Capítulo 14- Any

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Tudo escuro, um breu, silêncio, posso somente ouvir as batidas do meu coração e um choro, deve ser aquele choro que sempre me cortou a alma ao ouvir. As lágrimas da minha mãe.

Abro os olhos, mas consigo me ver deitada em minha maca. Olho em minha volta, Noah está parado do lado dos meus pais, seguro uma risada, eu nunca vi ele tão quieto.

Levanto da poltrona, caminho de um lado para o outro. Meus batimentos aceleram, mas não entro em pânico, estou bem, o ritmo vai se estabelecer novamente.

Ando até mim, muitos aparelhos ligados em meu corpo adormecido. Então percebo, é um sonho que em algum momento vai acabar, é como se eu fosse meu médico e tomasse posse do seu corpo enquanto durmo.

- Você sabia que isso podia acontecer?- Minha mãe pergunta para mim... Para o meu médico.

- As chances eram quase impossíveis de acontecer, o tumor estava diminuindo com a quimioterapia, estava tudo sob controle.- Escuto Josh dizer.

- Seu controle está fazendo ela morrer mais rápido do que deveria.- Meu pai lançou em minha direção.

Meu coração acelera mais uma vez, sem pânico algum novamente. Doeu, as palavras dele me machucaram, mesmo sendo ditas para Josh.

- Eu sinto muito. Deveria ter feito mais.

As palavras rodam em minha cabeça. Não poderia ter sido feito, era para acontecer, não tem cura prevista para isso.

- Não sejam pessimistas e fiquem falando como se ela estivesse morta, Any vai acordar em breve e vocês irão ver que está bem.- Noah diz começando a andar de um lado para o outro também.

- O tumor alcançou o coração!- Meu pai grita, péssima escolha.

- As células cancerígenas passam por ele a todo segundo, nunca deixei oculto que o câncer poderia se instalar em outro órgão.- Solto um resmungo fraco, estou cansada. Josh está cansado.

- Quanto tempo?- Minha mãe pergunta.

Olho para o Noah que nega com a cabeça assim que percebe que estou olhando para ele. Posso ouvir os pensamentos silenciosos do Josh, e tenho vontade de entrar em pânico por ele.

- Não faço ideia.- É uma mentira o que ele está contando. Apenas algumas semanas sua mente tinha me sussurrado.- E não quero dizer um tempo no qual saia como errado depois.

Pois o tempo era para ser sete meses e não quatro.

- Não tem nada que a gente possa fazer?

Amá-la até o último segundo. Josh pensa, não eu.

- Esperar até que ela acorde.- Noah se pronuncia primeiro.- E depois, fazer da vida dela feliz dentro do hospital.

Meu pai solta uma risada irônica. Ele sabe que não tem felicidade aqui dentro. A sua risada se torna nervosa, uma bagunça entre sons de lágrimas sufocadas com um falso som de gargalhada. Seus olhos ficam banhados e eu tento me mover até ele, mas o corpo do Josh não sai do lugar.

- Eu preciso tomar um ar.- Ele sussurra e antes que eu possa dizer algo, a porta é aberta e fechada.

- Acho que eu vou atrás dele.- Minha mãe fala atordoada.

- Tente tomar um pouco de água.- Noah diz antes que ela também saísse.

Solto o ar dos meus pulmões que eu nem sabia que estava prendendo, a sensação de estar respirando sozinha de novo é estranho, mesmo não sendo exatamente eu quem está respirando.

Noah se aproxima de mim, colocando a mão em meu ombro enquanto me observo deitada na maca. Olho para o monitor, os batimentos subindo e caindo na linha.

Cartas ao amanhecerOnde histórias criam vida. Descubra agora