capítulo 7

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Quando voltei àquela seção da biblioteca, a bolsa de Dax não estava exatamente onde eu a tinha visto pela última vez. Ele a tinha escondido? Não, só a empurrou para baixo da cadeira, percebi. Corri para lá sabendo que não tinha muito tempo e me abaixei. A alça preta estava para fora do esconderijo, e eu tentei movê-la. A bolsa ficou presa e tive de puxar mais algumas vezes para soltá-la, atenta a qualquer ruído. Abrir o zíper levou cinco segundos, os segundos mais barulhentos da minha vida. Foi como se o ruído ecoasse pela sala toda enquanto eu prendia a respiração. Com a bolsa aberta, olhei para trás para ter certeza de que ainda estava sozinha. Estava. A bolsa continha tudo que devia ter para uma noite fora de casa: produtos de higiene pessoal (eu ia matar esse cara por não ter me contado que tinha creme dental), roupas, meias, algumas barrinhas de proteína (ele planejava dividir?) e finalmente, finalmente, no fundo da bolsa, encontrei o que procurava. Um celular. Era um velho aparelho modelo flip, e, quando o abri, vi que a tela estava escura. Eu não sabia ligar o telefone. Apertei e segurei o botão lateral por alguns segundos. Nada. Tentei o botão com o desenho de um telefone verde. Ainda nada. — Sério? — Dax falou atrás de mim. Virei para ele ainda abaixada, perdi o equilíbrio e caí sentada. Agora eu segurava o celular na frente do corpo, totalmente à vista. — Você tem um telefone — falei. — Estou presa aqui e você tem um telefone.

— Você mexeu nas minhas coisas? — Era uma pergunta, mas a raiva em sua voz a transformava mais em uma acusação. — Eu fui obrigada, porque você disse que não tinha um celular, mas tem. Só quero ligar para a minha família. Eles devem estar preocupados comigo. — Pode ligar. — Ele apontou o celular. Isso era alguma pegadinha? Olhei de novo para a tela preta. — Não consigo ligar o aparelho. — Exatamente. — Ele arrancou o celular da minha mão, enfiou na bolsa e fechou o zíper. — Como assim, exatamente? Pode ligar para mim? — Não, não posso. Está sem créditos e sem bateria. — Ah. — Continuei sentada no chão, desanimada demais para levantar. — Bom, então não serve para muita coisa. — É que, antes de vir para cá, esqueci de pensar em você e nas suas necessidades. — Por que trouxe um celular sem bateria? O carregador não está aí? — O que você acha? — Aliás, por que me seguiu? — Porque você estava com cara de culpada quando saiu da sala, como se fosse cometer um crime. — Você conhece bem essa cara? — Não mexe nas minhas coisas — ele falou em voz baixa, quase inaudível. — Desculpa por ter mexido na porcaria da sua bolsa. Só queria sair daqui. Minha família deve estar morrendo de preocupação. Sua família não está preocupada? — Não. — Aposto que está. Você fugiu? — Não.

— Qual é, então? Só saiu? Ninguém liga se você passa o fim de semana fora? Se passa a noite em uma biblioteca vazia? — Eles me deixam entrar e sair quando eu quero, e eu não denuncio ninguém pela plantação de maconha no porão. Funciona bem. Fiquei em silêncio por um momento, chocada. Tinha ouvido histórias sobre a mãe dele ser uma drogada, mas era difícil saber o que era boato e o que era fato. — Seus pais plantam maconha no porão? — A família que me acolheu. Esquece o que eu disse. Por algum motivo, eu estava mais surpresa por ser a família que o abrigava do que se fossem seus pais de verdade. — Não olha para mim desse jeito. É perfeito. A melhor situação que já tive. Melhor situação que ele já teve? — Sinto muito. — Por quê? Eu tenho liberdade. Eu é que lamento por você e por essa sua vidinha previsível. — Talvez eu lamente porque isso te transformou em um completo babaca. — Melhor que ser uma mimadinha ingênua e arrogante. Soltei um suspiro frustrado. Essa palavra de novo. Por que eu ainda insistia? Eu não era uma dessas meninas que precisavam salvar garotos perdidos. Levantei e comecei a me afastar, mas antes de ir muito longe, voltei, abri a bolsa dele e avisei: — Vou pegar um pouco do seu creme dental. A expressão dele era um misto de espanto e raiva quando saí dali levando a pasta de dente. No banheiro, apoiei a cabeça na parede de ladrilhos frios e cobri o rosto com a mão. Ele não tinha um telefone, a única coisa que me dava um pouco de esperança. Eu estava presa ali de verdade, oficialmente.

Quando senti a respiração acelerar, me lembrei de me manter concentrada nas coisas boas. Eu tinha creme dental. E uma televisão. Podia fazer alguma coisa com isso.

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