A rua brilha como se estivéssemos nas festividades de fim de ano, mais especificamente no Natal. Preciso do cuidado de Analu para me manter em linha reta, na calçada, e não acabar atropelando meus passos em direção a avenida movimentada.
Sinto que estamos cometendo uma loucura, andando às duas da manhã em direção ao supermercado que fica aberto 24 horas, mas isso não é o tipo de coisa que deixa Gemma ou Analu ─ que ao lado dela se torna surpreendentemente corajosa ─ com medo. Não posso ser a única covarde, então assumo minha postura de valente.
Estreito os olhos e puxo as meninas para o canto do muro ao ver um carro parando perto de nós. Não deixo que elas falem, apenas peço para que continuem andando com cuidado, para não mostrar que estamos com receio. Será que quem quer que esteja nesse carro é capaz de arrastar nós três para dentro dele? De despachar nossos corpos em um terreno abandonado sem levantar suspeitas?
Gemma me para subitamente e aponta descaradamente para o carro. Um rapaz está encostado nele de modo despreocupado enquanto uma garota se aproxima com toda a felicidade do mundo, beijando-o e declarando para a rua inteira o quanto estava com saudades de seu noivo que supostamente viajou por longos meses. O homem lhe entrega um buquê brega de rosas e o grito de contentamento é tão estridente que arranha minha audição junto ao barulho das buzinas dos outros carros que parecem corresponder ao momento clichê de filme adolescente.
Reviro os olhos e faço com que minhas amigas apressem o passo.
─── Todos concordamos que a Clara tem que parar de ser assim? ─── Gemma fala com uma árvore em uma propriedade desconhecida. Um risco aparece na escuridão e depois late, um cachorro irritado pela delimitação do portão de ferro que não o deixa avançar mais em nossa direção. A garota dá um pulo e em seguida sorri para disfarçar. ─── Viu? Até o cachorrinho concorda, então é um sinal.
─── Você estava falando com uma árvore, eu não vou te levar a sério por causa de um cachorro que queria nos atacar, Lima.
─── Não fala do doguinho. ─── Analu resmunga e Gemma concorda. ─── Enfim, conte a Gemma sobre a festa, as perguntas sobre os namorados.
─── Você quer que eu me jogue na frente de um desses carros?
Gemma ri e passa os braços ao meu redor como um ato de proteção. Eu gostei dela desde a primeira vez que nos vimos, principalmente quando ela se mostrou uma ouvinte tão boa quanto a minha melhor amiga.
─── É o que temos todo ano. ─── digo murcha após alguns segundos de silêncio.
─── Fazem cinco anos... O príncipe da Clara foi o primo dela, o Giovanni. ─── Ana Lucia diz, se lembrando daquele desastre que eu tive cinco anos atrás como aniversário.
─── Eu gosto do Giovanni, ele é o meu xará. ─── Gemma fala, mas tenho certeza que é mais pela primeira letra do nome que ela partilha com o meu primo. Se bem que Gio realmente é gente boa com a maioria das pessoas e se deu bem com a Lima, nos únicos cinco minutos em que ficaram próximos o bastante para conversar.
Finalmente alcançamos as portas automáticas do supermercado que está praticamente deserto se ignorarmos as garotas dos caixas e o gerente sonolento. Quando o sensor da porta apita como um alerta, eles parecem despertar, mas não gosto nenhum pouco disso. Agora que a festa acabou e que estou só o bagaço, me sinto estranha com o vestido verde esmeralda que me aperta como se eu fosse uma salsicha podre.
─── Até me esqueci porque viemos ao supermercado. ─── profiro analisando as prateleiras repletas de guloseimas.
─── Eu lembro que viemos a pé pra economizar o dinheiro para o Uber. ─── Analu fala. É a nossa jovem adulta responsável.
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UMA GEMA PARA CLARA
RomanceAtualmente Clara Agostini se vê presa na casa dos vinte, sem grandes conquistas e um bom planejamento para o futuro, contudo, a maior preocupação da família está voltada para o fato de a garota não ter apresentado sequer um primeiro namorado; ela de...