Capítulo 2

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O garoto parecia ainda mais nervoso naquela sala do que quando abordou Muriel naquela manhã, a mão trêmula segurava um copo de água e seus olhos vagavam entre Lleaud e  Muriel. Enzo Ramirez, era o nome dele, mas as informações acabaram aí, ele ficara nervoso demais para continuar a falar e eles estavam esperando que ele lhes dissesse como conseguira a arma e porque tentou matar Muriel.

-Quem você pretendia salvar puxando o gatilho daquela arma? - Muriel perguntou impaciente, tentando manter a voz mais calma o possível.

-Minha irmã, ela desapareceu a nove dias.

-Precisamos de todas as informações que você tiver, Enzo - Lleaud começou - Queremos te ajudar, mas você precisa colaborar.

-Alice Ramirez, ela é minha irmã mais velha, nossos pais nos abandonaram assim que ela completou 18. Transferiram minha guarda pra ela e desapareceram, recebia bolsa na faculdade de medicina veterinária e fazia alguns trabalhos como fotógrafa. Minha irmã e o noivo, estavam no mesmo curso, Guilherme, ele é um shifter lobo, como você - ele apontou para Muriel - Gui nos praticamente nos mantinha, ele insistia que Ali e eu focássemos nos estudos, então ele cobria todas as despesas da casa. Recebemos uma ligação a duas semanas, ela havia sido escolhida para uma entrevista de intercâmbio, eu poderia ir junto e todas as nossas despesas seriam por conta da instituição, seria uma oportunidade única e Gui também iria com a gente. Ela desapareceu no dia da entrevista, no dia seguinte, Gui também desapareceu.

-Eles são companheiros? - Muriel perguntou

-Sim, Gui se mudou para a casa ao lado da nossa quando Ali tinha dez anos. A amizade deles foi um dos motivos pelo qual nossos pais não gostavam da minha irmã.

-Suponho que eles tenham aceitado a notícia do namoro muito bem, então - Lleaud ironizou - Você sabe o endereço onde ela faria a entrevista? 

-Não, ouvi ela falando com alguém da turma dela pelo telefone, mas não sei dizer quem.

-Quem mandou você vir me matar?

-Não sei, encontrei a arma e um bilhete na minha caixa de correio.

-Obrigada, Enzo. 

-Vocês vão tentar encontrá-la?

-Claro que sim, mas, por enquanto, queremos que fique seguro, você vai passar uma estadia na Land até encontrarmos sua irmã.

-A polícia disse apenas que ela fugiu, isso não é verdade, minha irmã não faria isso.

-Sabemos disso, prometemos que vamos fazer o possível para encontrá-la.

Enzo assentiu, Muriel o associou com um pequeno homem, mesmo com a pouca idade, ele parecia maduro demais nessa situação. Ela ouviu Lleaud dando instruções antes de perceber que seus guardas levaram a criança para fora da sala dela.

-É mais um caso da investigação da Hannah, não é? - Lleaud perguntou.

-Sim, ela vem lidando com esses sumiços a meses, sempre um casal humano/shifter, sempre o humano primeiro e, tenho certeza, se procurarmos o nome deles nos clubes de BDSM vamos encontrar em pelo menos três.

-Não encontramos nada até agora.

-Vamos começar com os colegas de faculdade, a pessoa que ajudou ela a encontrar o endereço. Vou ligar para Hannah durante o percurso, tenho certeza de que ela não vai querer ficar de fora dessa investigação.

-Sim, senhora.

-Acione a Security Corp, vamos colocar um casal disfarçado nos clubes, precisamos deles na nossa retaguarda e Hannah também...

Muriel parou de andar e Lleaud fez o mesmo, um homem vestido de terno e gravata barrava o caminho deles no corredor, o linhagem o reconheceu como pai de Hannah. Ouve boatos de que os pais dela não estavam nem um pouco felizes com o rumo que a vida de sua única filha tinha tomado, mas Lleaud não os conhecera pessoalmente até hoje, nada além das reclamações de Muriel sobre o quão babacas eles eram.

-Davidson - Muriel cumprimentou, fazendo menção de seguir seu caminho. O senhor imitou os passos dela, continuando em sua frente - Não estou com paciência e nem vontade de dançar tango com você, saia da minha frente.

-Ser uma shifter lobo não te dá o direito de ser uma cadela - o advogado comentou.

Lleaud deu um passo a frente parando assim que Muriel fez sinal para que ele parasse.

-Você pode me chamar de cadela ou qualquer outra coisa, não me importo, desde que você não se esqueça que eu sou a chefe aqui e tenho o poder de pisar em cada caso de cliente culpado que você insiste em aceitar. Então, se você não tem nada de importante a me dizer, estou ocupada no momento, deixe os documentos na mesa da minha secretária e suma da minha frente.

Dessa vez, quando Muriel desviou do homem, ele não a impediu. 

-Vocês têm um histórico negativo - Lleaud comentou quando deu partida no carro, depois de fazer o restante do percurso em silêncio.

-Odeio advogados que vendem o próprio caráter e consciência.

-Ouvi algo parecido de Párduc, ele comentou que os pais de Hannah pareciam robôs sem emoções.

-Essa é só a ponta do iceberg...

Muriel se fechou depois desse comentário, ele sabia que não deveria mais incomodá-la, o notebook estava aberto em suas pernas enquanto ela pesquisava sobre a garota desaparecida, sua companheira precisava estar sempre preparada, odiava informações que a pegavam com a guarda baixa. Os vinte minutos que levaram para chegar ao campus foi o tempo necessário para que ela obtivesse as informações de Alice que seu irmão não deu, inclusive o nome de seus colegas de classe. Para a sorte deles, hoje era dia de aulas práticas, então a turma toda estava presente, levou quase o dia todo para que eles questionasse os companheiros dela, mas nenhum deles tinha a informação que eles queriam.

-Inferno! Isso parece ter sido uma perca de tempo! - Muriel praguejou.

-Não ainda, esquecemos um.

-Falta alguém? Entrevistamos todos que estão aqui.

-Ele não está aqui, a última garota comentou sobre ele, Félix Santori.

-Eu ouvi esse nome algumas vezes, ele terminou as aulas práticas pela manhã, antes de chegarmos.

-Os colegas disseram que ele está na biblioteca.

-Não custa nada tentar.

Eles observaram ao redor enquanto caminhavam na direção que os alunos indicaram, por algum motivo, Lleaud estava ficando tenso, não havia nada de incomum naquela situação, ele era um dos linhagens que mais trabalhava fora da Land, considerando o trabalho de sua companheira, mas ele estava apreensivo naquele momento. Muriel foi a primeira a entrar no lugar praticamente vazio, só havia duas pessoas na biblioteca e uma delas trabalhava lá. Lleaud descobriu o motivo de sua ansiedade assim que sentiu o cheiro cítrico suave vindo do homem sentado a alguns metros de distância. Eles caminharam até a pessoa concentrada em suas anotações, ele parecia focado nos livros abertos em sua mesa, mas levantou o olhar quando percebeu estar sendo observado.

Linhagens - LleaudOnde histórias criam vida. Descubra agora