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DULCE MARIA

Acho que eu sou perfeitamente capaz de ajudar o Christopher com o centro cultural que ele deseja abrir. Não seria algo muito diferente do que já faço hoje no serviço comunitário e, apesar de tudo, fazemos um ótimo trabalho em equipe. Inclusive, posso ajudá-lo financeiramente. Não faço ideia de quanto pagam a ele aqui, se é que pagam, e... Espera! Franzo o cenho e balanço a cabeça em negação. Desde quando eu comecei a fazer planos futuros de trabalho?

Um estrondo invade o quarto, quebrando meus pensamentos, e me sento rapidamente na cama a tempo de ver Anahí passar pela porta feito um furacão enquanto solta gritinhos histéricos de felicidade.

— Pelo jeito o encontro com o Alfonso foi bom — sorrio maliciosa.

— Ahhh, você não faz ideia do quanto! — ela joga a mochila de qualquer jeito na sua cama e corre até a minha.

— Vamos lá! Respira fundo e conta do começo — me ajeito para ouvir sua história enquanto ela faz o que falei.

— Tá! Nós fomos ao cinema na sexta à noite, mas não prestamos muita atenção. Sabe como é, né? — seu sorriso tímido me faz rir.

— Isso aí, Tinkerbell, está aprendendo finalmente! E como foi?

— Ai, foi incrível! — ela fala separando as sílabas — O beijo do Alfonso é maravilhoso! Senti borboletas voando sem parar no meu estômago.

— E o sexo?

— Dulce! — ela me repreende e suas bochechas ficam levemente rosadas.

— Ué? Mas o que eu falei demais?

— Nós não... Você sabe... Tivemos relações.

— Ai, Anahí! — reviro os olhos de forma exagerada — Vocês estavam num cinema! Não tocou nem uma pra ele? Cinemas foram feitos para isso, você sabia?

— Dulce! — ela me repreende novamente e respiro fundo.

— Não acredito que o Alfonso não tenha tentado nada depois da abertura que você deu.

— Bem... — Anahí faz uma pausa como se estivesse medindo suas próximas palavras.

— Fala logo.

— Depois do cinema, ele me levou para casa e perguntou se eu gostaria de sair com ele novamente no dia seguinte. Fomos numa sorveteria no final da tarde e demos várias voltas de carro até que ele parou no mirante — ela agarra um travesseiro e coloca no rosto, enquanto sorri envergonhada.

— Vocês transaram ou não? — pergunto impaciente.

— Não! Ele esqueceu das camisinhas. Mas o clima estava perfeito! A vista da cidade, a luz da lua... Acho que poderia ter acontecido. Me senti muito à vontade com ele.

Suas palavras me fazem pensar em Christopher. Nunca tive problemas para ficar nua na frente de quem fosse, mas com ele eu me sentia à vontade de um jeito diferente, parecido com o jeito que Anahí disse se sentir perto do Alfonso. Mas ela está apaixonada por ele e eu não estou apaixonada pelo Christopher, certo? Franzo o cenho e Anahí estala os dedos na frente dos meus olhos.

— Alô! Terra chamando Dulce.

— O que foi? — olho para ela.

— Você estava divagando por aí — ela aponta para minha cabeça — Em que estava pensando?

— Que você foi uma boba por não ter aproveitado essa oportunidade por causa de uma camisinha — minto.

— Acorda, Dulce! Eu quero ter filhos, mas só daqui uns vinte anos e não agora.

— E existem vários outros meios de prevenir isso — falo como se fosse óbvio.

— O que você faz ou usa?

— DIU — ela pensa um pouco e levanta da cama num salto, indo em direção a sua e abrindo sua mochila.

— Ainda assim existem várias doenças por aí. Não é seguro ter relações sexuais sem camisinha.

Não respondo, pois sempre taco o foda-se pra isso na maioria das vezes, mas sei que ela tem razão, então prefiro ficar quieta. Agarro um travesseiro e me escoro na cabeceira da cama, enquanto observo Anahí andar de um lado para outro dentro do quarto enquanto guarda suas coisas. Por onde eu começo a falar sobre Christopher? Quando termina, ela se dirige para fechar a porta do quarto que havia deixado aberta.

— E o seu final de semana, como foi? — me pergunta.

— Transei com o Christopher...

— O QUE? — Anahí pára bruscamente e vira na minha direção, arregalando os olhos e cobrindo a boca aberta com a mão — V-você... Não! O professor... Não acredito! — acho que eu deveria ter preparado ela para essa notícia.

— É isso mesmo que você ouviu, Tinker.

— Não pode ser! Dulce, ele é nosso professor! E um seminarista! Por Deus!

— Eu sei, mas foi inevitável. Tive vontade de transar com o Christopher desde o primeiro momento em que o vi no corredor quando cheguei aqui. Eu não fazia ideia de quem ele era — tento me defender.

— Mas você ficou provocando o coitado durante meses, e sabendo quem ele era.

— No começo eu queria ser expulsa e fazia isso pela diversão também... — ela arqueia uma sobrancelha e desvio o olhar do seu.

— E o que mudou?

— Nada — bastante coisa, na verdade, mas ainda não sei explicar o que, então nem vou me atrever a seguir por esse caminho. Quando foi que fiquei tão mole?

— Você está estranha. Tem certeza?

— Tenho, Anahí. Foi só uma meta que consegui cumprir.

— Então tudo foi só um jogo onde você venceu? Meu Deus! O cara quebrou um voto de castidade por você — suspiro frustrada.

— Entenda como quiser. Não quero mais falar desse assunto.

— Ah, mas você vai falar sim. Quero detalhes!

Ela fecha a porta, deita ao meu lado na cama e eu começo a responder todas as suas perguntas — exceto as sobre os meus sentimentos. Quando ela me pergunta como as coisas vão ser a partir de agora, não sei responder. Christopher e eu não chegamos a conversar sobre isso e eu esperava que tivéssemos uma oportunidade de conversar hoje, mas ele não deu sinal de vida.

Quando soa o toque de recolher, Anahí se espreguiça e boceja automaticamente, me fazendo lembrar dos ratinhos de Pavlov. Ela me deseja boa noite, estalando um beijo na minha bochecha, e vai para sua cama dormir, enquanto eu volto a pensar na minha situação com Christopher até pegar no sono também.

RedençãoOnde histórias criam vida. Descubra agora