Fiquei na casa dos meus pais por toda a tarde. Se não fosse por toda a confusão, eles iriam até a minha casa para a ceia, mas eu realmente não sabia se teria clima para isso. Sendo assim, o meu pai resolveu ir ao mercado e comprou o maior frango que conseguiu achar.
— Pelo menos a imitação do peru nós vamos ter — ele disse e demos risada.
— O que importa é estarmos com pessoas que amamos — minha mãe disse e olhou diretamente para mim. — Conversou com a Cecília? — Neguei com a cabeça. — Por quê?
— Não quero correr o risco de brigar com ela de novo.
— E vão ficar sem se falar na véspera de Natal? — Sheila ergueu uma sobrancelha.
— Eu tenho certeza de que ela vai tentar me convencer a voltar pra casa e eu não quero encontrar os Campanas.
— Por que não chama ela pra vir pra cá?
— Cecília não vai deixar os pais dela pra vir passar o Natal aqui comigo.
— Você nem tenta, filha.
— Não vale o esforço. — Dei de ombros.
— Você não tá com raiva dela, né?
— Não. — Balancei a cabeça para os lados. — Tudo o que eu queria era ficar com ela hoje, mas é impossível com a família dela lá.
Minha mãe se aproximou de mim e tocou no meu ombro. Em seguida, ela disse:
— Cecília é a única que presta daquela família. Os pais dela são terríveis. Nem eu quero me misturar com aqueles dois.
— Pois então. Só queria que todo mundo se entendesse.
— Talvez um filho resolva — meu pai disse e eu soltei uma risada nasal.
— Quer resolver igual nos tempos medievais? — brinquei e nós três rimos.
— Bom, eu concordo com a sua mãe. Eu não gosto deles e eles não parecem gostar da gente. Ainda bem que Cecília é diferente.
— É — falei e suspirei.
Nossas famílias tinham um certo desentendimento e eu odiava aquilo. Pensei no meu filho e em como ele ficaria no meio daquilo. Eu esperava que a chegada dele amenizasse a situação entre Campanas e Viteris.
Ajudei os meus pais e preparamos algo para comer na ceia improvisada. Fizemos arroz, salada com várias folhas e tomate, farofa temperada e o frango que representaria a ave de Natal. Ficou tudo bem simples, mas foi feito com todo o amor que reinava naquela casa.
À noite, estávamos sentados no sofá assistindo a filmes de Natal quando ouvimos a campainha tocar.
— Filha, vê quem é — meu pai pediu. — Por favor.
Eu me levantei e fui até a porta. Quando eu abri e vi quem era, logo desviei o olhar para o chão.
— Oi, Mari — Cecília disse. Ela trazia uma mochila consigo.
— Oi. — Abracei o meu próprio corpo. — O que tá fazendo aqui? Não deveria estar lá em casa com a sua família?
— Talvez, mas eu precisava te ver.
— Pra quê? Acho que já escolhemos os nossos lados essa noite.
Ela balançou a cabeça para os lados e encarou o chão.
— Mari, só me escuta — Cecília disse com toda a calma que sempre teve. — Eu fiz a ceia sozinha e pensei que eu não ficaria mal com uma coisa tão boba assim, principalmente considerando que eu adoro cozinhar, mas foi triste fazer tudo sem ajuda. — Ela deu de ombros e vi os seus olhos brilhando. — Pensei que faria com você ao som de uma playlist montada por nós, tendo a sua ajuda e opinião nos temperos, na decoração. Seria como criar uma tradição só nossa. — Minha mulher respirou fundo e colocou as mãos no bolso da calça. — Enfim, eu só queria dizer que você tem razão. Nós duas amamos o Natal e eu sei o quanto você estava animada e esperando essa data pra passar na nossa nova casa. Agora temos mais espaço pra fazer festas, decorar do jeito que quisermos, criar as nossas próprias tradições. — Ela sorriu levemente, mas logo voltou a seriedade do começo. — Mas eu sei que os meus pais fizeram tudo ficar mais complicado e olha como estamos em plena véspera de uma das datas mais legais que existem.
— Não é culpa sua. — Tentei tirar aquele peso dela.
— Eu sei, mas me sinto responsável por toda a situação. — Ela deu de ombros. — Mas eu conversei com eles e dessa vez foi pra valer. Falei coisas que eu nunca pensei que teria coragem, mas foi ótimo dizer como eu realmente me sinto.
— E eles?
— Agiram do jeito mais Campana de ser. Apenas saíram da sala e não disseram muitas coisas. — Ela suspirou. — Mas agora eles sabem o porquê do meu amor por você, se é que pude colocar em palavras. Só fiz questão de contar alguns dos motivos que me fazem ser apaixonada por você, além de explicar o porquê de ter vindo morar nessa cidade.
— E eles acreditaram?
— Não sei e, sinceramente? Não ligo. Cansei de dar satisfações da minha vida pra eles. Não sou mais uma criancinha e não preciso ter a minha vida controlada por opiniões dos dois.
— Cecília Campana finalmente cresceu — brinquei e ela soltou uma risada nasal.
— Enfim, amor. — Ela respirou fundo e voltou ao foco da questão. — Eu tô aqui porque eu quero passar o Natal com você. Não importa se seja só eu e você em cima de um telhado olhando as estrelas, deitadas na nossa cama no nosso abraço gostoso, em uma balada onde com certeza eu vou ter que cuidar de você. — Nós demos uma leve risada e eu troquei o peso de uma perna para a outra. — Também pode ser em um parque admirando as luzes de natal, no meio da minha família difícil de lidar ou da sua que é uma calmaria. Eu só sei que, quando der meia noite, eu quero estar do seu lado porque você é o meu presente de todos os Natais. O que importa é eu, você e o nosso brotinho. — Ela colocou a mão na barriga e eu ri fraco.
— Brotinho? Colocou um apelido no nosso bebê?
— É muito ruim?
— Não, eu adorei.
Ela sorriu e tirou a mochila das costas. Em seguida, Cecília explicou:
— Bom, eu trouxe a roupa que você queria usar na ceia. — Ela me entregou. — E não sei se você me quer por perto hoje, mas, como eu já disse, precisava te ver.
A preocupação dela comigo era uma das coisas que eu mais achava fofa. Sério, acho que nem os meus pais eram tão atenciosos comigo como a minha esposa era.
— Obrigada — falei e estendi a minha mão. — E vem cá.
Ela segurou e eu a puxei para mais perto de mim. Nós nos beijamos rapidamente e nos abraçamos. Era tudo o que eu queria. Ouvir aquelas palavras foi tão reconfortante.
— Eu quero passar o Natal com você — falei. — Vamos pra casa.
— Sério mesmo? — Ela parecia desacreditada.
— Sim. É a nossa casa. Precisamos mostrar que é o nosso território — brinquei e ela riu.
— Então vamos.
Trocamos mais alguns beijinhos e entramos em casa. Meus pais cumprimentaram a Cecília e eu fui trocar de roupa. Depois, ajeitamos as comidas e, em pouco tempo, todos nós estávamos a caminho da minha casa. Confesso que a minha ansiedade estava em um nível bem alto, mas, pela mãe do meu filho, eu faria qualquer coisa. Como ela havia dito, o que importava era nós duas e o nosso brotinho. Sendo assim, eu tentaria dar mais uma chance aos Campanas.
Chegamos em casa e Ceci abriu a porta. Os meus sogros e o meu cunhado estavam no sofá e pareceram surpresos ao me ver entrar.
— Mãe, pai e Benito — Cecília começou. — Espero que tenham entendido o recado e, por favor, sejam uma família civilizada.
— Sempre somos — Madalena disse.
— Enfim. — Minha mulher respirou fundo. — Vou colocar uma música e podemos dar início à nossa festinha.
Enquanto Cecília arrumava tudo, fiquei conversando com os meus pais. Os Campanas ficaram no mundinho deles, mas a minha esposa tentava fazer todo mundo interagir. Eu não estava muito a fim, mas tentei. Não posso dizer que deu certo, mas pelo menos não houve provocações de nenhuma parte.
(...)
— Ufa, pensei que teria outra briga — Nico disse. Eu e Cecília rimos.
— Bom, ficou um clima estranho — minha esposa respondeu. — Mas pelo menos todo mundo comeu a ceia em paz.
— E a reviravolta veio na manhã de Natal — falei.
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Projeto Clichês
RomanceEsse livro é um conjunto de 5 histórias clichês com sáficas como protagonistas. Tem amor a primeira vista (ou pelo menos uma curiosidade ao primeiro olhar), enemies to lovers, strangers to lovers... Enfim, temas clichês já bem conhecidos por todo mu...