Capítulo 6

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— Eu gostava mais quando a senhora ia em casa — declarou Alicia com toda franqueza.

— Por quê? — perguntou Any.

— Não sei. Parece que a gente tinha mais assuntos para conversar...

— Alicia, você pensou naquilo que eu lhe disse sobre o seu quarto?

A menina começou a torcer um cacho, sinal de que estava apreensiva. Muitas crianças possuíam pequenos hábitos, que revelavam seu estado de espírito. Alicia, pelo visto, ainda lutava com uma decisão.

— Não sei o que devo guardar...

— Você pediu ajuda ao seu tio?

— Ele vai viajar amanhã.

— Tenho certeza de que ele está disposto te ajudar, se você pedir, Alicia. Se divertiu com sua amiga no sábado? Como é mesmo o nome dela?

— Jill. Sim, foi legal. Puxa, ela é louca por meninos! Sabe de uma coisa? Acho que meu tio Josh gosta da senhora.

— É mesmo? — Any queria evitar o assunto, mas não sabia como agir.

— Ele contou que pintou sua casa, enquanto eu estava com Jill.

— Não foi a casa inteira, apenas dois cômodos.

— Ouvi tio Josh dizer à Sra. Cates que ele a convidou para jantar. Sabe, ele nunca convida ninguém para vir em casa, pelo menos desde que eu fui morar lá.

— Talvez porque você ainda não tenha tido tempo de se acostumar, Alicia. Seu tio quer que você torne a ser feliz. Quem sabe quer que você se sinta mais à vontade com ele, antes de convidar seus amigos?

— Mas eu não gosto daqui! — declarou Alicia com agressividade. Seus olhos se encheram de lágrimas. — Quero ir para casa. Quero que tudo volte a ser como era, antes... antes...

— Antes do acidente. Não quer falar sobre isso, Alicia?

Ela sacudiu a cabeça e parecia muito infeliz.

— Você sabe o que aconteceu ou estava dormindo?

— Não quero falar disso! — decidiu Alicia, levantando-se rapidamente e correndo para a porta.

Any aproximou-se e pôs as mãos em seus ombros frágeis.

— Isso não passará só pelo fato de você não querer se lembrar. A raiva e a mágoa que você sente é que a tornam tão triste. Quem sabe em breve conseguirá me contar o que aconteceu?

De repente, num gesto impulsivo, Alicia jogou-se nos braços de Any, que a acolheu.

— Eu não quero que nada mude!

— Eu sei, eu sei, mas não é possível!

— Seu pai e sua mãe também morreram?

— Não. Perdi meu marido e...

— A senhora é casada?

— Fui. Assim como aconteceu com seus pais, houve um desastre. Levei algum tempo para me acostumar a ficar só, mas eu tinha minha mãe, assim como você tem o seu tio Josh.

— Que coisa! — exclamou a menina, como se tivesse ficado sabendo de um segredo muito precioso. Abraçou a moça com força, consolando e sendo consolada. Aquela atitude tocou Any mais do que as palavras.

— Que bom que você é minha amiga! — disse a garota.

No seu sorriso havia a inocência que só mesmo uma criança possui. 

— Lembra-se de que eu disse que meu tio Josh vai viajar amanhã? Pois bem, sexta-feira vai ter uma festa na minha escola. Ainda não posso tomar parte, nem brincar. Vou ter de ficar sentada, olhando. Será que... você não quer ir? Os pais de todas as crianças vão estar lá e você podia ficar fazendo companhia para mim. Seria tão divertido!

Desejo Ardente [ Beauany ]Onde histórias criam vida. Descubra agora