Capítulo 4

5 1 0
                                    

"— Lamento pelo seu pai."

"— Um dia eu o acabaria matando." — O Profissional.


Saint Fiore

— Sai da frente! — gritei pela janela, buzinando para um garoto imprestável que estava sentado com os amigos na minha vaga.

Hoje o dia não começou bem.

Buzino mais algumas vezes para ele se apressar logo e estaciono meu carro de qualquer forma. Pouco me importava. Já estava atrasada há alguns dias desde a volta às aulas e tive a proeza de conseguir me atrasar para a minha primeira aula também. É uma delícia chegar depois do horário marcado e ter um bando de babacas aplaudindo sua entrada.

Corro com minha bolsa no ombro, fechando os botões de meu paletó cinza escuro com o emblema da Fiore bordado. Estou quase suando quando passo pelos portões do prédio em direção a minha sala de aula, que graças a Marzia ter pegado meus horários, eu sabia para onde ir exatamente.

Claro que a dona Carlota não me deixaria passar sem me chamar até sua sala, então fiquei encurralada no corredor, já não me importando com o meu atraso.

— Venha, mocinha — ela disse simplesmente com a voz rígida e comecei a segui-la enquanto me familiarizava outra vez com o ambiente.

Não andava pelo internato desde o último ano. O colégio combinava com a cidade em um geral. Éramos uma vila medieval, cidade antiga e pacata que cresceu estrondosamente pelo número de milionários que se mudavam para o bairro San Pellegrino, onde ficava um dos colégios mais caros e prestigiados do país.

Então todos os costumes da Saint Fiore, colégio liderado por freiras, eram católicos. Não tão rígidos como antigamente, ainda assim, católicos. Não sou totalmente a favor disso, mas não posso reclamar do ensino aqui, é realmente bom. E não levamos reguada na mão.

O conceito da arquitetura, como boa parte desse lado da Europa, exigia um estilo gótico, mostrando a dimensão de todas as paredes altas e maiores do que construções comuns. Pareciam castelos, só que mais escuros. E na última renovação que o colégio conseguiu com o último prefeito, o senhor Bucci, o ambiente se tornou moderno, ainda contendo as características do movimento renascentista, com todos os elementos de decoração apontados para cima, demonstrando todo aquele tipo de superioridade e supremacia do catolicismo na época em que o movimento artístico foi criado.

Olhei para meus sapatos pretos ilustrados enquanto Carlota fechava a porta de seu escritório. Ele era amarelo com uma cruz enorme pendurada atrás de sua mesa e muitos livros ilustravam sua grande estante de madeira.

— Sente-se — pediu.

Respirei fundo, com preguiça daquilo tudo, mas me sentei, esperando seu sermão, ou pior, compreensão de momentos difíceis que passei.

— Como você está, Asia?

— Por que se importa?

— Vou bem também, obrigada — ironizou e ajeitou a sua capa de freira, ou hábito, como chamavam aquele treco preto e branco que a maioria das funcionárias da Fiore usavam. — Quer me contar sobre os últimos dias?

Terminei com meu ficante, terminei com o pai dele também, fiquei em primeiro lugar em um concurso de beleza, comi frango frito com capuccino essa manhã antes de vir para o colégio e encontrei um corpo morto no freezer do hotel semana passada o que fez meu pai ficar maluco e me impedir de voltar pra escola depois que os policiais me encheram o saco dia e noite por culpa de um depoimento com zero informações.

Do que exatamente ela estava querendo saber?

Encolhi os ombros.

— Entediante. Ontem o ponto mais alto do meu dia foi conseguir acordar no momento exato em que minha série favorita estava passando na televisão. Crazy RIch Asians, conhece?

Silent GraceOnde histórias criam vida. Descubra agora