Capítulo 16

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Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa de apagar o caso escrito.

-Machado de Assis

NINA:


Três dias, esse era o tempo que havia se passado, e eu não havia visto mais Enrico.

Ele respeitou o meu tempo e meu momento, não tentou se aproximar, não tentou esclarecer mais nada, e eu agradecia por isso. Certa parte de mim, acreditava que o que eu havia escutado era o suficiente para decidir, suficiente para o momento.

Minha rotina com Giulia estava voltando a ser o que era antes do ocorrido, porém ainda com algumas barreiras ainda erguidas, lógico que por mim. Ela não havia tocado no assunto, mas eu sentia o quanto ela queria se aproximar e eu a queria próxima de mim.

Ao entrar na cozinha sinto o cheiro familiar de brigadeiro, a mulher estava de costas mexendo na panela.

— Licença. — Digo e vejo um sorriso surgir em seu rosto, Giulia era uma mulher gentil e doce, que sempre me tratou com muito carinho e não era justo esse afastamento, para nenhuma de nós duas.

— Você chegou no melhor momento, acredito que já está quase pronto. — Me aproximo observando o ponto do brigadeiro.

— Está sim! — Ela concorda desligando o fogão e despejando o doce em uma vasilha, pegando duas colheres. — Vamos conversar enquanto esfria?

— Eu não me arrependo Giulia, não me arrependo em nenhum momento em ter atirado naquele homem para lhe salvar. — Digo com toda a minha sinceridade, ela solta um suspiro então me puxa para os seus braços, me envolvendo no abraço acolhedor que apenas uma mãe pode ter, então me permito chorar, suas mãos acariciam minhas costas, enquanto sussurra palavras de conforto, ela se afasta segurando meu rosto em suas mãos.

— Você é muito corajosa Nina, com o coração mais bondoso que eu já vi. — Sua mão acaricia minha bochecha. — Eu posso imaginar o quanto sua mente está lhe pregando peças sobre tudo o que aconteceu, o quanto você pode estar se julgando e com a consciência pesada.

— Eu fecho meus olhos e consigo escutar os barulhos. — Digo limpando minhas lágrimas. — Enrico me contou, me falou sobre vocês... E-eu pensei que iria me afastar, me desculpe é errado tudo isso, mas eu-Suspiro, controlando minha respiração e emoção. — Eu não consigo ir embora, não consigo simplesmente voltar para o meu país, não consigo deixar vocês.

— E você não precisa, nos te adoramos Nina. — Ela aperta minhas mãos. — Não tenho motivos para lhe mentir, nada nesse mundo é bonito, principalmente para nos mulheres, somos diminuídas, menosprezadas, usada como peças de um grande jogo, eu tive sorte, muita sorte ao conhecer meu querido Anthony, ele sempre me respeitou, conquistei uma posição, eu não fui apenas sua mulher, fui sua parceira de negócios, sua aliada e sua conselheira.

— Sua família já vivia nesse mundo? — Pergunto e ela concorda.

— Me casei com meu marido por acordo Nina, e isso é comum, lembro do pavor que senti eu esperava o pior, mas eu recebi muito amor. — Vejo seus olhos brilharem. — Criei meu filho com muito amor, em casa as coisas sempre diferiram, conseguimos separar o trabalho de família por mais difícil que seja, nosso trabalho não é bonito, mas honramos ele e fazemos tudo pela família, não existe outra escolha.

— Me sinto nervosa, por medo de estar deixando uma parte de mim, fugir, eu matei um homem e sei que mataria novamente se fosse necessário salvar qualquer um de vocês.

— E nos mataríamos por você, isso é a família defendemos uns aos outros, custe o que custar.

Minha mente está em uma guerra entre o que era o moral e o que era o meu desejo. Meu desejo era continuar aqui, escolhi a Itália, pois buscava um recomeço, uma nova vida, e pelas consequências do destino vim parar aqui com a primeira família em minha vida que me acolheu e realmente gosta da minha companhia.

Sinto-me bem estando com eles, no fundo, tenho uma sensação a qual eu vim buscando todos esses anos, a de pertencimento. Eles me mostraram o como é bom ser acolhida, como é bom passar os domingos em família, acolheram uma estranha com todo amor e carinho. E tem Enrico, que mexeu comigo de todas as formas possíveis, formas nas quais eu jurei erguer uma barreira, pois eu já era machucada de mais para novos estragos.

O que minha moral havia me entregado até agora? Uma consciência limpa, mas uma vida triste e sozinha. Eu teria capacidade de me cegar diante das crueldades que posso ver, até que ponto eu aguentaria?

Pela primeira vez eu me senti realmente feliz, mas que custo minha felicidade teria? Infelizmente só tem um jeito de descobrir, ficando.

— Giulia eu não quero ir embora, já tomei minha decisão eu irei ficar.

Por Destino -Família MartinelliOnde histórias criam vida. Descubra agora