Cap II - Mesa dos populares

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POV: Lily

(...)

Deixei uma semana passar. Nesse tempo, fui planejando o que eu queria para o trabalho. Depois que organizei tudo, armei o meu plano para colocar Sue contra a parede. Ela teria que fazer aquele trabalho comigo, por bem ou por mal.

Na hora da entrada, fiquei olhando fixamente para ela e o seu grupinho, mas Sue nem reparou, apenas ficou focada nas conversas e risadas. Resolvi enfrentá-la apenas no intervalo. Eu precisava reunir um pouco de coragem para conseguir o que eu queria.

Quando o sinal do intervalo tocou, fui até o armário, peguei um papel, anotei o endereço do lugar que eu queria que ela me encontrasse e respirei fundo. Sue e sua turma passaram por mim e aquela pose de superior deles me deixou enjoada. Sério, eles se achavam os maiores, sendo que não passavam de um bando de adolescentes normais.

Peguei o meu lanche e sentei no meu canto de sempre. As mesas sempre ficavam ocupadas com os grupinhos e eu, como não tinha amigos, ficava longe de todos e sentada perto das janelas, no chão mesmo. Podia ser meio solitário, mas a verdade era que eu amava aquele lugar. Dava para ver o movimento da rua, sentir a brisa do ar, admirar a chuva caindo em dias chuvosos e pensar em coisas super aleatórias. Tem coisa melhor?

Quando terminei de comer, peguei o papel e me aproximei da mesa da Sue. Ela nem ergueu o olhar e todos fingiram que eu não existia. Tentei não me intimidar com aquilo e falei:

— Adams, é aqui que você precisa ir pra fazer o trabalho de biologia.

Deixei o papel na mesa e ela ficou me olhando sem entender nada, até torceu o nariz. A maioria do grupinho dela ficou tentando segurar o riso, mas eu continuei com o olhar na Sue, esperando a fala dela.

— Quem é você? — ela perguntou.

— Não se faça de sonsa. — Cruzei os braços. — Ou você aparece ou fica sem nota.

E saí andando. Não queria ver a reação daquelas pessoas chatas. Só queria fazer o meu trabalho em paz. Pensei que ter Susan Adams como dupla seria interessante, até descobrir que ela era uma chata com complexo de estrelinha.

Naquela mesma tarde, fui para o parque com a minha câmera. Sinceramente, eu não esperava que a Sue aparecesse por lá, mas fui surpreendida quando olhei para o lado e vi ela vindo na minha direção com o moletom dos atletas e uma expressão nada boa.

— Olha só, você veio — falei.

— Eu estava passando por aqui. Não tinha intenção nenhuma de ver esse trabalho, mas já que tô aqui, o que quer?

Claramente ela não queria admitir que veio porque eu pedi, mas relevei e contei:

— Bom, eu pensei em montar uma casa de pássaros e ver como eles respondem a isso. Podemos tirar fotos pra colocar na apresentação e no relatório. — Mostrei a câmera. Ela deu uma risada sarcástica e eu a olhei sem entender nada. — O que foi?

— Eu tenho várias coisas pra fazer. Acha mesmo que eu vou perder o meu precioso tempo montando uma casa de pássaros sendo que dá pra simplesmente comprar uma?

— A magia da coisa tá justamente em montar a casa.

— Não me importo com a magia da coisa. — Ela olhou para o celular. — Minhas meninas estão me esperando.

— Adams, fala sério. O trabalho é em dupla, você precisa me ajudar. Se tiver uma ideia melhor, pode falar.

— Eu compro a casa e você tira as fotos. Pronto.

— Não. Vai ser mais legal se fizermos a casinha.

— Se você quer tanto fazer isso, por que não faz sozinha?

— Porque você é a minha dupla — insisti.

— Eu tô de dando uma opção, mas você quer complicar. — Ela deu de ombros.

— Eu só não quero que seja mais um trabalho. Quero que seja algo legal de fazer. Isso não deveria ser só sobre a nota.

— Pra mim, é só sobre a nota. — Ela olhou para o celular outra vez. — Eu realmente preciso ir. 

Suspirei e ajeitei os meus óculos. Não tinha muito o que fazer, mas esperava que ela levasse aquele trabalho mais a sério. Quem diria que ela seria tão chata. 

— Ok — falei. — Mas não pense que vou desistir.

Ela revirou os olhos e saiu. Fiquei no parque tirando fotos dos pássaros que apareceram para começar o projeto da casinha. Precisaria ser compatível com a maioria que vivia por ali. Eu fazia parte de um grupo que cuidava daquele parque e um dos nossos projetos era montar casinhas. Eu só ia unir o útil ao agradável, mas saber que a minha dupla não queria participar era bem ruim e me deixou irritada.

Depois de passar um tempo por lá, voltei para a minha casa e fiquei esperando a minha mãe e minha irmã chegarem. Para passar o tempo, comecei a pesquisar sobre os pássaros e ideias de casinhas para eles. 

Na hora do jantar, Kari, a minha irmãzinha de nove anos, não parava de falar. Ela adorava contar sobre o seu dia e eu sempre ouvia. Porém, naquele dia eu não estava muito bem e acho que ela reparou, mesmo sendo tão novinha.

— Lily, o que você tem?

— Nada. Por que acha que tem algo?

— Você não tá prestando atenção em mim.

— Tô sim. Nem tudo é sobre você, Kari. Às vezes, as pessoas têm dias ruins e querem ficar quietas.

— Mas eu quero conversar com você. — Ela fez um biquinho.

— E eu quero que você cale a boca.

— Lily — minha mãe disse em tom de repreensão. — Não fale assim com ela.

— É só a verdade. — Dei de ombros. — A Kari sabe que eu amo ela.

Apertei a bochecha da minha irmã e ela riu. Só assim a minha mãe sossegou.

— Minhas amigas vão vir aqui amanhã — Kari disse, mudando repentinamente de assunto.

— Legal — falei.

— Por que você não traz as suas amigas também?

— Porque não.

— Você não tem amigos?

Suspirei e tentei pensar em uma resposta. Eu nunca fui de ter muitas amizades, mas nem era por timidez ou coisa do tipo. Acho que os meus assuntos não eram interessantes o suficiente para as pessoas, então eu só tinha algumas amizades superficiais que falavam comigo de vez em quando nos corredores. Quando achavam pessoas mais legais, os meus “amigos” me abandonavam. Se tem uma coisa que eu aprendi na vida é que, se você entrar no ensino médio sem um grupo, as chances de você conseguir entrar em um durante esse período são baixas. Pelo menos foi o que aconteceu comigo.

— É que não temos tempo de ficar indo na casa um do outro — disfarcei.

— Mas eu quero conhecer os seus amigos.

— Kari, foca na comida. — Coloquei um pouco de macarrão na boca.

Depois desse momento, a minha mãe começou a contar como foi o seu dia de trabalho e também avisou que o nosso pai estava perto de voltar para casa. Ele era caminhoneiro, então sempre estava viajando. Eu sentia falta, às vezes ficava brava com ele, mas depois entendia que a culpa não era inteiramente dele. Enfim, é uma parte complicada da minha vida.

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