SN
O tempo estava frio, chuvoso e melancólico. Como se o céu tivesse resolvido me imitar. Fazia dias que a chuva não cessava... e dentro de mim, também não.
Não falei mais com Yoongi desde aquela noite. As mulheres da casa continuam trazendo minhas refeições até o quarto, mas a comida sempre volta intacta. Não sinto fome. Nem sede. Nem vontade.
A verdade é que... se meu corpo parasse hoje, talvez fosse um alívio.
É estranho pensar isso, porque, não faz tanto tempo assim, viver era tudo o que eu mais queria. Viver por ele. Por nós.
Percebi que estava com os olhos fixos na janela, mas não enxergava nada. Estava perdida demais dentro de mim.
Então, ouvi.
Três batidas leves na porta.
Me virei devagar, sem muita pressa de sair do meu mundo. E lá estava ele.
Yoongi.
Ele entrou com uma bandeja nas mãos. Sopa quente, um pedaço de bolo, suco... e meu chocolate favorito.
- Eu não quero. - murmurei, virando o rosto de volta para a janela, como quem tenta fugir do que ainda sente.
- Se você não comer, vou chamar o médico pra te colocar no soro. - ele respondeu com firmeza.
Achei que fosse uma ameaça vazia. Mas quando me virei, meus olhos se arregalaram.
Um médico e dois enfermeiros estavam na porta, à espera.
- Você... não faria isso. - encarei-o, quase como uma súplica.
Ele não respondeu com palavras. Só me olhou.
Aquele olhar. O mesmo que um dia me fez me sentir segura. O mesmo que agora me dizia, "eu não vou te deixar desistir".
Ele se aproximou e colocou a bandeja na cama, ao meu lado. Sem dizer nada.
Cedi.
Peguei a tigela com as mãos trêmulas, apoiei no colo e comecei a comer. Cada colherada era um esforço. Mas não pela comida. Era pelo que ela significava: continuar viva. Continuar aqui.
- Podem ir. Não será preciso. - ouvi Yoongi dizer atrás de mim. Vi de relance quando ele deu dinheiro aos profissionais.
Balancei a cabeça, com um sorriso fraco e triste.
- Sempre o dinheiro... tudo se resolve com ele, né?.- murmurei, engolindo uma colherada amarga. Não da sopa, mas da vida.
Ele não respondeu. Apenas se sentou ao meu lado. Perto. Silencioso. Presente.
Ficamos ali, em silêncio, por alguns segundos que pareceram eternos. A chuva batia no vidro. O mundo lá fora continuava indiferente, mas, pela primeira vez em dias, alguma coisa dentro de mim se moveu.
- Eu quero que você fique bem... me importo com você. - Ele falou com um tom que eu não consegui interpretar. Havia algo mais ali. Ele realmente se importava, mas... como poderia? Como alguém que estava dirigindo um sistema que vendia mulheres poderia se importar de verdade? Eu não conseguia reconciliar essas duas versões dele.
Eu olhei para ele, sentindo meu coração apertar enquanto as palavras saíam de minha boca.
- Não me venha com isso. - Eu estava tremendo, mas não de frio. Era raiva. Raiva de mim mesma, raiva dele. - Como você pode me olhar e dizer que está se importando quando você faz parte disso? Quando você se tornou dono de um lugar que destrói mulheres?.- Minha voz quebrou, mas eu forcei as palavras. - Como você pode me dizer que me ama quando você está no topo desse sistema imundo?

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O leilão
Hayran KurguMin Yoongi foi o meu primeiro amor. E também o meu maior sofrimento. Éramos dois jovens tolos que acreditavam que o amor bastava para enfrentar o mundo. Mas meu pai fez questão de me provar o contrário. Ele arrancou Yoongi da minha vida com a mesma...