Capítulo 17 - Eu sou o fogo.

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   Miles quase lança o telemóvel pelas ruas quando a voz eletrônica anuncia: "Sua chamada está sendo encaminhada para a caixa postal e estará sujeita a cobrança após o-"

— ENFIA ESSA MERDA DE COBRANÇA BEM NO MEIO DO TEU CU, PORRA! — Ele resmoneia, insatisfeito. — Aquela idiota não me atende.

— Ela sumiu quase 13 horas atrás, Miles. Não é melhor ligarmos pra polícia? — Darkness sugere, esfregando as mãos suadas pelo nervosismo. Tem dezenas de clientes ainda hoje, mas os pensamentos não param de transitar entre sua melhor amiga e o seu carro roubado.

   O rapaz ri com escárnio.

— Dizer que a aliada de um hacker procurado pelo mundo todo tá desaparecida pros caras que justamente querem acabar com a raça desse homem não parece ser uma ideia muito inteligente, não acha?

— Eu tô falando sério, seu imbecil. Eu tô preocupado, caralho. — O homem tatuado rebate, estralando os dedos em ansiedade. Quando os dois se aproximam da porta automática, abaixam a voz. — A sua irmã foi pra Duskwood. Não sei como é que você ainda não surtou.

— EU TÔ SURTANDO! — Ele sussura de volta, raivoso. — A égua da minha irmã fez o favor de roubar a porra do meu carro, bater com ele e praticamente sumir das câmeras de segurança da estrada depois que cinco carros começaram a perseguir ela na madrugada, ontem a noite. E agora eu tenho que voltar a caminhar porque não tenho mais a porra do carro, sendo que  a porra do carro era o que mantinha o meu sedentarismo. Você acha o quê? QUE EU TÔ PULANDO DE FELICIDADE QUE NEM O CARALHO DE UM COELHINHO?!

   Ambos sentem o ar gélido da entrada do prédio batendo contra suas testas molhadas, transpirando de sanha e apreensão. Miles passa as mãos pelos cabelos molhados enquanto se dirige a cafeteria de seu prédio de trabalho.

   Ele inspira fundo, sentindo a paciência se esgotar por completo.

— Tá mais preocupado com a merda do carro? — Darkness indaga.

— É CLARO QUE NÃO! Eu quero que aquele carro se foda. Não que carros tenham essa capacidade. Mas foda-se também, quem liga? — Ele retruca, cruzando os braços e apertando os lábios.

   Darkness tem ciência do que ele está fazendo: é o que ele sempre faz.

   O garoto segura seu amigo pelo braço e o leva direto para uma das mesas de pedra, fazendo seu parceiro se sentar na carteira à frente da sua.

— Miles. — Quando sua voz sai, é fina e delicada feito cristal. Os olhos confusos do hacker se levantam para ele. — Fala o que tá acontecendo.

— Além da minha irmã ser uma idiota e ter ido direto pros braços do meu pai sociopata? — Ele solta, como um rugido contido. — Bem, eu tenho uma lista de coisas a mais também.

— Não tô falando do que tá acontecendo aqui fora. — O menino gira o dedo pelo ar, indicando o exterior. — Tô falando do que tá acontecendo aqui dentro. — Sua mão ossuda pousa sobre o peito de Miles, sinalizando seu coração.

— Essa merda não importa. — Ele desvia seus olhos com força, o rosto se tornando uma carranca.

— Miles. — Darkness enuncia, severo. Ele levanta o maxilar do garoto, forçando-o a olhá-lo. O mesmo serra a mandíbula ao mirar aqueles olhos negros enevoados. — Fala o que tá acontecendo. Agora.

   O Hanson joga suas costas na cadeira de pedra rústica, tombando a cabeça para trás e sentindo os olhos penicarem.

— Sabia que ninguém além de mim apareceu no funeral da Jenni? — Ele sorriu em meio a um emaranhado de lembranças, pegando seu amigo de surpresa por ter tocado em um assunto que nunca falava por ser doloroso demais. — A S/N ainda tava se recuperando no hospital. O filho da puta do Michael tinha ido pra floresta fazer Deus sabe se lá o que. E a Íris tava prestes a ter um ataque cardíaco por ter perdido a princesinha dela. Não aguentaria ver o corpo ensaguentado da minha irmã antes deles fecharem o caixão. Então, eu, o garotinho de 11, foi o único que apareceu.

Só mais um minuto - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora