Afterglow

Everything Has Changed

Rael

O casamento da minha mãe com o Murilo foi muito lindo. Foi bem simples, só o burocrático no cartório e depois um jantar na casa deles. Ela estava muito feliz e ele parecia realizado, dava pra ver só pelo jeito que eles se olhavam. Eu e o Otto dissemos algumas palavras, os dois meio sem jeito ainda porque, querendo ou não, é uma situação nova para nós dois. Até a Olívia apareceu em LIVE num telão para felicitar os dois. Ela era muito parecida com o irmão, consegui notar seus olhos puxados nas pontas, como os dele, e o cabelo da mesma cor. Ela também sorria muito e parecia bem espontânea naqueles poucos minutos de interação. Murilo não era muito assim, então acredito que os irmãos tenham puxado isso da mãe.

No jantar também conheci Eduardo, o amigo do Otto que viajou com ele. Pensei que iria conhecer também a namorada dele, mas ela não apareceu. Não sei se não deu pra ela ir ou se não foi convidada. Na verdade, percebi que o Otto mal falava dela, e quando o assunto surgia, ele desconversava. Eu não tinha muitos conhecidos naquela festa, já que tinha acabado de voltar de outro país onde tinha passado alguns anos, também tinha mudado de casa, de bairro... Eu só conhecia mesmo a minha mãe e ela estava tão radiante, tão absorta na sua própria festa de casamento, que preferi não incomodar.

Depois de beber algumas com o Otto e o Eduardo e a maioria das pessoas já terem ido embora, eu fui descansar um pouco no quarto. Tirei o paletó, soltei um pouco a gravata e me joguei na cama do Otto, com um braço sobre os olhos. Minha rede estava lá, mas eu preferi me esticar na cama por um tempo. De olhos fechados, tentei organizar minha mente que estava um turbilhão havia muitos dias, e hoje principalmente. Eram muitas mudanças, muita correria, muita coisa nova pra absorver, e eu nunca tinha sido muito de novidades.

Quando eu era criança, já gostava muito de rotina, de coisas organizadas, eu sempre fui muito sistemático. Sim, essa era a palavra. Minha mãe tentou mudar isso por muito tempo, de acordo com ela, criança tinha que ser bagunceira, mas eu sempre fui uma criança mais quietinha, e eu cresci dessa forma. Morar em Amsterdã só intensificou isso em mim porque lá eles são bem calmos, organizados e rotineiros. Então, é, estava sendo muito difícil pra mim conciliar tudo que estava acontecendo sem surtar nem que fosse um pouquinho.

E ainda tinha tanto pra fazer! Minha mãe e meu novo padrasto iriam tirar alguns dias de lua-de-mel em uma cidade próxima enquanto eu e Otto iríamos organizar as coisas para a mudança ao dormitório. Tínhamos que organizar as coisas, embalar tudo, resolver algumas pendências burocráticas da faculdade, planejar a mudança com os profissionais, organizar nosso quarto, comprar coisas que não tínhamos, limpar, decorar, decidir regras de convivência, nos preparar para o início do semestre... Era tanta coisa que eu já me sentia cansado!

Senti o colchão afundar um pouco do meu lado e levantei um pouco o braço dos meus olhos. Otto tinha sentado do meu lado e me olhava, sorrindo.

Otto, sempre sorrindo.

- Bebeu muito? - ele me perguntou. - Se tiver passando mal, não vomita na minha cama!

- Não estou. - eu sorri e coloquei de novo o braço nos olhos. - Só estou tentando organizar alguns pensamentos acelerados.

- Sei como é... - ele falou baixinho. - Eu vim te mostrar uma coisa.

Ele se ajeitou melhor na cama, mais próximo de mim e eu também sentei. Ele me passou a câmera fotográfica profissional que ele tinha usado durante todo o casamento. Já tinha uma foto na tela.

Eu peguei a câmera da sua mão pra olhar melhor. Na foto minha mãe e Murilo estavam de mãos dadas, segurando suas taças de champanhe com as mãos livres, eu estava sorrindo ao lado da minha mãe e Otto estava com um sorriso aberto do lado do pai, com seu braço repousado no ombro dele. Como sempre passando uma imagem de espontaneidade e leveza. Olhei pra ele, confuso.