Capítulo 31 — Inacessível.
Carlos já estava há quase um quilômetro de distância de sua casa e continuou andando para se aproximar de Fernando. Queria confirmar se o que via, era real. O instrutor mal sentia seus passos no chão, como se caminhasse dentro de algum pesadelo. Acelerou, querendo estar com ele o mais rápido possível.
— Nando... — Carlos chamou-o, anunciando sua chegada, sem deixar de notar que havia o assustado com sua brutidão.
O artista permaneceu em silêncio, enquanto se ajeitava para se sentar, olhando para o rosto completamente atordoado à sua frente.
— Você... — Carlos começou outra frase, tentando pensar em como perguntaria aquilo. — Isso é o que eu acho que é?
— Por quê? — A expressão de Fernando se fechou completamente. — O que isso vai mudar na sua vida?
— O quê? — O instrutor mal entendeu de onde veio aquilo, apenas engoliu em seco enquanto absorvia a frase do outro. — Eu não posso querer saber o que faz aqui, na calçada, enquanto me disse que tinha alugado o quarto na casa de um colega de trabalho?
— Eu sei que você é ingênuo na maioria das vezes. Mas é demais, até pra você, acreditar que eu realmente tinha uma chance de pagar um lugar pra alguém.
— Mas... — Carlos olhou para os lados, completamente perdido, tudo embaralhava em sua mente. — Então por que mentiu?
— Eu nem preciso responder isso. — O rosto de Fernando continuava indiferente, mas sua expressão se moldou em um pequeno desgosto.
— Como não?! Você... Você sumiu, depois voltou dizendo que estava bem e que tinha um lugar. Inventou todos os detalhes e me pareceu feliz quando disse tudo isso. — Carlos se exasperou, quase sem ar, agora se abaixando, ficando de joelhos em frente ao artista. — E qual o propósito?!
— Porque eu conheço você. Você provavelmente me procuraria no trabalho até me encontrar ou sei lá o que mais. — Fernando explicou, encarando o homem que agora olhava fixamente para o chão. — Eu estou errado? Porque me disseram que você esteve por lá me procurando.
— E por que eu não posso me preocupar? — Carlos continuou a olhar para a calçada onde seus joelhos estavam repousados. — Eu queria saber se você estava bem...
— Eu não quero mais te causar tantos problemas. Sua vida piorou desde que comecei a fazer parte dela. — Fernando afirmou, vendo a cabeça do outro gesticular negativamente, enquanto voltava a erguer o olhar.
— Não fala isso, não é verdade. — Teve coragem de encará-lo, sentindo seu coração acelerar, sabendo que não era apenas tristeza que sentia por ele. — É o contrário, minha vida piorou desde que você foi embora.
— Eu agradeço pelo o que fez, eu já disse isso. Mas já é hora de eu me virar sozinho.
— E você prefere voltar pras ruas do que estar comigo? — Carlos indagou tão sofridamente que o outro perdeu o fôlego por um instante.
— Eu não posso estar com você. Não dá mais pra mim.
Fernando esboçava pela primeira vez desde o início daquela conversa algo que não fosse indiferença. Seus olhos castanhos marejavam, enquanto se deparava com o olhar do outro.
— Por quê? — Carlos inquiriu, tentando impedir seus lábios de tremerem.
— Eu já tentei ir embora uma vez... Você não se lembra da carta que eu te fiz? Eu ia embora, Carlos. Me pegaram enquanto eu saía pela porta. — Contou tristemente, sentindo seu peito apertar. — Fui levado para a delegacia e aí que você apareceu e me fez ficar por perto de novo.
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Indigente [COMPLETA]
RomanceEm meio à olhares tortos de reprovação vindo dos clientes, apenas um olhar era de compaixão quando um andarilho adentrou uma lanchonete no centro da cidade. Carlos parou de comer ao ver o pobre homem chegando, sentindo seu peito apertar ao vê-lo lar...