One

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Na última vez que estive nesse aeroporto eu prometi que não voltaria para essa cidade. Falei para mim mesma que eu mudaria a minha vida e esqueceria tudo que vivi no passado, mas não se pode abandonar totalmente os laços que você criou durante toda a sua vida. 

Estar nesse aeroporto me faz lembrar daquele que eu mais me esforcei para esquecer. "Eu vou esperar por você, Eda" foram as últimas palavras que ouvi antes de entrar no avião, mas minhas últimas palavras ditas foram que eu não iria voltar.

No entanto aqui estou eu, quase sete anos depois, voltando para minha cidade natal. 

— Mamãe, vai demorar muito para conhecermos a nossa nova casa? 

— Não, meu amor, mamãe só precisa encontrar um táxi. 

Minha filha, Kiraz, está comigo. Ela tem sido minha única família nos últimos anos e o bem mais valioso na minha vida. 

Ser mãe tão jovem não foi uma missão fácil, principalmente quando eu estava em outro país com apenas uma bolsa de estudos e um salário que dificilmente dava para comprar fraldas, mas eu consegui e esse é o meu maior orgulho como pessoa. 

Enfim, encontramos um táxi e o motorista nos ajuda a organizar nossas malas no carro. O percurso do aeroporto até a minha antiga casa é curto, mas posso perceber que durante esses anos pouca mudança aconteceu. As ruas continuam as mesmas, o trânsito caótico continua o mesmo, lojas de antigos conhecidos meus também continuam abertas... é como se eu não tivesse ido embora. 

— Olha mamãe, quantas flores! — Kiraz diz admirada quando o carro entra na rua onde vamos morar. 

— Está lindo, não está? — Também fico admirada. 

— Era assim quando você morava aqui antes de eu nascer? — ela pergunta.

— Não, não era assim, mas que bom que agora tem tantas flores não é? É a nossa rua — aviso a ela. 

— Mamãe, tem árvores de cereja igual ao meu nome! — Kiraz dá pulinhos no chão quando descemos do carro e ela percebe as cerejeiras. 

— Sim, essas sempre existiram — explico pra ela quando pego as malas e caminho até a frente da minha antiga casa — Sempre pensei em colocar o nome da minha filha de Kiraz porque aqui era o meu canto favorito no mundo, assim como você é a minha pessoa favorita no mundo. 

Contar a ela a origem do seu nome acaba despertando memórias de quando estive sob essas árvores com ele, meu melhor amigo. 

— Nós podemos brincar aqui? — ela pergunta animada. 

— Podemos, mas não agora — enfim chego à porta da casa e coloco minha chave — primeiro precisamos arrumar nossas coisas e descansar, tudo bem? 

Mostro a casa para Kiraz e percebo que até aqui pouca coisa mudou, porque até os móveis continuam os mesmos. Suspiro pensando sobre como apesar de amar tanto esse lugar, essas paredes ainda me trazem lembrança das brigas frequentes que aconteciam entre os meus tios.

Se estou aqui hoje é porque herdei o lugar, eu não vim para ficar, mas eu precisava estar aqui para ver a casa uma última vez antes de vendê-la. 

Alguns meses atrás recebi a ligação de que meus tios morreram em um acidente de carro e que eu precisava retornar a cidade porque eu era a única pessoa que ficaria com os bens deles. Foi um baque de repente me ver órfã de novo, sem nenhum familiar, mas eles não falavam comigo desde o dia que contei que estava grávida, então eu não imaginava que eles ainda teriam quaisquer considerações a mim. 

Fico triste porque as memórias que guardo deles não são boas. Quando meus pais morreram eu era muito nova, então fui mandada para morar com os familiares mais próximos, o que me trouxe até minha tia e seu marido. Os dois me aceitaram, mas não me acolheram... minha tia não era tão ruim, Ayfer cuidava de mim, mas mudava completamente quando estava na presença do seu marido. 

ALL IN MY HEADOnde histórias criam vida. Descubra agora