Capítulo 17

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As telas foram ao chão, o desenho de nós vendo as estrelas não passava de um borrão, o mar parece ter sido inundado de tintas coloridas, meu rosto parecia deformado, os peixes haviam se escondido pelos borrões. Meu coração estava tão descontrolado que se fosse se moldar solidamente seria um furacão destruindo o que restou na sala.

Maraisa se desfaz de tudo e senta no canto da parede, com os braços abraçando os joelhos, os cabelos sendo sujos de tinta porque a parede ainda está fresca. Não tento me aproximar, tento a todo custo focar em algo racional, porém, falho miseravelmente ao lembrar-me das cenas anteriores.

Essa é minha resposta, afinal?

—  Você quer que eu vá embora? —  pergunto depois de quase fazer um buraco no chão, encarando mais a mim que a ela, busco uma explicação simples, um modo de dizer-lhe o poder que exercia sobre mim.

—  Você quer ir? Isso importa? Eu nem entendi porque veio, como vou dizer que pode ir? Não sei para que você quer uma chance, Marilia.  —  Diz levantando a cabeça, seu rosto ainda está vermelho. Gostaria de saber o que está pensando, gostaria de lhe entender, tivemos muitos momentos e li muito sobre tudo mas nada relata como lidar com isso.

—  Eu vim porque precisava explicar, Maraisa, precisava te dizer que... você é importante pra mim, entende? —  Encosto-me à parede ao seu lado, me rendendo, escorregando até sentar, soltando o ar.

—  É mentira, Marilia, eu não consigo olhar as pessoas nos olhos por muito tempo, mas, você sim e sequer consegue fazer isso agora.  —  A voz de Maraisa sai fria, levanto a cabeça a olhando, penso em responder-lhe, contudo, sei que há mais.  —  Eu nunca fui boa em falar, mas, você pode falar e se perde em desespero e mente. Tudo mentira, eu sei que é!  —  Maraisa se levanta lentamente se dirigindo até a porta, passa por cima das telas as olhando, pisando em tudo, acompanho seus passos até vê-la abrir a porta.

—  Não é mentira.  —  Levanto permanecendo onde estou, a olhando. Não estou disposta a sair, não antes que ela aceite e entenda minha verdade.

—  É sim! Minha mãe diz que pessoas agem de má fé e você foi a pior delas.  —  As lágrimas de Maraisa voltam grosseiras e pesadas, um tiro no estômago.

—  Nós fomos ao planetário, você lembra? Nós almoçamos juntas, caminhamos juntas, isso foi real, foi divertido, foi de verdade, Maraisa. Em cada um daqueles momentos eu estava mais encantada por...

—  Encantada por uma pessoa que tem déficit de comunicação. Quem faz isso?  —  Ela ri, um riso desesperado. Me atinge de todos os lados, mas não é sua culpa, sei disso.

—  Por uma pessoa linda!  —  Rebato suas palavras no mesmo tom, dando um passo à frente.

—  Para! Eu não sou, não posso ser nada, minha mãe...ela sempre diz, não pode, não pode, não pode, ela está certa, eu não posso sentir essas coisas, não posso confiar em ninguém.  —  Suas costas chocam com a porta e novamente seu corpo escorrega.

Seus pais estão errados, ela está errada, muito errada. Suas palavras ecoam em mim causando indignação, no início eu tinha o propósito de lhe ajudar com o que precisasse e ao passar o tempo, isso se tornou maior, meu objetivo é lhe mostrar o mundo lá fora, enquanto eu mesma mergulho no seu. E ela se mostra capaz de muito mais que meus olhos conseguem ver, Maraisa precisa se enxergar com meus olhos, assim como eu preciso enxergar o mundo com os seus.

Olho para as tintas, para as palavras na parede, meus olhos desfocam as imagens com as lágrimas que escapam a contragosto. Maraisa exposta em cada um dos borrões na parede, no chão, nas telas, em tudo, a sua confusão a sua dor. Sua forma. "Você me protegeria?", diante dessas palavras tenho uma ideia, que me parece tão óbvia, eu só precisava ter me equilibrado desde o início.

You Captivated Me || MalilaOnde histórias criam vida. Descubra agora