Capítulo 3

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"Ela tem a beleza estúpida da juventude, mas é astuta." — Closer.

Merda de vida, por que quando as coisas tendem a dar errado, elas dão todas de uma vez?

Sério. Parece que o universo quer tudo, menos que as coisas sejam fáceis para mim. Posso listar até, mas o mais importante é que meu pai estava no meu ouvido, como sempre, falando sobre as minhas responsabilidades e me vigiando para saber se eu me meteria em alguma encrenca que pudesse prejudicar os negócios da família. E o que menos precisávamos no momento era de mais um escândalo.

Então, antes de me mandar para o Saint Fiore, ele fez um enorme discurso sobre como esse ano é importante e que eu preciso andar na linha.

— Arón, eu estarei de olho em você. Não faça com que eu me arrependa de confiar em você, garoto. — Foi o que ele disse. É a mesma coisa que ele sempre diz.

Responsabilidades de ser um herdeiro.

Havia acabado de sair do Ellio's, o meu lugar favorito em toda Silent Grace e que vendia os melhores sanduíches da Itália: talvez fosse de um desses que precisava para melhorar meu dia. Como estava sem minha moto, decidi pegar o ônibus até o Saint Fiore. Pelo menos lá ficaria enfiado dentro do meu quarto o dia inteiro dormindo, para garantir que esse dia horrível acabasse logo.

Me sentei no banco do ponto, ao lado de uma garota com o uniforme do Saint Fiore.

Droga, será que ela puxaria papo comigo? Não queria ser mal-educado com a garota, não estava no meu melhor dia para socializar com colegas.

Mas a garota nem ao menos olhou para mim. Agiu como se eu nem existisse. Ai, meu ego.

Será que ela realmente era do Saint Fiore? Bom, o uniforme não podia ser coincidência. Ela vestia a saia plissada xadrez com as cores do Saint Fiore, azul e cinza. E por debaixo do grande casaco cor-de-rosa conseguia ver que usava o suéter cinza com o broche de Saint Fiore.

Não nos conhecíamos então?

A garota levantou a cabeça por um instante e eu vi seu rosto delicado, as bochechas coradas pela brisa da manhã. Os cabelos pretos lisos na altura de seus ombros balançando junto com vento.

Ela se virou para mim por um instante e depois virou de volta, olhando para a rua. Não foi um movimento tímido ou um movimento para que eu soubesse que ela sabia que eu estava aqui. Para ela parecia que eu nem estava aqui.

Não que eu me importasse se uma novata qualquer do Saint Fiore soubesse da minha maldita existência ou não.

Mas todos sabem da sua maldita existência, Arón, me respondi mentalmente.

Menos ela.

Meus pensamentos foram, felizmente, calados com a chegada do ônibus. Nos levantamos ao mesmo tempo, mas ela foi na frente, subindo no transporte. Fui atrás.

Assim que chegou na minha vez, o universo fez questão de me relembrar que eu não estava em um bom dia. Enfiei minhas mãos no bolso e não tinha dinheiro algum para pagar a viagem. Havia esquecido minha carteira no Ellio's... Que dia de merda.

— Se não for pagar, cai fora — o motorista disse, com sua expressão de pouquíssimos amigos.

— Droga — bufei e girei meus calcanhares para descer do ônibus.

— Espera. — Ouvi a voz doce e calorosa da garota que nem sabia que eu existia. — Eu pago pra ele — ela disse, indiferente.

Tentei não sorrir. Girei nos meus calcanhares e a agradeci com um gesto, passei então pela catraca. Esse foi o mínimo de contato que tivemos e, com isso, pude sentir o seu perfume. Era doce. Frutal.

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