capítulo 42 e 43 e 44

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Na segunda-feira, quando peguei o Hamlet de cima do meu criado-mudo, pensei pela milésima vez em como seria o dia de hoje. O espelho de corpo inteiro atrás da porta do quarto mostrava como eu estava nervosa com o que faria em breve. Devolveria o livro a Dax sem a carta dentro dele. Seria assim que eu começaria a conversa. Talvez o levasse à estufa outra vez. Quem ia ligar se perdêssemos a primeira aula? Íamos conversar sobre a carta. Depois eu diria que gostava dele. Endireitei o suéter verde, um dos meus preferidos, e ajeitei uma das minhas ondas soltas. Sim, hoje tinha caprichado mais no visual. Não tinha nada de errado em tentar distrair o cara enquanto dava uma notícia chocante. Mas Dax não estava perto dos ônibus, onde eu normalmente o via de manhã. Olhei os corredores da escola e também não o encontrei. Virei uma esquina, pensando em ir dar uma olhada na sala onde ele teria a primeira aula, e dei de cara com Dallin. — Autumn — ele falou, sério. — Sim, Dallin? — Hoje é o seu dia de ir ao hospital. Ainda pretende ir, não é? — Na verdade, hoje vai ser complicado. Sabe se alguém quer trocar? — Sério? Está saindo com alguém? — Ele me olhou com a mesma cara arrogante que fez no hospital, quando me viu com Dax. — Não, é que... — Era exatamente isso que eu planejava fazer. — Deixa para lá, eu vou. — Precisava conversar com o Jeff também. Podia falar com

ele primeiro. — Não, se é boa demais para ter um dia determinado de visita, posso colocar alguém no seu lugar. — Dallin. Para com isso, tudo bem? Eu vou. Ele levantou as mãos num gesto de rendição. — Que bom. Porque, apesar de tudo, o Jeff parece que gosta de você. — Você é bem babaca, sabia? — Só quando acho que alguém está sacaneando o meu amigo. Eu queria discutir, mas estava me preparando para sacanear o amigo dele, e isso me contorceu de culpa. Precisei lembrar que tinha de viver a minha vida, não a de outra pessoa. Conversaria com Jeff hoje.

Jeff e os pais jogavam um jogo de tabuleiro quando entrei no quarto. Pela cara dele, percebi que Jeff só estava jogando para agradar aos dois. A bandeja suspensa sobre a cama era pequena demais para o Jogo da Vida, mas eles se ajeitavam como podiam. — Autumn! — Jeff falou, e o carrinho com a pessoinha de pino caiu no colo dele. — Oi. — Vem jogar com a gente. — Ele colocou no tabuleiro um carrinho verde com um pino cor-de-rosa. Puxei uma cadeira, e o pai dele me deu um maço de notas falsas e um cartão de profissão. "Professora", dizia. Quarenta e sete mil dólares de salário. A estrutura do jogo acalmava um pouco meu nervosismo, e em pouco tempo eu estava rindo com Jeff. — Quero mudar de profissão — ele anunciou dez minutos mais tarde, quando chegou à casa apropriada. — Mas você é cirurgião, seu salário é o mais alto do jogo — comentei. — Minhas decisões não se baseiam em salário, Autumn. Eu me baseio na satisfação profissional, e estou insatisfeito. Passo muito tempo longe da

minha esposa e dos gêmeos. Preciso de uma mudança de vida. A mãe dele riu. — A gente deve estar sempre feliz com a escolha profissional. Boa decisão. — Dá para dizer o mesmo sobre segurança — comentei. — É verdade — o pai de Jeff concordou. — Ouviram isso, meus pais? A Autumn é uma interesseira. Se eu não levar muito dinheiro para casa, ela vai ficar infeliz. — Desculpa, Jeff, mas estou no meu carro com meu marido de pino azul, levando para casa meu salário de professora. Abandonar sua carreira de cirurgião não vai me afetar. Ele jogou o cartão de cirurgião na minha direção como se lançasse um frisbee. — Vai te afetar, sim. — De verdade, o que quer ser quando crescer? — perguntei e percebi que essa era mais uma coisa que eu não sabia sobre ele. — Ciclista. Quero disputar provas em pistas de terra. — Sério? — Não, mas deve ser divertido. Talvez faça isso como lazer. — E você, o que quer ser? — O sr. Matson me perguntou. — Acho que psicóloga. — Porque era seguro, sólido e nada arriscado. Mas era mais que isso. Minha psicóloga tinha me ajudado tanto durante anos que eu queria ajudar outras pessoas. — Eu não sabia disso — Jeff interferiu. — Pensei que fosse fazer alguma coisa relacionada à fotografia. — É, eu... — Psicologia é uma boa escolha — o pai dele aprovou. — O Jeff precisa decidir. — Ah, fala sério, eu tenho dezessete anos. Tenho a vida inteira pela frente. A mãe dele tocou seu braço.

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