Destino

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GABRIELA

Saí do banho tremendo, vendo pelas portas da varanda os primeiros flocos de neve despencarem das grossas e escuras nuvens, cobrindo as luzes da cidade. Quando me falavam que o inverno de Nova York era realmente frio, não imaginava algo naquela proporção . Aquecedores ligados, roupas quentes e várias cobertas não espantavam a sensação de congelamento.

Talvez - só talvez - um namorado ajudasse.

Mas eu não tinha um e nem pretendia ter. Estava bem sozinha, e ficaria ainda mais comendo alguma coisa depois de uma semana exaustiva como a que tive. Pelo menos a mudança estava em ordem, depois de vários e vários dias na mais completa bagunça. Naquele momento, um chocolate quente e alguns biscoitos seriam suficientes para que tudo voltasse ao seu devido lugar.

Apertei mais forte o roupão contra meu corpo e fui para a cozinha, virando alguns armários atrás de leite e chocolate. Achei alguns biscoitos que havia comprado logo depois da mudança em cima da bancada, e os coloquei em um prato. O leite  estava na geladeira, e o chocolate...

Minutos depois, eu estava sentada no tapete, exausta e com uma pilha de ingredientes inúteis ao meu lado. E, claro, nada do chocolate. Forcei minha mente a tentar lembrar se o havia comprado em uma das últimas idas ao mercado, mas nada me surgia. As semanas anteriores tinham sido um caos, e jamais me lembraria de um detalhe como aquele.

Olhei para o relógio de parede cuidadosamente colocado sobre a mesinha de apoio, e suspirei. O mercado mais próximo com certeza já estava fechado, e sair para achar algum outro aberto... era transtorno demais. Com a neve e os últimos escritórios sendo fechados naquele horário, dirigir  alguns poucos metros no centro de Nova York  se tornava uma missão que poderia levar horas. E eu só queria minha casa.

"Tô sem chocolate. Você tem?"

Alguns minutos depois, meu celular deu sinal. Peguei-o e abandonei a cozinha, me jogando nas cobertas quentinhas do sofá da sala. A sensação de calor contra minha pele era deliciosa.

"Vixi, ter eu até tenho, mas vai demorar até você conseguir tê-lo em mãos.🙃"

Bati com a mão na testa, lembrando que Lizie morava do outro lado do Central Park, ou seja, ainda mais longe que qualquer mercado. Pelo visto o chocolate não rolaria naquela noite.

"Acho que vou ficar com um chá mesmo, já que o chocolate quente não vai rolar pelo visto."

"Pede para algum vizinho. Pessoal de universidade, jogadores, sabe? Esse não é o padrão do seu condomínio?"

Até onde eu sabia, sim. Mas digamos que nem sempre uma moradora nova era bem recebida por ali.

"Melhor deixar assim, amanhã compro o bendito chocolate. "

Mas, conhecendo Lizie como eu conhecia, sabia que ela não deixaria passar. Nem dez segundo se passaram antes que sua resposta piscasse na tela.

"Um amigo meu mora alguns andares acima do seu. Ele não bateria a porta na sua cara se fosse pedir um pouco de chocolate 😉"

Gargalhei. O "conhecer" de Lizi e poderia ser resumido como "vi ele na universidade hoje". Amigo era uma palavra além para sua definição.

"Melhor não, mas valeu "

"Qual é!  Cadê a Gabriela marrenta que eu conheço?! Me devolva minha amiga, sua impostora!😫"

"Sua doida!😑😂"

Envolvi mais ainda as cobertas macias ao redor de meu corpo, lembrando que apesar do país, eu ainda era a marrenta e forte Gabriela. Qual é! Pedir chocolate em um vizinho desconhecido era moleza para mim.

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