Capítulo 10: A garota popular.

17 4 0
                                    

O céu não está ao meu favor hoje. Depois de um calor escaldante, do tipo que é capaz de te queimar mesmo na sombra, fomos agraciados por um dilúvio que inundou as ruas por três dias seguidos. Nesse tempo, apostando se os tetos das casas sairiam voando, acho que todos nós ficamos meio melancólicos e de mal-humor, ainda mais quando as redes de Internet começaram a falhar e acabaram nos condenando ao tédio inevitável. Eu, por exemplo, fiquei presa com meus pais, escutando as indiretinhas sobre o reality show que, segundo a opinião deles, é um jeito estranho de arranjar um primeiro namorado. Por incrível que pareça, fui capaz de me proteger da irritação ao pensar que nada nunca está bom para esses adultos que só sabem resmungar e falar mal das decisões de seus descendentes.

Enfim, como estava impossível de sair de casa, as gravações de Uma Gema Para Clara foram adiadas. Daeshim mandou mensagem ontem e falou que estávamos muito atrasados e que, independentemente do clima dos próximos dias, deveríamos dar continuidade aos episódios urgentemente ou perderíamos os inscritos antes que a coisa começasse a fazer sucesso de verdade e fosse reconhecida pelo Brasil inteiro. Não é por mal, porém, às vezes acho que o meu querido amigo está mais interessado em ganhar êxito no projeto do que me ajudar a ser feliz. Agora que a emoção do início passou e minhas amigas tiveram que retornar para as suas vidas adultas, Dash praticamente cuida de tudo; roteiro, maquiagem, figurino e edição. Talvez seja uma forma de mostrar para a família que fez certo quando decidiu cursar cinema. Eu acho meio inusitado essa obsessão que ele tem de provar coisas para seus pais que, humildemente falando, são as pessoas mais ricas que conheço. Não deveria ser meio tranquilizador? Ter dinheiro o suficiente para sustentar umas cinco gerações do seu sobrenome na moleza?

─── Eu estou um pouco desanimada. ─── confesso, arrumando a costura da jaqueta nos braços.

─── Quem não está? ─── Daeshim diz e se abaixa na minha frente para dobrar a barra da minha calça. ─── Para a sua sorte, eu fui bondoso e marquei o encontro com uma pessoa muito especial.

─── Quem?

─── Aline Guedes. ─── ele desliza os dedos para o meu tênis, refazendo o nó que eu tinha feito no cadarço. ─── Você parece uma criancinha se arrumando.

─── Ela era legal no ensino médio, mas as pessoas mudam. ─── falo enquanto avalio o novo nó no meu cadarço. ─── Dash? ─── o chamo e ganho um murmúrio como resposta. Ele ainda está se concentrando na combinação das minhas roupas para esse encontro. ─── Você também parece meio triste.

─── Acho que estou com saudades da Betsy.

Nos dois primeiros dias de enchente, Betsy ficou na casa do namorado, certamente feliz pela liberdade que ganhou porque os sogros ficaram presos na praia ─ não deixei que Daeshim me contasse os detalhes do que fizeram no período que passaram sozinhos. A questão é que ela trabalha numa loja de conveniência e o chefe pediu para que ela retornasse ontem, quando a chuva pareceu mais calma.

─── Por que você está sorrindo? ─── Dash pergunta.

─── É meio ridícula pensar que estou tendo todo esse trabalho para isso... ─── aponto para a sua cara de maluco apaixonado. ─── Sofrer como um idiota por ficar longe da minha namorada por um dia.

─── Isso é o que acontece quando você se apaixona de verdade. ─── ele cutuca a minha cintura para me irritar.

─── Que boiola. ─── digo com um sorriso, querendo encerrar o assunto antes que se volte para o lado do meu quase primeiro namorado. Nenhum dos meus amigos acha que o sentimento que alimentei pelo Bryan era verdadeiro. ─── Você é muito bom nisso. ─── reconheço enquanto me olho no espelho.

UMA GEMA PARA CLARAOnde histórias criam vida. Descubra agora