Capítulo 14 - Eles não me pegam hoje

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   S/N amarra fortemente a gaze contra os pelos arrepiados de sua perna, tentando conter o sangramento da mesma forma que fizera ontem.

   Bem, pular do carro e se deparar com uma estaca de madeira cravada em sua panturrilha direita que se encontrava m meio a vegetalidade da floresta indubitavelmente não era o seu plano inicial.

   Porém, ela sabe se virar. O que importa é que está hospedada em um hotel de Duskwood, que achou enquanto corria às pressas para fugir dos homens de Michael, há mais ou menos três horas. Há água com cheiro de band aid antigo, comida barata que exala gosto de metal com a junção de meias após a academia e ar-condicionado que está permanentemente parado em 71,6 F°.

   Muito mais do que o suficiente.

   Ela recusa novamente a ligação de Darkness, o coração aspirando para que atendesse.

   À esta altura do deplorável campeonato que concebe sua vida, o FBI já deve estar rastreando seu aparelho telemóvel. E os agentes de seu pai também.

   A onda de amedrontamento faz seu peito vibrar. Sua vida sempre esteve presente dentro de um buraco, por assim dizer. Entretanto, seu corpo finalmente sente o baque de ter chegado ao fundo do poço.

   Está triste. Acima do que lhe é comum. Sente a necessidade de voltar para seu lar, para as travessuras de Darkness, para baixo do cobertor de ambos enquanto assistiam Netflix juntos, para o sarcasmo do irmão.

   Ela cuidadosamente seleciona quais são as consequências do ato que está prestes a cometer. Ligar para Darkness e Miles faria os agentes de "Sr. Hanson" irem ao alcance dos mesmos. E ligar para Jake renderia a garota seu próprio encontro particular com o FBI.

   E ela sabe bem qual dos dois é mais perigoso.

   "Jake?"
   "Eu preciso de você."
   "Assim que vir esta mensagem, por favor, me responda."

   São quatro e vinte e dois da madrugada. Será que ele...

   O aparelho exibe uma notificação, enunciando a chegado do homem hacker.

   "S/N?"
   "O que houve?"

   Ela puxa o ar com adversidade, a voz quase sumindo no fundo da garganta.

   "Precisamos conversar. Pode me atender, por favor? Eu só preciso escutar a sua voz."

   O garoto parece hesitar.

   "Pode usar o modificador para sua proteção. Não me importo que seja só uma voz falsificada, ainda assim, quero escutá-la de novo. Por favor." Ela digita.

   A ligação do hacker preenche a tela do dispositivo, enchendo o coração da garota de ansiedade. Receosa, ela atende.

— Você está machucada. O que aconteceu? — A voz inquieta e adulterada surge do outro lado da linha, fazendo os batimentos da menina dispararem.

— "Oi" pra você também. Como você tá me vendo? É uma ligação por áudio. — Ela rebate.

— Habilidades de hacker. — Jake diz, uma gargalhada borbulha pelo peito do garoto. S/N se sente contaminada pela risada e tenta segurar seu sorriso. Quando o riso se cessa, a voz de preocupação do rapaz se evidencia: — Posso te ver pela câmera. Quer conversa sobre os machucados?

— E você tem tempo pra uma besteira dessas?

   Ela percebe um tinido elétrico na ligação, o que sinaliza que Jake está bufando.

— Eu arranjo tempo. E desde quando se preocupar com a minha garota é uma besteira? De onde tirou uma ideia tão errada?

   S/N para de andar pelo quarto ínfimo.

— Sou sua garota? — Ela inquire.

— Você não vai fugir da pergunta. Como conseguiu os machucados?

   O silêncio recai sobre os dois por vários momentos. A única coisa que partilham ao telefone é a respiração de ambos.

   Uma batida incessante na porta trancada os interrompe.

   Sete, oito vezes a campainha toca até que uma voz descortês grita para a garota:

— Eu não vou embora, filha da puta. Abra a porta e vamos resolver isto de uma vez. — Enuncia o rapaz do outro lado da porta. S/N sente o corpo tremer ao reconhecer quem é. — Qual é, meu amor. Será que nós dois podemos parar de discutir? Não quer que eu fique zangado como da última vez, não é?

   Henry.

— S/N? Quem está na porta? — Jake indaga ao telefone. A garota mal sente o ar em seus pulmões. — Está tudo bem?

— J-jake... — Ela gagueja. Se recompõe rapidamente, tentando normalizar sua respiração para que o hacker não se preocupe. — Sim. Está tudo bem. V-você... — O garoto esmurra a porta, descontente.

— ABRE A PORRA DA PORTA, S/N! VOCÊ NÃO VAI FUGIR TÃO FÁCIL ASSIM! — O ruído dos punhos do menino contra a madeira inconsistente se apossa do cômodo. Alguns poucos minutos e a porta instável irá quebrar.

   Em um movimento repentino, S/N empurra a escrivaninha para a abertura, bloqueando a passagem dele e ganhando um pouco mais de tempo.

— Me escuta, Jake. É importante. — Ela diz, severa, indo em direção a cozinha e agarrando o facão no pequeno balcão de mármore. — Eu preciso de ajuda. Rastreia minha localização e procura um lugar por perto que seja seguro e de preferência escondido. P-por favor, rápido.

— Por favor, me diga o que está acontecendo. — Ele solicita. Seu tom de súplica corta o coração, mas ela precisa se concentrar. — Me diga que você está bem e que está segura.

— Eu tô bem e tô segura. N-não tem com o que se preocupar. Mas, por favor, procure um lugar que-

— A casa do desafio é o local mais próximo de você que possa te ajuda agora. Não há WI-FI, fica a oitocentos e cinquenta metros de você e está no meio da floresta. Eu não sei o que está acontecendo, mas por favor, saia daí. Agora, S/N, agora.

   Os olhos obscuros da Hanson se direcionam para a janela de vidro quando a ligação cai.

   Ela está no segundo andar.

   E se...?

   Ela corre até elas, os trincos de ferro a impedindo de abri-las. Sem pensar duas vezes, ela joga seu celular na mesa e levanta o facão rumo a brecha.

   O estrépito do vidro se estilhaçando se sobressai aos gritos de Henry e de seus cinco outros capangas. Minúsculas frações de vidraça entram nos olhos da garota, pedaços maiores rasgando a pele de seus braços e pernas impiedosamente.

   Ela sufoca um grito de dor no fundo da garganta e joga suas duas malas pela janela, enfiando seu telefone na bolsa e o jogando em sentido a caçamba de lixo ao lado da edificação.

   Seus olhos recheados de terror passam pela porta, onde pode visualizar os cachos louros de Henry pela fresta da abertura; o facão em sua mão, com rastros de seu próprio sangue forjados pela recente colisão entre a vitrine e o rosto; e a janela, que parece ser sua única esperança de sobrevivência, pensando o quanto o universo deve a desprezar profundamente.

   Trinta segundos depois, quando a escrivaninha cede e os homens de Michael adentram pelo quarto, a filha de linhagem Hanson já desaparecera.

Só mais um minuto - DuskwoodOnde histórias criam vida. Descubra agora