Minha Senhora Predestinada

Capítulo 7

Apenas três semanas se passaram desde a chegada de Yuexiu ao palácio e estava começando a ficar entediada. Em sua casa mesmo sem poder colocar os pés para além dos muros, tinha um pouco mais de liberdade e contava com os momentos em que fugia. Agora morando no palácio uma de suas poucas distrações era passear pelo jardim de sua pequena mansão tentando passar o tempo.
- Daji, aquela nuvem não te faz lembrar um elefante?
- Para mim parece só uma nuvem.
- Desculpe atrapalhar, mas o imperador Wu deseja falar com a lady Yuexiu - anunciou a criada que entrara silenciosamente sem que percebessem.
- Claro - respondeu sobressaltada olhando para sua dama.
Observando à medida em que Yuexiu se afastava seguindo a criada, Daji sentiu um aperto no peito. Estava preocupada com a sua senhorita, às vezes ela podia ser descuidada e ingênua demais. Temia o pior dessa conversa. Por que ele queria vê-la tão repentinamente? Arranjaria um modo de descobrir.
Quando se encontraram pela primeira vez na mansão do duque Zheng, ela teve coragem o suficiente para encará-lo, porém a situação agora era mais delicada. Precisava tomar cuidado com o que iria dizer. Sendo guiada pela criada, seu coração acelerava. Para essa conversa não poderia contar com a companhia de Daji. O caminho todo era repleto de colunas até adentrarem no pavilhão principal do palácio onde o imperador ficava.
- Com licença imperador, a lady Wu está aqui.
- Obrigado.
Fazendo uma breve reverência ela se retirou deixando-os a sós.
- Sente-se por favor. Eu a chamei aqui porque gostaria de saber como tem estado. A lady se adaptou ao palácio? - perguntou com ternura.
- Aos poucos estou me adaptando à nova rotina - mentiu desviando o olhar e ele percebera.
- Entendo. Pode parecer um pouco difícil no começo, mas tudo se resolverá com o tempo.
Agora ela fazia parte da família do imperador, não podia ficar tão exposta no mundo exterior. Ele não podia fazer nada para diminuir a saudade que ela estava sentindo de casa. Se ao menos o seu filho colaborasse ela poderia sair com mais frequência, ainda que tivesse de estar ao lado dele. Mas isso seria impensável ao lorde Yi, ele não aceitaria se aproximar daquela garota novamente.
Enquanto a conversa entre os dois se seguia dentro da sala, a alguns metros dali sua dama de companhia a procurava. Nunca ficara tanto tempo longe dela, e estava com medo que se deixasse levar por seu temperamento impulsivo, apesar de ser uma garota calma e gentil. Já tinham problemas demais para arrumarem mais um.
A brisa fria daquele inverno trouxe o cheiro de um perfume que conhecia bem. Daji sabia agora por onde começar a procurar por ela, mas seus passos foram interrompidos quando chegou ao fim do corredor. Sua cabeça bateu no ombro de alguém que surgira em sua frente a fazendo tropeçar nos próprios pés, e ele a segurou firme em seus braços.
Daji encarou aqueles olhos azuis turquesa que deixaram ela sem palavras. Era a primeira vez que ele realmente envolvia uma mulher em seus braços, e estava afeiçoado por ela. Naquele breve instante tiveram a impressão de já terem se visto antes.
- A senhorita está bem?
- Si-sim. E você? - gaguejou nervosa com a proximidade, esquecendo do formalismo fazendo-o abrir um sorriso de lado.
- Estou - ele nem percebera que não tinha a soltado ainda, então ela se endireitou recobrando o fôlego.
A diferença de altura entre os dois era mínima assim como o espaço que os separava.
O modo como se vestia a fez ter certeza de que não se tratava de um simples guarda. Suas roupas eram elegantes e a faziam lembrar o verde esmeralda de seus próprios olhos. Preso em um perfeito rabo de cavalo seu longo cabelo deixava algumas mechas mais curtas fora do penteado.
Daji usava um vestido branco sobreposto a um azul-violeta que contrastava com o azul-celeste da faixa em sua cintura. Seu longo cabelo de tom chocolate brilhava com a luz da manhã sobre eles.
- Você não é do palácio, certo? - perguntou sabendo a resposta já que as suas criadas usavam roupas completamente diferentes das dela.
- Não. Eu sou a dama de companhia da lady Yuexiu, somos da província...
- Dang, que fica ao Leste das propriedades do palácio - o sorriso em seus lábios desapareceu dando lugar a um semblante impassível. Não podia ser verdade, seria muita coincidência. Pensou.
- Sim essa mesma, como...
Ele cerrou as suas mãos e seus olhos se cravaram nela com um olhar odioso.
- Lorde Yi, elas chegaram - disse Li Bai surgindo de repente sem perceber a jovem.
Lorde? Então aquele era o Lorde Yi? Daji não podia ter dado um passo tão errado. Como fui me encantar justo por ele? Ela lembrara do que ele fez Yuexiu passar e fixou o olhar nele indignada.
- Atrapalhei alguma coisa? - perguntou sentindo o clima pesado, notando finalmente a garota.
- Não. Vamos.
Naquele momento Yi lembrou de uma garota que tinha chamado a sua atenção na cerimônia de casamento. Era a dama de companhia de sua esposa. Descobrira tarde demais. Virando-se de costas para ela foi embora sem dizer mais nenhuma palavra.
- Até mais senhorita - despediu-se Bai sabendo de quem se tratava pela aparência.
Daji ficou sozinha e sentiu seu corpo estremecer. O guarda pessoal dele havia dito "elas chegaram". Elas quem? Antes de saírem da mansão Zheng ela escutara alguns boatos sobre a reputação do lorde Yi, não imaginava que fossem verdadeiros mas precisava se certificar disso.
Seguindo pelos corredores Daji acabou perdendo eles de vista. Ela não conhecia o palácio tão bem quanto à mansão em que costumava morar e não vira para onde foram. Talvez fosse melhor tentar achar Yuexiu primeiro. Quando retornava escutou uma música vindo de um cômodo próximo a ela e foi conferir.
Abriu com cuidado a porta que dava para o ambiente e ouvira vozes femininas. Ela espiou cautelosamente dentro da sala e viu quem não queria. O lorde Wu Yi estava sentado com duas belas jovens ao seu lado, em choque ela recuou. Daji se afastou o mais rápido que conseguiu tentando não ser descoberta.
- Aquele bastardo. Ele teve mesmo coragem de fazer isso com ela aqui!?
Enquanto falava sozinha Yuexiu apareceu na sua frente acompanhada de uma criada.
- Daji? Como você chegou aqui?
- Eu... eu estava preocupada com você e aproveitei para ver a Fan Lihua - usou sua mais nova amiga no palácio como desculpa.
- Entendo. Você parece um pouco nervosa.
- Impressão sua - mentiu desejando que acreditasse. - E a conversa com o imperador como foi?
- Ocorreu bem. Ele é mais benevolente do que pensei. O problema parece ser o filho dele.
- Nem me fale.
- O que disse?
- Acho que deveríamos voltar para o pavilhão Xiangyou - disse louca para sair dali.
- Sim, também acho.

O lorde Yi estava furioso por seu encontro com Daji e mais ainda por ter simpatizado dela. Ele só agia como um libertino para irritar o seu pai, e funcionava bem. Naquele dia ele ficou mais frio que a neve que caía lá fora.
- Tire elas daqui - pediu impaciente ao Li Bai que também estava na sala.
- Claro. Venham comigo.
Quando Bai voltou se deparou com Yi cabisbaixo, normalmente as garotas sempre conseguiam distraí-lo. Elas lhe contavam histórias do mundo exterior, já que quase não tinha contato com ele. Era o primeiro herdeiro do imperador e teve que ficar sob total vigilância depois do atentado. Seu pai temia que os inimigos do império atacassem novamente, mas ele não enxergava dessa forma. Queria poder não ser filho do soberano. Queria poder ser uma pessoa normal, mais simples. Não. Simples era uma palavra que não o definia.
- Pensei que a companhia delas o fazia bem. Está em um mal dia?
- Não. Eu só quero ficar sozinho, preciso pensar.
- Você está aéreo desde que encontrou com a...
- Não mencione ela! - vociferou alterado levantando-se.
- Perdão. Não sabia que tinham se desentendido - disse um pouco desconcertado. Era a primeira vez que Yi gritava com ele. Por ser quatro anos mais velho Yi o respeitava independente dos títulos que possuíam.
Soltando um longo suspiro ele sentou e fez um gesto para que Bai sentasse à seu lado.
- Me desculpe, eu não deveria ter gritado com você. É só que, não pode ser ela.
Bai parecia confuso e Yi começou a explicar o que havia acontecido.
Do outro lado do palácio, no pavilhão Xiangyou, Yuexiu contava sobre sua conversa com Wu Fang.
- ...e então ele disse que eu poderia passear pelo palácio como quisesse, mas que não poderia colocar os pés para fora sem antes consultá-lo em consideração ao lorde Yi.
- Tudo por causa daquele bastardo… – praguejava baixinho.
- Eu não consigo entender o que diz se falar tão baixinho.
- Ah... eu só estava dizendo que logo os festivais da primavera chegarão, talvez vocês devam comparecer à eles juntos.
- Sim. O imperador disse a mesma coisa e lembrou de que talvez tenha que usar o véu.
- Isso é ridículo - sua indignação com ele só aumentava.
- Daji preciso que me ajude com um algo - falou ansiosa.
- Diga.
- Quero voltar a praticar qinna.
- A senhorita o quê!?
- Por favor. Você tem que me ajudar a sair - implorou.
- É perigoso. Não estamos mais na mansão Zheng, aqui tem mais riscos, sem falar na distância.
- Você consegue - disse confiante com um sorriso genuíno no rosto.
- Eu levaria algum tempo para descobrir como funciona a rotina dos guardas no palácio - retrucou tentando convencê-la da dificuldade que teria.
- Eu estou com saudades de passear pelo vilarejo, e de treinar com meu mestre. Você quer me ver feliz, certo? - Yuexiu fez beicinho apelando para a chantagem.
- Está bem. Eu farei o possível para ajudá-la a escapar daqui. Mas teremos que ser cuidadosas, se o imperador Wu ou o príncipe das trevas ficarem sabendo estaremos em apuros.
- Príncipe das trevas? - perguntou contento o riso.
- Acho que ele é mais digno desse título – disse com deboche.
- Já percebi que você não gostou mesmo dele. Mas e então como vamos fazer?
Daji lembrou do seu encontro com o lorde Yi mais cedo e de como ficaram tão próximos, seu coração acelerou. Yuexiu estava certa ela não gostava dele. Não se permitiria deixar isso acontecer, sacudiu a cabeça afastando a possibilidade.
- Precisamos de um plano - ela abriu um sorriso malicioso aceitando enfim o desafio.