I N T R O.

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A REALIDADE DE SEUS ATOS LIBIDINOSOS atingira Shuhua como uma descarga elétrica quando a sobriedade de seus pensamentos fizera-se presente naquele instante do dia.

Os olhos estavam fixos no teto mortalmente pintado em branco, a tinta recém feita e o cheiro do perfume channel tomava conta de seu olfato. Sabia que sua roupa estava completamente impregnada com o perfume dela, assim como suas mãos conseguiam sentir a delicadeza da cintura, o gosto adocicado nos lábios e até mesmo o som dos gemidos suaves. Era insano, mas seu corpo não conseguia desapegar, muito menos seus pensamentos.

O relógio grudado na parede fazia tic-tac, tic-tac, tic-tac, causando a corriqueira irritação em Shuhua, que rapidamente franzira os finos lábios em um bico explícito.

- Então, Shuhua, algo está lhe deixando incomodada, estou certa? - a pergunta viera de Becca, sua terapeuta de anos, que parecia realmente preocupada com a figura silenciosa deitada em seu divã.

Shuhua não respondeu porquê, para ser sincera com vocês, meus caros leitores, muita coisa incomodava a taiwanesa. Desde o modo como Yuqi, sua colega de apartamento, guardava o achocolatado na geladeira, ao modo irritante que o relógio daquela sala se movimentava. Sem contar, é claro, os quadros postos de maneira completamente errônea. Suas mãos coçavam para se levantar e ajeitar aquela peça do jeito certo que se deveria, mas se absteve. Não queria, de forma alguma, que Becca pensasse que havia retrocedido em seu tratamento, embora seja um pouco da verdade.

Pressionou os olhos com força para não fixar sua atenção nos quadros ou ao relógio posto à parede. Becca a observou com devida atenção, a minusciosidade de encarar cada gesto para certificar-se de que a mulher estava definitivamente bem.

- As vezes, parece que estou enlouquecendo de verdade. - o resmungo saiu sem intenção alguma, causando certo alarme na estrangeira, que rapidamente virou o rosto para encarar a terapeuta, que continuava a mirá-la sem demonstrar nenhuma alteração de suas emoções.

- Explique-se, querida. - pediu gentilmente, vendo Shuhua voltar a fixar os olhos no teto branco, o corpo tomado por uma tensão que não estava lá antes. - Os rémedios não estão funcionando? É por isso que precisava me ver com tanta urgência?

Shuhua franziu o cenho, desejando que aquele fosse o maior de seus problemas, quando na realidade, não era. Esfregou as palmas de suas mãos uma nas outras, tentando normalizar a respiração acelerada.

- Não! Não é isso! - se apressou para dizer, balançando a cabeça em uma lenta negação. - Os rémedios ainda funcionam, eu prometo para você. O problema é que... Eu gostaria que as coisas fossem mais fáceis, sabe?! As vezes, parece que minha pele está sendo queimada por brasas e tudo o que posso fazer é me dopar até que isso vá embora. - Shuhua pressionou os olhos com força. - Mas acontece, Becca, que desde que eu a conheci, tem sido como uma tortura para mim.

A loira virou o rosto com a expressão séria, averiguando o modo como o corpo de Shuhua reagia. Estava preocupada, embora já soubesse da raiz do problema. A taiwanesa vinha desenvolvendo uma clara melhora nos últimos dois anos, os rémedios faziam efeito, apesar de deixá-la sonolenta ao extremo. Porém, tudo começara a desandar quando Shuhua a conheceu, era como se anos de tratamento fossem jogados ao vento.

Becca nunca a vira pessoalmente, embora a conhecesse muito bem pelas capas de revistas e milhares de entrevistas. Cabelos vermelhos como o fogo, olhos oblíquos e dissimulados, o sorriso tentadoramente quente, e a áurea exalando aquele female fatal, que era irritantemente difícil de resistir.

A terapeuta não culpava Shuhua por não conseguir afastá-la de si, era verdade. Mas a taiwanesa pensava que, caso Becca a conhecesse em realidade, não apenas pelas capas de revista, poderia de fato entender o porquê de Shuhua aguentar todo aquele caos.

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