele mastigava.

⸻ Eu preciso de ajuda. ⸻ falei timidamente.

Parei a alguma distância, estudando seu rosto, não parecia feliz em me ver. O que não era nada bom para uma garota sozinha com um desconhecido que tinha uma faca nas mãos.

Mas... Por alguma razão, não tive medo dele.

⸻ Será que você pode... ⸻ insisti impaciente. Em qualquer outra circunstâncias eu desistiria e iria embora, mas não havia outra alternativa naquele lugar de merda.

⸻ Tô ocupado. ⸻ me interrompeu cuspindo um pedaço de bagaço no chão.

Tentei me controlar para não ser grossa.

⸻ Eu preciso de um taxi, meu telefone não tem sinal... Ou só um pouco de gasolina... Eu pago. ⸻ ofereci. Eu podia tentar usar o carro um pouco mais se precisasse muito.

Ele nem esboçou reação, devia ser algum daqueles malucos que não suportam pessoas...

⸻ Olha só... Eu realmente odeio incomodar, mas...

⸻ Tá incomodando... E a menos que você consiga produzir gasolina a partir de areia, não vai sair daqui de carro. ⸻ falou irritado desencostando do pilar, ficando em pé e ajeitando suas jóias na calça. Por que imbecis têm sempre que ter uma mala tão grande? Não consegui não olhar.

⸻ Tá bom, então... Você pode emprestar um telefone pra eu pedir ajuda de alguém que não esteja... ⸻ quase cuspi a palavra ⸻ Ocupado?

⸻ Não tenho telefone, a próxima cidade fica a sete quilômetros naquela direção. ⸻ apontou para a frente.

Se dessa vez Você Ficar Onde histórias criam vida. Descubra agora