Capítulo 27: Uma criança rebelde

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Levi narrando:

-Por que me trousse aqui?

-Quantas vezes terei que repetir para não fazer perguntas?

-Levi, depois da aula a gente vai zoar um pouco o novato, quer vir com a gente? -Disse um amigo que sentava do meu lado, acho que seu nome era Marcos, mas não lembro ao certo.

-Tá falando do gordinho?

-Dele mesmo, o pessoal tá pensando em jogar merda de cachorro e empurrar ele no lago.

-Ideia perfeita. -Minha versão adolescente disse em um tom ameaçador.

O espaço mudou novamente ao meu redor e em pouco tempo estávamos em uma rua vazia, o novato que Marcos estava comentando comigo era o único que estava andando no local. Provavelmente ele estava voltando para casa. Um tempo se passa e escuto vozes de adolescentes, olho para trás e vejo eu e meus amigos da oitava série de bicicleta em direção ao menino novo.

-Qual é Mob Dick, tá indo comprar doce pra alimentar essa barriguinha?

-Ei Levi, tem como você me deixar em paz pelo menos um dia da porra da minha vida?

-Levi... Vai deixar ele falar assim com você? -Disse um amigo meu que não me recordo do nome.

-Se prepara gordo, hoje você morre. -Disse enquanto eu tirava um canivete do bolso.

-Ei cara, foi mal, eu não queria ter falado aquilo pra vo... -A fala do novato foi interrompida por um soco bem dado no estômago e outro em seu nariz.

Meu antigo eu levantou a camisa do gordinho e começou a escrever nela com o canivete. Depois de tudo que aconteceu comigo não consigo sentir agonia ao ver uma cena como essa. O novato se chacoalhava de um lado para o outro em pura agonia, o que fazia os cortes ficarem irregulares e ainda mais dolorosos.

-Você não acha que tá exagerando um pouco, Levi?- Perguntou Marcos.

-Cala a boca ou eu escrevo na sua barriga também, é isso que você quer?

-Não... Foi mal cara.

-É bom mesmo.- Disse enquanto continuava escrevendo, sem olhar para trás.

-Você sempre foi uma criança bem má, não é mesmo?- Deus me perguntou.

-Não me lembro desse dia...

-Claro que não lembra, quando você finalmente resolveu ser uma pessoa melhor, porque senão acabaria morrendo na rua depois que seus pais pararam de te dar dinheiro, você já tinha feito mais coisas vis do que dá para contar em cinquenta mãos. Acha mesmo que passar a ser uma pessoa melhor depois dos vinte anos poderia mudar algo sobre você? Acha que apaga tudo o que fez no passado? Acha que não sei que seu cérebro só não se lembra de metade das coisas ruins que fez por conta de você se desprezar por dentro e mal conseguir dormir todas as noites por conta de se achar um completo pedaço de merda? Você é apenas mais um exemplo de que a humanidade foi um erro, apesar de ser metade demônio o seu lado humano nunca foi ao menos capaz de parar você enquanto desenhava na barriga de um coitado com um canivete. Você e sua espécie não passam de um erro meu, e erros devem ser movidos para o lixo.

-Sei que não sou um exemplo, mas muitos são e precisam da sua ajuda. Você mesmo criou essa merda que tanto critica, então porque não interfere e tenta nos ajudar pelo menos uma vez em sua existência?

-Garoto... Já vos ajudei mais do que deveria, sempre ajudei a irem para o caminho certo, assim como um pai deve fazer com um filho, mas de fato ir rumo ao caminho certo é decisão da cria, e vocês se levaram a morte. Eu mesmo tirarei sua vida agora mesmo por ousar invadir meu território.

Luzes incandescentes surgiram em forma de espiral e formaram pouco a pouco um ser do tamanho de um homem comum, cerca de 1,75 de altura. Ele não possuía olhos e nem boca, sua pele não era um tecido, e sim um desenho do próprio vácuo do universo, sendo até mesmo possível ver pequenos pontos de luz que pareciam estrelas, era algo belo, imponente e assustador de se ver.

-Uau...

-O que foi, Levi?

-Você é tão... Não consigo colocar o que sinto em palavras.

-Bom, aprecie, será a última coisa que verá em sua vida.

A loucura, o mal, a vontade de matar, sinto tudo indo embora. A escuridão se esvai e dá lugar a uma calma, uma paz, um sentido. A presença de Deus é absoluta, algo que não é possível se explicar por palavras, apenas consigo dizer que é a melhor sensação que já senti.

-O que você fez com o mal que estava dentro de mim?

-Expulsei sua mãe e sua insanidade de dentro de você temporariamente, assim poderá morrer em paz.

-Se despreza tanto os humanos, por que quer que eu morra em paz?

-Porque apesar de tudo, você ainda é meu filho, assim como todos os outros, e um filho nunca deve morrer triste diante dos olhos do pai.

-E onde está Liz?

-Bem ali. -Disse Deus apontando para sua direita. Lá estava ela, imóvel, como se estivesse presa. Vi seus esforços para se mexer e gritar, ,as a única coisa que se moveu foi uma lágrima que caía de seu olho direito, como se soubesse o que estava acontecendo.

-Ela também vai morrer, não vai?

-Sim.

-É... Eu imaginava. Ei, Liz.

-Ela está te escutando, apenas não consegue responder porque eu a paralisei.

-Escuta, minha vida nunca foi um exemplo, eu mesmo fui um ser desprezível e mereço o que está acontecendo aqui. Mas em meu pior momento, sem ter mais como me sustentar, estando em uma depressão profunda, querendo tirar a minha própria vida, você esteve lá. Liz, você me mostrou o que é amor, mostrou que a maldade não é nada comparada ao que eu sinto por você. Sei que não fui eu mesmo durante um tempo, e peço desculpas por não ter sido forte o bastante, por ter passado tanto tempo longe, por ter me perdido em minha própria escuridão, por tudo. Apenas quero que saiba que quando eu estava prestes a morrer nas mãos daquele anjo, ainda em estado de insanidade, quando vi que estava lá por mim foi o único momento em meses em que realmente senti novamente um pouco de mim mesmo, que me senti bem, me senti em paz. Eu te amo, Elizabete, espero que nosso amor se perpetue para além da morte. -Após eu terminar de falar, Elizabete contorcia os olhos de tanto chorar, isso foi um sinal de que é recíproco. -Senhor Deus.

-Diga, filho.

-Estou pronto pra morrer.

Ele estendeu uma de suas mãos em minha direção e apontou penas o dedo indicador para mim. De seu dedo saiu uma pequena bola de energia, era clara e do tamanho de uma bola de gude. Senti que a energia contida naquele ponto minúsculo era suficiente até mesmo para destruir um planeta. Olhei para Liz uma última vez, vou guardar essa memória da imagem dela para sempre, assim a procurarei no pós vida, sei que um dia a encontrarei novamente.

Vejo a pequena bola de energia vir em direção a mim em câmera lenta. Enquanto isso escuto Liz gritando desesperada, não sei como ela conseguiu sair da paralisia para gritar, mas agora não importa, chegou meu fim e eu o aceito. Fecho meus olhos e vejo um ser estranho, não parece um homem e nem uma mulher, provavelmente qualquer gênero se encaixaria nesse ser de cabelos morenos e manto negro. De alguma forma também era possível ver por trás da pele de seu rosto, que criatura bizarra, a essa altura do campeonato, acho que só pode ser a morte. A entidade se aproxima, encosta sua mão gelada em minha cabeça e fala algo.

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Oie, espero que tenham gostado do capítulo, aos poucos eu vou voltando a publicar mais.

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