19 Tempo

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Judy

Duas semanas depois

Olhei para meu telefone no travesseiro e sem levantar a cabeça apertei o botão para atender a chamada.

⸻ Oi, querida, estou indo ver o Bo, quer vir desta vez?

Marisa nem tinha acabado de falar e eu já estava chorando.

⸻ Desculpe, Mari... Não consigo... Ainda não consigo...

Ela apenas suspirou do outro lado da linha. E apertei meu rosto contra os travesseiros, me odiando. Mas eu não conseguia encontrar a coragem de ver as consequências que ele estava enfrentando por minha causa.

⸻ Ele não espera que você vá, Judy... ⸻ falou com a voz embargada. ⸻ E isso é o mais triste de tudo...

Me apoiei nos cotovelos chegando mais perto do meu celular. ⸻ Diz para ele que... Diz que sinto muito... Que eu quero... Que sinto a falta dele.

⸻ Tenho certeza de que quando estiver pronta, você mesma pode dizer. Fique bem, querida. Lis te mandou um beijo.

Chorei ainda mais. ⸻ Um beijo para ela também. Estou com saudades.

Ela desligou e me virei de costas na cama. Faziam duas semanas que eu não saía daquela cama, da mesma cama que pensei em dividir com ele naquele hotel, o de sonhamos aproveitar como uma lua de mel, nem totalmente livre, nem preso àquela casa... Eu daria tudo para voltar ao início disso...

Minha mãe chegou poucas horas depois que o levaram naquela noite. Era para eu estar feliz dentro dos braços dela... Mas não estava. Claro que a queria perto, mas Ian... Ian havia me salvado, havia me resgatado daquilo tudo.

Nem acreditei como pude ter sido tão burra, o desgraçado havia se passado por minha mãe, me pedido os exames para seus jogos lunáticos. E havia visto a foto dele... Pesquisado sobre ele... Ele sabia de cada passo meu depois disso, depois que decidi voltar... Então... Se Ian estava preso hoje, afastado de suas meninas... Se ele perdeu a premiação delas quando venceram aquele festival... Tudo aquilo era culpa minha.

E mesmo assim, cada vez que eu fechava os olhos era a imagem dele dizendo que me amava que eu via. A sensação de não ter respondido, me deixava ainda pior.

Minha mãe entrou no quarto acompanhada de Matteo, um dos antigos seguranças do desgraçado. Ela havia me avisado que eles iriam depor sobre o caso naquela manhã.

⸻ Ainda chorando, amor? ⸻ disse ela me agarrando em seus braços protetores.

⸻ Mari me chamou para visitar o Ian... ⸻ falei baixinho.

⸻ E você não quer vê-lo? ⸻ perguntou afagado minha cabeça com carinho.

⸻ É tudo que eu mais quero... Mas não sei se ele quer me ver, eu... Não sei nem se mereço visitá-lo.

Matteo se sentou a minha frente.
⸻ Essa não é a garota que eu conheci, Judy. Do que está com medo? Aquele rapaz parece realmente gostar de você, não devia deixá-lo esperando. ⸻ estendeu a mão para mim e a segurei. ⸻ Naquela noite... Ele não pensou nele nem por um segundo, queria entregá-la ao amigo e se entregar na boate mesmo...

Baixei os olhos. ⸻ Talvez se ele tivesse ficado lá...

⸻ Ele não quer ouvir nada disso, ele só queria proteger você, e tenho certeza que isso não mudou.

Suspirei olha do para nossas maos. Me lembrando da noite em que ele "facilitou" minha fuga. ⸻ A garota que fugiu de casa depois de te distrair mostrando os peitos se perdeu em algum lugar aqui. ⸻ apontei meu peito. ⸻ Ser usada naquela sala não foi a pior coisa... Eu nem me lembro direito. A pior coisa é saber tudo o que ele arriscou para me salvar, enquanto eu havia provocado tudo aquilo...

⸻ Você é vítima, Judy. Não pode se culpar por nada. E com conhecimento de causa... ⸻ ele direcionou o olhar para minha mãe e sorriu. ⸻ Quando amamos alguém, não temos limites ou medo de nada.

Afaguei o braço de minha mãe que me segurava. Estava realmente feliz que ela tivesse encontrado alguém bom para cuidar dela. Matteo sempre cuidou de nós de certa forma, não sabia que estavam juntos, mas era uma coisa boa.

⸻ Soubemos que o desgraçado foi transferido, é um caso para os federais agora. Você pode retomar sua vida, amor. ⸻ minha mãe me encorajou. ⸻ Pode ir conosco, ou pode ficar. Sua vida agora é só sua como sempre sonhou. Se seu coração te manda ir atrás de seu professor de balé... Vá. Você merece ser feliz.

Suspirei segurando o choro. ⸻ Eu vou... Mas quero estar bem para isso, não posso estar destruída como estou.

⸻ Quanto tempo até ele sair? ⸻ Perguntou Matteo.

⸻ Segundo a Mari disse, três meses e quatro dias.

⸻ Não é tanto tempo. ⸻ mamãe sorriu. ⸻ passou mais tempo que isso longe dele. E dessa vez... Se você ficar, vai valer a pena porque estarão recomeçando vidas novas juntos.

⸻ É tudo o que eu quero. E vou fazer isso direito.

***

Ian

⸻ Ela não veio? ⸻ foi a primeira pergunta que fiz a Marisa pelo fone através daquele vidro deprimente entre nós.

Ela baixou a cabeça. ⸻ Ela ainda não está pronta, Bo, mas ela vai vir.

Sorri sem graca e me esforcei para mudar de assunto. ⸻ Como estão todos?

Ela sorriu também ⸻ Lis está se saindo uma bela professora substituta, as meninas estão morrendo de saudade, arrumaram um lugarzinho no depósito do mercado para ensaiarem. Jhon anda muito atarefado, mas disse que vem te ver semana que vem. Sully também, ele torceu o pé, mas logo vai aparecer por aqui, nem que seja de muletas. ⸻ riu ainda com ar triste. ⸻ E... Só tenho falado com a Judy por telefone, ela está com a mãe, não saiu do hotel de Cliver... Mas... Andei falando com as mães das meninas... Pensei que talvez pudéssemos reabrir a escola na cidade quando você voltar.

Fiz que não com a cabeça. ⸻ Não, por favor, Mari, ainda não consigo pensar em nada disso, eu só... Quero colocar a cabeça no lugar, sei que falta pouco, mas agora está um pouco difícil pensar em futuro.

⸻ Eu sei, meu bem. Mas pense que sua vida só está começando. Você tem muito a viver ainda. Tem muito a ensinar. As meninas não vão desistir de esperar o professor delas e sei que mais garotas vão aparecer.

Um dos guardas me avisou que o tempo havia acabado. Me despedi dela tentando sorrir. Todas as vezes ela parecia levar um pedacinho de mim embora.

Mas sorri de verdade ao ver sua fé brilhando em seus olhos na nossa despedida. Queria tanto poder pensar da mesma forma. Mas a verdade era que meu coração estava partido, e talvez demorasse um tempo para me curar daquilo.

Já não sabia mais se a dança poderia me fazer feliz, ou se eu queria que ela fizesse. Talvez um dia eu me curasse, esquecesse tudo aquilo que vi naquela sala e só voltasse a viver... Eu já havia superado tanto... Mas acho que havia um limite para uma pessoa ser forte. Um limite antes de se quebrar...

Será que eu era forte o suficiente para aguentar três meses de silêncio dela? Três meses de sol escaldante e sem vida?

Talvez eu devesse repensar essa metáfora idiota...

Se dessa vez Você Ficar Onde histórias criam vida. Descubra agora